O imbróglio da Serra de Petrópolis ganhou anteontem um novo elemento, quando um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e o Ministério dos Transportes encaminhem documentos de um estudo de viabilidade para uma nova concessão no prazo de 60 dias. O movimento ocorre no momento em que a Concer, que administra a Rio-Juiz de Fora desde 1995, negocia a extensão de seu contrato com o governo, afirmando estar pronta para iniciar obras em até 45 dias após um possível acordo.
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A concessionária se ampara na portaria nº 848/2023, do Ministério dos Transportes, em que é determinada uma série de premissas, além da apresentação de estudo de vantajosidade e de pareceres técnicos, que devem ser encaminhados pela ANTT ao TCU.
A decisão do tribunal cita “graves deficiências e irregularidades” na execução do contrato e reforça a “inexistência de amparo jurídico” para que o contrato seja adiado em troca da conclusão da obra. A Concer rebate, afirmando que são citados temas desatualizados, já respondidos judicialmente, e que há uma sentença favorável à companhia em 1ª instância, que reconhece a extensão do contrato é legal. Já a ANTT argumenta ter sido impedida judicialmente de exigir obrigações contratuais e que seu corpo técnico “está empenhado em concluir o processo para envio à Corte de Contas e que está dedicada à busca pela melhor solução para o trecho rodoviário para uma nova licitação”.
A Concer parece otimista, e a ANTT fala em enviar documentação protocolar ao TCU para uma nova licitação. Parecem sintonias diferentes.
Qual é a situação hoje?
Um pequeno histórico, e tudo que eu falar é rastreável, é que o governo estabeleceu o valor de R$ 80 milhões na época (do início da concessão) e o projeto seria feito depois. O projeto foi feito, aprovado, cumpriu todos os regulamentos e licenças. Foi feito um reequilíbrio do contrato entre 2012 e 2013, de forma que a diferença de valores seria paga em três aportes: um de 30% no final de 2014, 50% no final de 2015 e os últimos 20% quando a obra terminasse. Mas esses aportes não aconteceram, o que considero um “Big bang”, quando teve um desequilíbrio no contrato.
Qual é a proposta da Concer?
A gente sempre buscou consenso. Entregamos nossa proposta em novembro: com projeto certificado por uma certificadora independente, faremos a modernização do (projeto do) túnel, com uma rota de escape subterrânea em caso de acidente com fogo. Terá acessos (para pedestres) a cada 250 metros, em vez de 500. Nossa proposta é começar as obras em 45 dias uma vez que tenha acordo, entregar em 18 meses até o Belvedere — dos KM 102 a 89, que é a parte mais sinuosa e onde mais tem escorregamento — e fazer o túnel no prazo de 33 meses.
Quanto dessas obras, paradas em 2016, estão prontas? Algo precisará ser refeito?
O túnel está 70% pronto, enquanto a obra (como um todo) é perto dos 50%. Nós já fizemos uma investigação de engenharia e, na nossa proposta, está a recuperação dessas partes que precisam ser tratadas: Algumas vigas com ferrugens precisam ser limpas, o revestimento do túnel precisa ser trocado, algumas contenções que precisam ser concluídas, trechos duplicados ser recapeados.
Também tem alguma medida de olho em eventos climáticos extremos?
Nossa proposta é elevar a rodovia na Baixada Fluminense, na altura da Reduc (em Duque de Caxias). O suficiente para evitar alagamentos.
TCU apontou sobrepreço na obra. A Concer reconhece?
Existiam erros de cálculo, é verdade. Mas contra e a favor da companhia. Se você fizesse um balanceamento entre o que era contra e a favor, a companhia não tinha que pagar, mas receber.
Qual valor a Concer calcula que tem a receber?
Dá em torno de R$ 2 bilhões, a partir de uma perícia judicial. E a nossa proposta é dar um desconto nisso: os acionistas abririam mão de parte desse valor em favor de fechar um acordo. Estamos prontos para uma retomada da obra, mas o governo está fazendo o certo de ter um pé em duas canoas, porque o acordo com a companhia pode não sair.
A ANTT entende que quem deve mais de R$ 400 mi a ela é a Concer.
Como é que ela quer me cobrar de um negócio que ela me casou? Quem causou inadimplência, desequilíbrio no contrato e desequilíbrio no contrato quer punir duplamente a companhia?
Só tarifa do pedágio sustentará as obras? O valor irá aumentar?
Entre os itens que são pedidos, fala-se sobre a capacidade de tomar endividamento. Eu preciso do contrato regularizado, para que eu possa sentar com uma instituição financeira e falar “olha, o meu potencial de receita é esse aqui”. Esse potencial de receita me permite tomar um financiamento de X milhões, para que eu inicie as obras. Hoje o pedágio está em R$ 14,50 e eu garanto que (a tarifa) ficará abaixo do edital, uma coisa não muito diferente do que é hoje. Uma obrigação da Portaria 848 é, que na medida em que você faz entregas, é permitido fazer um degrau nessa tarifa.
Quanto a empresa arrecada por ano, com pedágio?
Em torno de R$ 320 milhões por ano. Hoje, a companhia nem vê o dinheiro. Grande parte dos recursos ainda vão para os credores. A ordem de grandeza é que a gente fica com (o que recebe em) 15 dias do mês para tocar a companhia, e os outros 15 vão para credores.
O maior problema na falta de recurso é na pavimentação?
Tem outros problemas também. Mas há curvas na subida da Serra que, pelos caminhões que passam hoje, não se pode intervir na via, porque precisará parar a via por dois ou três dias. Imagine o problema que causaria à sociedade. O desequilíbrio na concessão faz a Concer procurar o que é prioridade, e a segurança é nossa prioridade. Então, se a companhia tiver que tomar a decisão entre melhorar o pavimento ou uma contenção importante, onde pode rolar uma pedra... as pessoas analisam a questão do pavimento, mas têm que ver todo. Tem que ver a floresta, não, a árvore.
Qual é a vida útil da Serra?
Não tem. Já passou há muito tempo, tanto que o edital de 1995 já previa a construção da nova subida da Serra. Já passou muito tempo e isso nos custa tempo e acidentes. O tráfego que passa ali hoje é muito diferente, além do tipo de carga e de caminhão: são cargas muito complexas, e que não conseguem subir a Serra pela subida. Precisamos fechar a descida durante um período de tempo, para que esses veículos subam pela contramão.