Metrô Rio: concessionária propõe prorrogar contrato em troca da conclusão da estação Gávea

Discussão burocrática que vem sendo travada por meio de e-mails e ofícios, desde o início do ano, entre a concessionária e o governo do Rio, pode levar a mudanças

Por Selma Schmidt — Rio de Janeiro


O canteiro de obras da estação da Gávea, que foi inundada em 2017 para evitar danos estruturais Márcia Foletto/22-08-2023

Uma discussão burocrática, que vem sendo travada sem alarde, através de e-mails e ofícios, desde o início do ano, pode levar a mudanças no metrô do Rio. A concessionária MetrôRio está propondo ao governo do estado concluir as obras da estação da Gávea e reduzir a tarifa em troca do aumento do tempo de concessão em dez anos e da unificação do contrato das Linhas 1 (Tijuca—Ipanema) e 2 (Pavuna—Estácio) ao da Linha 4 (Ipanema—Barra).

Diante do pedido, o governo publicou, na última segunda-feira, resolução conjunta — dos titulares da Secretaria de Transportes, da Riotrilhos, da Procuradoria-Geral do Estado e da própria MetrôRio — instituindo grupos de trabalhos para analisar a viabilidade jurídica, econômica e técnica de engenharia da proposta de retomada das obras da Estação da Gávea. Outra iniciativa do estado é a de contratar uma empresa para fazer a modelagem necessária à operacionalização unificada das linhas de metrô.

A MetrôRio, responsável hoje pelas Linhas 1 e 2, quer assumir a concessão da Linha 4, da Rio Barra-CRB. Como contrapartida da unificação dos contratos, a concessionária se propõe a investir R$ 600 milhões para terminar a estação da Gávea, cujas obras estão paradas desde 2015, e a reduzir a tarifa cheia, hoje de R$ 6,90, em R$ 0,40. As concessões terminam em 2036 (Linha 4, conforme aditivo de 2012) e em 2038 (linhas 1 e 2, na renovação em 2007).

Equação de R$ 2 bilhões

Num dos documentos encaminhados ao governo em que pede a unificação dos contratos, a MetrôRio diz que “o imbróglio jurídico, contratual, operacional e regulatório que envolve a Linha 4 constitui hoje o principal entrave ao desenvolvimento do sistema metroviário do Estado do Rio”. Em outro trecho, afirma que “todo esse cenário de insegurança jurídica, somado à pandemia provocada pela Covid-19, fez com que o sistema metroviário estadual experimentasse a maior crise de sustentabilidade econômico-financeira de sua história”.

A MetroRio insiste que “é fundamental que se avance num acordo amplo que vá além da simples retomada das obras da estação da Gávea, permitindo a resolução completa do imbróglio da Linha 4”. E lembra que, por alteração contratual (quarto aditivo), as obras da Linha 4 deveriam ser concluídas até 30 de junho de 2016, para atender a Olimpíada, à exceção da estação da Gávea. Esta deveria ficar pronta em 30 de janeiro de 2018, o que não ocorreu.

A empresa cita uma equação econômica a ser implementada estimada em R$ 2 bilhões, se o acordo for fechado. A quantia inclui a redução da tarifa contratual. Entre outros valores, está inserida a reversão para os cofres do estado de R$ 333,4 milhões referentes ao ressarcimento pela perda da demanda provocada pela pandemia, valor de que a empresa abriria mão.

A concessionária da Linha 4 é a Rio Barra, mas quem opera o trecho, de fato, é a MetrôBarra, dos mesmos sócios da MetrôRio. O grupo que controla as duas empresas (MetrôRio e MetrôBarra) saiu, no fim de 2021, das mãos da Invepar — holding de infraestrutura de transportes dos fundos de pensão Previ, Funcef e Petrus — para as da Hmobi, que tem 51,5% das ações nas mãos do fundo árabe Mubadala. Um documento da Secretaria estadual de Transportes, de 2 de agosto, destaca que a Rio Barra havia outorgado à Invepar todas as suas ações, mas que o negócio dependia da conclusão da estação da Gávea, o que não aconteceu até hoje.

