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Como Nova York se fechou para resistir à Covid-19

Hoje, o silêncio só é interrompido pelas sirenes das ambulâncias e pelos aplausos diários para os profissionais de saúde
A Park Avenue, em Nova York, deserta na última sexta-feira Foto: JOHANNES EISELE / AFP
A Park Avenue, em Nova York, deserta na última sexta-feira Foto: JOHANNES EISELE / AFP

NOVA YORK - Nova York, símbolo das metrópoles do mundo, demorou quase duas semanas para parar por causa da epidemia do novo coronavírus. Do sábado, 7 de março, quando o governador do estado, Andrew Cuomo, declarou emergência para poder tomar medidas excepcionais, até o dia 20, quando ele ordenou o fechamento de todo comércio não essencial, a sensação era de que, a cada minuto, um pouco das ruas, dos artistas, dos negócios e das pessoas ia desmoronando. Uma avalanche invisível.

Naquele sábado, o estado registrava 89 casos confirmados da Covid-19, 12 na cidade. Hoje, só a região metropolitana tem quase cem mil casos, com mais de 6 mil mortes.

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No início do mês passado, já havia as recomendações na TV e nos alto-falantes do metrô para que todos lavassem as mãos e usassem álcool gel, que esgotou nas farmácias. Na segunda, 9 de março, o transporte público ainda estava cheio, embora algumas pessoas usassem máscaras e evitassem tocar nas barras de apoio para não se contaminarem. Várias universidades suspenderam as aulas presenciais.

No dia 11, as ruas do movimentado Upper East Side, ao lado do Central Park, já estavam vazias. Os vagões do metrô tinham a metade dos passageiros habituais. Não se via mais quase ninguém no museu Metropolitan, e os programas de TV tiraram a plateia dos estúdios. Em 12 de março, os shows da Broadway foram cancelados, assim como os espetáculos no Lincoln Center e na Metropolitan Opera.

Sirenes e aplausos

Em 14 de março, o sábado seguinte ao do decreto de emergência, a cidade de Nova York registrou a primeira morte, uma senhora de 82 anos. Havia 524 casos confirmados da Covid-19. O fechamento das escolas públicas foi anunciado no dia seguinte, e o de bares e restaurantes, na segunda-feira, dia 16.

As notícias eram devastadoras para artistas, para o comércio e para o turismo. Começava a quarentena de fato na metrópole de quase 9 milhões de habitantes, acompanhada de demissões e de um surto de ansiedade para quem tem que pagar as contas em um dos lugares mais caros do mundo. Meio milhão de pessoas se inscreveria para obter o seguro desemprego só em Nova York até o fim de março.

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A cidade, que sempre teve tudo, parece não ter mais nada. O silêncio só é interrompido pelas sirenes das ambulâncias, que ocupam o lugar dos concertos e dos risos. Mercadinhos dos bairros fecham as portas todo dia, e vizinhos, solidários, se organizam para fazer doações e sustentar alguns desses pequenos negócios. Em parte das escolas públicas, é possível buscar refeições para as crianças. Não há quase ninguém circulando em lugares antes lotados, como o Soho e a Times Square.

A última semana foi a mais difícil, com o maior número de mortes. O governo estadual anunciou na última sexta-feira que está cavando covas coletivas em Hart Island, no Bronx.

Em meio ao pesadelo, todas as noites, às 19h, os nova-iorquinos aplaudem e agradecem o trabalho dos profissionais da saúde. Tantas vezes o cenário de filmes de super-heróis, Nova York revelou seus verdadeiros salvadores: médicos, enfermeiras, bombeiros, assistentes sociais, jornalistas, entregadores e caixas de supermercado.

*Paula Lobo é fotógrafa e vive em Nova York.