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Herdeira de Merkel renuncia após criticada aliança com extrema direita em eleições regionais

Annegret Kramp-Karrenbauer foi eleita presidente da democracia cristã em 2018 e seria sua representante nas eleições nacionais do ano que vem
Annegret Kramp-Karrenbauer, líder da CDU, ao lado da chanceler Angela Merkel Foto: STEFANIE LOOS / AFP/26-02-2018
Annegret Kramp-Karrenbauer, líder da CDU, ao lado da chanceler Angela Merkel Foto: STEFANIE LOOS / AFP/26-02-2018

BERLIM — A presidente da União Democrata Cristã (CDU), Annegret Kramp-Karrenbauer , anunciou nesta segunda-feira que renunciará a seu posto e que não concorrerá ao cargo de chanceler da Alemanha no ano que vem. AKK, como é conhecida, era vista como sucessora natural da chanceler Angela Merkel após ganhar a eleição para a liderança da CDU , em dezembro de 2018, mas se viu enfraquecida por uma controvérsia envolvendo a extrema direita.

Na última quarta-feira, contrariando orientações explícitas de Kramp-Karrenbauer e de Merkel, o diretório da CDU no estado da Turíngia, no Leste da Alemanha, juntou-se ao partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) para eleger Thomas Kemmerich, do Partido Democrático Liberal (FDP, na sigla alemã), como chefe do governo local. Depois de severas críticas e protestos em várias cidades do país, Kemmerich acabou renunciando no sábado .

A reação de AKK foi considerada lenta. Merkel, que estava em viagem à África do Sul, teve que intervir quando chegou a Berlim, no sábado, demitindo um integrante de seu governo .  Christian Hirte ocupava um posto-chave para a coordenação da política federal alemã nos estados da antiga RDA, além de ser vice-presidente regional da CDU na Turíngia. Em um tuíte, ele havia parabenizado Kemmerich por sua eleição.

Nesta segunda-feira, Kramp-Karrenbauer confirmou que não concorrerá ao posto de chanceler e deixará o cargo após “organizar o processo de escolha do novo candidato", algo que deverá acontecer na conferência nacional da CDU, no meio do ano. Ela disse que continuará dirigindo a pasta da Defesa, que ocupa desde julho passado, até o final  da atual  legislatura.

—  Respeito a decisão, mas a lamento enormemente. Posso imaginar que não tenha sido uma decisão fácil para ela —  disse Merkel.

A saída de AKK aprofunda a crise vivida pelo tradicional partido conservador alemão com a iminente saída de Merkel, que está no poder há 15 anos, o mau desempenho eleitoral recente e a ascensão da extrema direita, que capitalizou a oposição à decisão da chanceler de receber cerca de 1 milhão de refugiados, a maioria sírios, em 2015.

Na última eleição geral na Alemanha, em 2017, nem a CDU nem o também tradicional Partido Social-Democrata (SPD) conseguiram obter maioria parlamentar para liderar uma coalizão governista sozinhos. Com isso, tiveram que repetir a chamada "grande coalizão" com as duas legendas, que acaba descaracterizando seus programas partidários e afastando-as de suas bases tradicionais.

A aliança na  Turíngia surpreendeu por ser a primeira vez no pós-guerra que a CDU se uniu a um partido de extrema direta para eleger um governo estadual. Tanto Merkel quando AKK já haviam rejeitado se aliar à AfD em quaisquer circunstâncias, considerando tal parceria inaceitável. Segundo o porta-voz da líder demissionária, uma das razões para sua saída é a "falta de clareza" nas relações da CDU com a AfD e com o Die Linke (A Esquerda, legenda que tem sua origem no antigo Partido Comunista da Alemanha Oriental).

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Antes da controvertida eleição  de Thomas Kemmerich para o governo da Turíngia, havia a expectativa de que o atual premier, Bodo Ramelow, do Die Linke, conseguiria se manter no cargo em uma aliança minoritária com os social-democratas e os verdes. Contudo, o FDP surpreendeu ao lançar o nome de Kemmerich na disputa, contando com o apoio da CDU e da AfD. Com isso, a reeleição de Ramelow foi impedida.Tradicionalmente, a CDU também rejeita alianças com o Die Linke, embora o SPD participe de coalizões regionais com o partido de esquerda.

Kramp-Karrenbauer era vista como a sucessora natural de Merkel, que anunciou em 2018 que não concorreria à reeleição no ano que vem, após o final de seu quarto mandato à frente da Alemanha. Uma série de gafes, no entanto, afetaram sua popularidade, gerando dúvidas sobre sua capacidade de comandar o país.

Os favoritos para sucedê-la são Armin Laschet , primeiro-ministro da Renânia do Norte-Vestfália, estado mais populoso do país, e próximo a Merkel; Jens Spahn , ministro da Saúde; e Friedrich Merz , ex-líder parlamentar da CDU e antigo adversário de Merkel. O primeiro-ministro da Baviera, Markus Söder , também é visto como possível sucessor por alguns em Berlim. Uma vitória de Merz ou Spahn, ambos da ala direita do partido, seria um marco para a CDU, que se moveu para o centro durante os anos de Merkel no poder.

A AfD comemorou a renúncia de AKK,  com seu colíder, Alexander Gauland, celebrando o fato de não haver mais consenso na CDU sobre isolar a extrema direita. A AfD é monitorada pela Inteligência alemã por possíveis atividades inconstitucionais e tem políticas abertamente antissemitas, anti-imigração e racistas.