Patrícia Kogut
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O mundo nunca deixou de estar perigoso. Porém, com a construção da primeira bomba atômica, nos anos 1940, essa realidade ganhou ainda mais gravidade. A escalada de um conflito para o patamar nuclear pode significar o apocalipse. É olhando por essa perspectiva que o cineasta americano Brian Knappenberger conduz a ótima série “Ponto de virada: A bomba e a Guerra Fria”, disponível na Netflix. São nove episódios em que ele defende a tese de que a Guerra Fria não terminou nos anos 1990. Ela segue se atualizando com novas configurações e levada por outros governantes. A lógica do não-enfrentamento extremo ainda determina os limites da temperatura política global.

É um trabalho de fôlego e alimentado por uma pesquisa impressionante. Dos arquivos em que essa produção mergulhou, foram pescadas imagens fartas e valiosas. O espectador nota que foi uma tarefa incansável e preciosista. Isso fica evidente por exemplo quando o termo “cortina de ferro” é citado pela primeira vez na série. Nesse momento, vemos o filme do discurso em que Winston Churchill consagrou essa expressão, em 1946. Nessa fala, ele afirmou que a URSS “havia baixado uma cortina de ferro dividindo a Europa e separando o lado Leste do continente”.

Knappenberger também mergulha nos livros, mas não se detém nas versões oficiais. Ele encara tudo com lupa crítica. Assim, abre um painel rico para explicar as diferenças entre os EUA e o Japão na Segunda Guerra que derivaram na destruição de Hiroshima e Nagasaki. Estudiosos expõem as razões pelas quais os ataques tiveram apoio maciço da população americana, que, por sua vez, foi bombardeada com propaganda do governo. Num trecho assustador logo adiante, um especialista afirma que o então presidente Harry Truman não tinha a noção exata de que as duas cidades eram ocupadas por numerosa população civil. Achava que eram preponderantemente bases militares.

“Ponto de virada” vasculha os abismos sociais da Rússia czarista, mostra a ascensão do comunismo, o Grande Expurgo, os gulags, o Holodomor (a grande fome imposta por Stalin à Ucrânia) até chegar a Vladimir Putin e à guerra atual contra a Ucrânia. Vemos Berlim dividida, o muro, a criação da OTAN em 1949 entre muitos outros fatos históricos que ainda ecoam nos noticiários. O documentário também se debruça sobre a espionagem, atividade muito valorizada desde quando a Europa era dividida em dois blocos. Entre as entrevistas está a do filho do casal Ethel e Julius Rosenberg, que tinha 6 anos quando seus pais foram executados, acusados de passar informação para os soviéticos.

muro de berlim — Foto: arquivo
muro de berlim — Foto: arquivo

O passado retratado em tantos documentos e iconografia caudalosa explica mesmo muito do período turbulento que estamos atravessando hoje. Os atores mudaram. Os ódios, nem tanto.

Mais do que uma recomendação, vai aqui um aviso: essa série é imperdível.

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