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Duque recebe enxurrada de críticas por excluir quase um milhão de venezuelanos do plano nacional de vacinação

Decisão do presidente colombiano foi duramente criticada por ex-ministros da Saúde e líderes políticos como o ex-candidato presidencial Gustavo Petro
Imigrantes venezuelanos carregam seus pertences ao chegarem a campo humanitário em Bogotá Foto: RAUL ARBOLEDA / AFP 13-11-18
Imigrantes venezuelanos carregam seus pertences ao chegarem a campo humanitário em Bogotá Foto: RAUL ARBOLEDA / AFP 13-11-18

CIDADE DO MÉXICO —  A decisão do presidente colombiano, Iván Duque, de excluir da campanha nacional de vacinação contra a Covid-19 os venezuelanos em situação irregular (cerca de 950 mil dos 1,7 milhão de pessoas dessa nacionalidade no país) recebeu uma enxurrada de críticas. O chefe de Estado assegurou que a prioridade sempre serão os cidadãos colombianos e argumentou que, caso contrário, ocorreria uma invasão de venezuelanos que atravessariam a fronteira em busca da vacina.

Duque é opositor do presidente Nicolás Maduro e deu total apoio à oposição venezuelana liderada por Juan Guaidó . Com essas premissas, seu governo optou por não obstaculizar, alegando razões humanitária, a entrada dos imigrantes venezuelanos. O fechamento total da fronteira terrestre, de mais de 2.200 quilômetros quadrados repletos de caminhos informais (as chamadas trochas), teria sido inviável. Essa medida não foi plenamente implementada sequer nas semanas de estrito isolamento decretado pela pandemia do coronavírus.

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Na Colômbia, serão aplicadas as vacinas dos laboratórios Pfizer e AstraZeneca, e da aliança Covax (iniciativa da Organização Mundial da Saúde para garantir o acesso equitativo a uma futura vacina). A decisão de excluir os venezuelanos em situação irregular elevou a tensão no ambiente político. Em mensagens nas redes sociais, o ex-ministro da Saúde e reitor da Universidade dos Andes Alejandro Gaviria assegurou que "não vacinar os venezuelanos é uma má ideia do ponto de vista epidemiológico. Mas, acima de tudo, uma proposta antiética: excluir os mais vulneráveis e discriminar de forma quase ameaçadora um grupo de pessoas por sua nacionalidade e estatus migratório".

O senador opositor e ex-candidato presidencial Gustavo Petro reagiu com dureza: "Esta mensagem consegue que milhões de colombianos aplaudam, esquecendo que existem milhões de colombianos na Venezuela, Equador, Estados Unidos e Espanha. Não gostaríamos que eles fossem excluídos de uma vacina. A xenofobia é um dos pilares do fascimo". Já o ex-presidente Ernesto Samper (1994-1998) perguntou "o que aconteceria se Trump decidisse negar a vacina da Pfizer a todos os imigrantes latinos que moram nos EUA?".

Os imigrantes venezuelanos sem documentação e sem emprego formal são justamente os mais expostos ao vírus. A escassez de recursos, precárias condições de vida e o fato de que não possam se isolar porque sua subsistência depende do que ganhem diariamente, principalmente graças ao comércio informal, pode multiplicar os riscos para o resto da sociedade. Duque não quer gerar, segundo ele, um efeito dominó, mas esta decisão está na contramão da política migratória que implementou desde que ganhou as eleições, em 2018.

Em Caracas, Maduro aproveitou para atacar novamente o governo colombiano falando em "xenofobia" e chegando a afirmar num ato público que "temos de nos cuidar da Colômbia, porque de lá chega todo o mal que entra na Venezuela". Os dois países romperam relações há vários anos. O distanciamento é irreversível, e o governo bolivariano considera Duque e o presidente dos EUA, Donald Trump, seus principais adversários.

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Paralelamente, a oposição venezuelana liderada por Guaidó evitou criticar a medida e defendeu o presidente colombiano. Recentemente, o também líder opositor venezuelano Leopoldo López, exilado na Espanha, foi recebido quase com honras de Estado em Bogotá. "A pandemia afetou todos e os mais vulneráveis de forma mais severa. O começo da vacinação exige todos os esforços para conseguir imunizar as populações no menor tempo possível. O presidente Duque tem uma estratégia certa nessa direção", opinou Guaidó. Seu embaixador na Colômbia, Tomás Guanipa, afirmou que o governo colombiano "sempre estendeu uma mão para ajudar os mais de 1,7 milhão de venezuelanos que tiveram de fugir pela emergência humanitária". De acordo com Guanipa, as políticas de Duque "em matéria de integração, saúde e educação sempre foram pioneiras na região". O presidente colombiano sempre pede mais investimentos para financiar o processo migratório. Em maio passado, um grupo de doadores internacional enviou cerca de US$ 2,8 bilhões aos refugiados e imigrantes venezuelanos.