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Análise: Sánchez é o grande beneficiado da condenação de líderes catalães, e independentismo buscará alegar perseguição

Sentença dá novo fôlego a movimento, que vinha perdendo popularidade; por outro lado, pode dissuadir ações independentistas semelhantes no continente
Foto: JON NAZCA / REUTERS
Foto: JON NAZCA / REUTERS

MADRI - A pouco menos de um mês para as eleições nacionais espanholas de 10 de novembro, a sentença que condenou os líderes secessionistas tem implicações imediatas dentro e fora do país. Em campanha para continuar à frente do governo, o premier interino, Pedro Sánchez (Partido Socialista), é um dos mais óbvios beneficiados: deixa para trás o peso do recente fracasso na tentativa de formar um gabinete e assume um perfil de estadista equilibrado, que já se apressou em elogiar a solidez das instituições do país e garantir que acatará a decisão. Assim, desarma seus competidores à direita, que agitavam os eleitores conservadores ao dar como certo um indulto aos presos.

A aparente fúria de milhares de manifestantes que ocuparam ruas, estações de trem e o aeroporto de Barcelona não alcançou a potência prevista. Para analistas políticos, ainda que altas, as penas de até 13 anos — com possibilidade de solicitar o regime semiaberto a partir do início de 2020 — ficaram aquém dos 25 anos ou mais pedidos pelo Ministério Público, o que pode ter contribuído para desmobilizar parte da população. Para a sorte do premier.

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— Não creio que haverá uma situação de violência contínua ao longo dos dias. Há protestos nas ruas, com reação da polícia, mas as principais lideranças civis que orientavam as massas estão entre os presos, e seus substitutos, os CDRs (Comitês de Defesa da República), são muito descentralizados — diz ao GLOBO o cientista político Pablo Simón, professor da Universidade Carlos III.

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Outro que tentará tirar algum benefício das sentenças é o próprio independentismo . Numa curva descendente de popularidade desde 2017, e ante cidadãos cansados e cada vez menos propícios a apoiar suas teses, ganha um sopro de oxigênio. Alegará perseguição por parte do Estado central em seu já anunciado recurso ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), em Estrasburgo. Mas pode ter dificuldades nessa estratégia.

— A Espanha é um dos países menos condenados no TEDH. Não creio que prospere a teoria da perseguição deliberada ou das violações sistemáticas. Cumpriu-se o ordenamento jurídico normal — avalia Teresa Freixes, professora de direito constitucional na Universidade Autônoma de Barcelona.

Precisamente este âmbito — o europeu — será o palco mais imediato da reverberação externa. O silêncio das autoridades em Bruxelas é eloquente: nem uma só palavra contra a sentença; e algumas manifestações oficiosas de apoio. Para outros movimentos independentistas no continente , que, em maior ou menor grau, se espalham por Reino Unido (Escócia), Itália (Vêneto), Bélgica (Flandres) ou França (Córsega), as prisões e o imbróglio sem fim tendem a produzir efeito dissuasório.

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O independentismo agora se esforçará para que não só o continente como o mundo todo o ouçam. Terá um irredutível Sánchez pela frente, que nesta segunda, numa mostra de que lutará pelo controle da narrativa, fez seu pronunciamento em inglês.

— Obviamente, Espanha e independentismo farão uma guerra de propaganda internacional nas próximas semanas, tentando inflar suas hostes — prevê Simón. — Ignoro quem sairá vencedor.