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Guerra da Ucrânia tira 'mágica' de campanha eleitoral na França e cria receio de alta abstenção

Candidato à reeleição, Emmanuel Macron manteve compromissos no mínimo possível; desânimo estaria contagiando eleitores e até assessores do presidente
O presidente Emmanuel Macron, em alta nas pesquisas: campanha desanimada Foto: LUDOVIC MARIN / AF/25-03-2022
O presidente Emmanuel Macron, em alta nas pesquisas: campanha desanimada Foto: LUDOVIC MARIN / AF/25-03-2022

PARIS — Membros da equipe do presidente francês Emmanuel Macron estão preocupados com sua campanha de reeleição, que não estaria conseguindo engajar os eleitores. Com a guerra na Ucrânia ofuscando a política doméstica, restam poucas novidades para deixá-los entusiasmados.

Contexto: Macron lança manifesto a três semanas da eleição, com campanha impulsionada na França por tentativa de mediar crise na Ucrânia

Faltando menos de três semanas para o primeiro turno da votação, Macron conta com uma vantagem confortável nas pesquisas de opinião. Mas especialistas alertam que as abstenções podem atingir um nível recorde, e por isso ele precisa deixar os apoiadores motivados o suficiente para fazer um esforço e votar nele.

— Não há mágica nesta campanha. Ninguém está animado, nem os franceses, nem os jornalistas políticos, nem mesmo nós na campanha — diz uma fonte da equipe de Macron. — A guerra na Ucrânia fechou tudo.

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O papel diplomático que Macron assumiu no conflito entre Rússia e Ucrânia deu a ele um impulso inicial nas pesquisas, mas alguns membros da campanha agora temem que seus esforços na política externa estejam distraindo a luta em casa.

— A próxima semana é uma semana importante. Precisamos mostrar que estamos fazendo uma campanha — diz a mesma fonte.

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O presidente manteve os eventos de campanha no mínimo possível, contando principalmente com postagens nas redes sociais, incluindo fotos no Instagram em que ele aparece cansado, e com a barba por fazer, entre ligações diplomáticas em sua mesa. E seus concorrentes foram deixados para debater entre si em programas de TV que não atraem muitos espectadores.

Um comício de campanha em Nice, na Riviera Francesa, com ministros atuais e ex-ministros, mas sem Macron — que enviou uma mensagem pré-gravada de três minutos — não conseguiu lotar o local.

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Depois de divulgar seu manifesto, semana passada, Macron deu duas entrevistas, incluindo uma na qual um interlocutor lhe disse para passar menos tempo na Ucrânia e se concentrar mais nas necessidades de seu país.

Mas, na quinta-feira, Macron voou para Bruxelas para dois dias de cúpulas da Otan, do G7 e da Europa.

— Para ser honesto, estamos um tanto entediados — disse outra fonte próxima a Macron.

Sem mundo novo

A ala de centro-esquerda dentro do partido de Macron também está preocupada. Teme que as únicas medidas que os eleitores vão lembrar de seu manifesto sejam duras e impopulares, como adiar a idade de aposentadoria para 65 anos e o trabalho comunitário obrigatório para beneficiários da assistência social.

— Não é algo que ganhe sua imaginação — brincou um legislador, lamentando o "otimismo" da campanha de Macron em 2017, que prometia um "novo mundo" rompendo com a política das últimas décadas. — Precisamos ter cuidado com a abstenção.

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Depois de atingir um recorde de 31,5% em 9 de março, à medida que a crise na Ucrânia se desenrolava, a proporção de pessoas que dizem que pretendem votar em Macron caiu para 28,5%.

A líder de extrema-direita Marine Le Pen, que se concentrou em questões domésticas como o custo de vida e a inflação, subiu nas pesquisas de 16%, logo após o início da guerra, para os atuais 20%.

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Oficialmente, a equipe de Macron descarta qualquer problema com a campanha. Apoiadores apontam para o fato de que ele ainda está muito à frente de Le Pen e atraiu um público recorde para sua entrevista mais recente, e culpam outros candidatos pela falta de interesse dos eleitores na eleição presidencial.

— Neste momento decisivo, prefiro ver o presidente trabalhando para proteger os franceses e fortalecer a Europa do que no palco para uma manifestação — disse Pieyre-Alexandre Anglade, porta-voz do partido de Macron no Parlamento, à Reuters.