Fonte das empresas garante que, enquanto as linhas 1 e 2 dão lucro, a 4 vem dando prejuízo. Quanto a gastos, a proposta cita que MetrôRio e MetrôBarra já aplicaram R$ 1 bilhão na Linha 4.

Por e-mail, o estado garante que houve avanços nos estudos para a retomada das obras da Estação da Gávea. E que os grupos de trabalhos criados “deverão avaliar a situação e construir uma solução viável dos pontos de vista jurídico, econômico e de engenharia.” O passo seguinte, prossegue a nota, “será submeter a proposta definida aos órgãos de controle: Tribunal de Contas do Estado (TCE) e Ministério Público (MPRJ), que estão acompanhando os trâmites”. Quanto à proposta apresentada pela MetrôRio, informa que não há prazo pré-estabelecido para a conclusão dos estudos.

Moradores querem ter voz

A MetrôRio informa que “tem mantido tratativas com o governo do estado com vistas a ajudar a encontrar alternativas para a retomada dos investimentos no sistema metroviário estadual, paralisados desde 2016”. Alega ainda que “quaisquer detalhamentos adicionais só poderão ser realizados após a conclusão das atividades dos grupos de trabalho criados para se analisar a viabilidade de um eventual acordo”.

Já o presidente da Associação de Moradores da Gávea (AmaGávea), René Hasenclever, defende que a entidade tenha voz nos debates sobre a retomada das obras da estação do metrô no bairro. Ontem, o advogado da AmaGávea encaminhou oficio ao governo, pedindo que a associação tenha representante nos grupos de trabalho:

— É fundamental e necessário que a sociedade participe das reuniões, para que possamos acompanhar e dar uma satisfação aos moradores não só da Gávea, como do Rio, uma vez que o metrô é importante para a cidade. Que a gente chegue a ter um dia um metrô de rede que a cidade precisa.

Professor de Engenharia Geotécnica da Coppe/UFRJ, Maurício Ehrlich considera importante retomar as obras da Gávea, para que não seja perdido o que já foi investido e devido à importância do sistema metroviário para o Rio. Ehrlich afasta, no entanto, riscos graves para as construções próximas ao buraco, de 35 metros de profundidade, inundado desde 2017. Ele cita estudo feito por engenheiros civis e metalúrgicos da Coppe, que apontam que, no pior cenário, seriam necessários 13 anos (a contar de 2017) para que haja algum dano:

— Os cálculos estabelecendo esse prazo desconsideraram a resina que recobre as barras de aço colocadas no buraco. A resina protege as barras. Pode ser que parte dessa resina trinque, expondo algumas barras. Isso poderia gerar vibrações e algumas fissuras em construções próximas. Mas não há possibilidade de a caverna engolir prédios.

Superfaturamento

O impasse na estação da Linha 4 entra no contexto de denúncias de fraudes nos contratos públicos fechados na gestão do ex-governador Sérgio Cabral. De acordo com o Ministério Público, há indícios de um superfaturamento de R$ 3 bilhões nas obras. O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), por sua vez, cita que as intervenções teriam sido superfaturadas em cerca de R$ 1,5 bilhão. Contudo, o órgão assegura que “da parte do TCE-RJ, não há qualquer impedimento para a retomada das obras da estação da Gávea”.

As obras da Linha 4 custaram cerca de R$ 9 bilhões. No meio dessa discussão, já se passaram sete anos que o tatuzão empregado nas escavações permanece parado numa caverna debaixo da Rua Igarapava (alto Leblon) aguardando a conclusão dos 1.256 metros que faltam para interligar a Gávea à Estação Antero de Quental, no Leblon. A manutenção do equipamento custa cerca de R$ 1 milhão por mês.

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