As transformações que o avanço da inteligência artificial desencadearam na sociedade mundial costumam ser comparadas aos adventos revolucionários da máquina a vapor, da eletricidade e da internet. Visões mais pessimistas alertam sobre riscos sem precedentes à democracia e à segurança global.
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A velocidade das mudanças tem sido ditada pelas gigantes tecnológicas, enquanto governos e terceiro setor buscam contornos regulatórios e aparatos éticos para proteger a população dos efeitos mais deletérios que possam surgir. Mas, como em qualquer mudança tecnológica, também se abre um mundo de oportunidades, e diversos países se preparam para aproveitar a nova realidade.
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E o Brasil, como tem se posicionado estrategicamente nessa área? Há pelo menos dois temas em que o país pode avançar de forma acelerada: a implementação do Código Florestal e o sequenciamento genético digital. Isso o tornaria protagonista global do uso da IA para a proteção do capital natural.
Ao mesmo tempo que abriga a maior biodiversidade do planeta, o país tem uma das legislações mais avançadas do globo no que se refere ao uso da terra, que permitiria, em tese, proteger seu capital natural enquanto exerce a vocação de potência agrícola e pecuária. Essa legislação robusta é formada pelo Código Florestal, pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc) e pela Lei de Crimes Ambientais.
Entretanto há falhas importantes na implementação do Código Florestal, aprovado há 12 anos. Apenas 1% dos Cadastros Ambientais Rurais (CARs), autodeclaratórios, está validado pelos governos estaduais. Sem a validação, na prática a recuperação dos passivos ambientais, da Reserva Legal e das Áreas de Proteção Permanente (APPs) não ganha velocidade e consistência. E a propriedade que tem excedentes florestais não encontra demanda firme para comercializá-los.
Como a tecnologia entra nisso? A inteligência artificial é capaz de processar bases gigantescas de dados. Pode acelerar a validação dos CARs a custos muito mais baixos e, com isso, finalmente viabilizar o cumprimento do Código Florestal. Será fundamental o Brasil chegar à COP30, em Belém em 2025, com sua principal Lei Florestal implementada.
O segundo tema estratégico para o Brasil é chamado de digital sequencing, ou sistema de digitalização do patrimônio genético da biodiversidade. A partir dele será possível atribuir valor ao patrimônio natural imenso do país. O processamento por meio da inteligência artificial é capaz de valorizar o capital natural como nunca. Pode alterar o jogo de forças no contexto geopolítico e permitir a repartição de benefícios com as populações locais, que atuam como guardiãs desse patrimônio mas não são devidamente reconhecidas nem remuneradas por isso.
Ainda falta, no entanto, uma vontade maior para desenvolver o valor do capital natural. Este, portanto, é um chamado de ação para que representantes do governo brasileiro, do setor privado, do meio político e da esfera acadêmica se debrucem de forma estruturada sobre o tema e respondam: no país com o maior capital natural do mundo e com toda a transformação que a inteligência artificial trará, quais são as oportunidades? Duas delas já estão na mesa.
*Roberto Waack é presidente do Conselho do Instituto Arapyaú, Izabella Teixeira é ex-ministra do Meio Ambiente, Claudio Sassaki é empreendedor em residência na Universidade Stanford, Adnan Demachki é advogado e empreendedor social, Mariano Cenamo é CEO da AMAZ, e Amália Safatle é jornalista