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'As pessoas não estão com medo, elas estão furiosas', afirma Sviatoslav Vakarchuk, vocalista da banda ucraniana Okean Elzy

Em entrevista ao GLOBO, cantor e ex-deputado traça comparações entre a invasão russa e a Segunda Guerra Mundial, e destaca que a população na Ucrânia está disposta a resistir
Homens carregam malas na região central de Kiev Foto: DANIEL LEAL / AFP
Homens carregam malas na região central de Kiev Foto: DANIEL LEAL / AFP

No dia 22 de fevereiro, dois dias antes das bombas russas começarem a cair sobre cidades ucranianas, os integrantes do Okean Elzy, uma das bandas mais conhecidas não apenas da Ucrânia, mas de todos os países da antiga União Soviética — incluindo a Rússia —, decidiram fazer um concerto improvisado em uma das pontes de Kiev, como forma de demonstrar apoio à população e mostrar que estão unidos em um momento difícil.

"Eles sentiram que precisavam mostrar a todos: estamos juntos! Estamos aqui, em casa, continuamos fazendo nosso trabalho, focados", diz a banda no vídeo da apresentação, divulgado na internet.

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Em entrevista ao GLOBO neste domingo, o vocalista da banda, Sviatoslav Vakarchuk, que também foi deputado na Rada, o Parlamento ucraniano, reafirmou essa união entre a população, e conclamou os russos a saírem às ruas para exigir de Vladimir Putin o fim da guerra. Ele ainda está em território ucraniano.

Okean Elzy, com Sviatoslav Vakarchuk no centro Foto: Divulgação
Okean Elzy, com Sviatoslav Vakarchuk no centro Foto: Divulgação

Na semana passada vocês se apresentaram nas ruas de Kiev, e hoje a capital ucraniana está sob ataque. Qual é o sentimento dessa mudança de rumo, de agora conviver com o ruído de bombas e alarmes de ataque aéreo?

Posso te dizer como me sinto, me sinto como os cidadãos de Londres se sentiram em 1930 e 1940, quando os nazistas os estavam bombardeando. Eles não imaginavam que outra nação europeia iria até eles e mataria seus filhos. A mesma coisa está acontecendo agora, eles começaram, há quatro dias, a nos atacar com mísseis, armas, estão matando civis.

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Estamos ouvindo muito sobre as pessoas dizendo que não estão com medo das tropas russas e prometendo resistir…

Eu estou furioso, a gente sabia que isso [a invasão russa] aconteceria, mas tínhamos a esperança de que não aconteceria. Tenho orgulho, do meu Exército, do meu povo, todos estão resistindo, tentando destruir o inimigo, estão prontos para lutar pelo nosso país . As pessoas não estão com medo, elas estão furiosas, estão prontas para fazer de tudo para que os russos saiam.

Há cerca de oito anos houve a Euromaidan, um movimento também de resistência popular, mas contra um governante [Viktor Yanukovych], não contra um Exército. Há como fazer uma comparação entre esses dois momentos?

Há apenas uma forma de comparar, e é ao mostrar que os ucranianos nunca toleram que alguém tire suas liberdades. A Euromaidan foi um movimento que, depois, a Rússia usou para justificar a anexação da Crimeia e a guerra em Donbass, então no final nos sentimos frustrados. Agora o sentimento é de uma guerra de verdade, você pode fazer comparações com uma guerra de independência em outras regiões, como na América Latina no século XIX. Acho que a nação ucraniana está se tornando mais forte, estamos sempre lutando, não estamos nem discutindo entre nós nas ruas.

O Okean Elzy tem uma grande base de fãs na Rússia, você fez muitos shows por lá, como você vê agora e talvez como passará a ver a sua relação com o povo russo?

Sempre penso em um escritor inglês, agora esqueci o nome, dos anos 1930, e que tinha muitos fãs na Alemanha, e um dia aquele país atacou o seu país e tentou matar seus filhos, seus irmãos. É um sentimento estranho, preciso ser claro aqui, não estou dizendo que todos os russos querem a guerra, eu inclusive penso que a maioria dos russos não quer a guerra.

Há protestos hoje em cidades russas, com muitas prisões, mas ainda em número considerado pequeno...

Ao terem medo de levantar a voz contra Putin eles se tornam colaboradores, ainda mais quando há tantas crianças ucranianas sofrendo agora. Aqueles que estão em silêncio estão negligenciando os ucranianos. Meu pedido aos russos é: vocês precisam parar seu presidente, caso contrário, muitas mães verão seus filhos morrerem.