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Júri condena o ex-policial branco Derek Chauvin pela morte de George Floyd

Chauvin foi considerado culpado em três acusações – homicídio em segundo e terceiro graus e por homicídio culposo em segundo grau – e pode pegar até 40 anos de prisão
O ex-policial Derek Chauvin ouve decisão do júri popular durante seu julgamento na morte de George Floyd Foto: POOL / via REUTERS
O ex-policial Derek Chauvin ouve decisão do júri popular durante seu julgamento na morte de George Floyd Foto: POOL / via REUTERS

MINNEAPOLIS — Um júri popular condenou, nesta terça-feira, o ex-policial branco Derek Chauvin pela morte do segurança negro George Floyd , em um caso que incendiou os Estados Unidos e o mundo em protestos contra a violência policial contra a comunidade negra. O veredicto saiu após três semanas de julgamento, em que diversas testemunhas afirmaram que Chauvin usou força desproporcional ao imobilizar Floyd, com o joelho em seu pescoço por nove minutos, em 25 de maio do ano passado.

Chauvin, que preferiu não prestar depoimento e se declarou inocente, foi considerado culpado em três acusações: homicídio em segundo e terceiro graus e por homicídio culposo em segundo grau. No primeiro, o que se considerou é que Chauvin causou, de forma não intencional, a morte de Floyd enquanto cometia outro crime, a agressão. No segundo, que o ex-policial matou Floyd ao tomar uma atitude perigosa e que colocou sua vida em risco. No último, que Chauvin, ao ser imprudente, assumiu o risco de matar Floyd.

O irmão de George Floyd, Philonise, em coletiva depois que um júri considerou Derek Chauvin culpado de assassinato, contou que recebeu ligações de vários países, inclusive do Brasil, dizendo 'não vamos conseguir respirar até que você consiga respirar'.
O irmão de George Floyd, Philonise, em coletiva depois que um júri considerou Derek Chauvin culpado de assassinato, contou que recebeu ligações de vários países, inclusive do Brasil, dizendo 'não vamos conseguir respirar até que você consiga respirar'. "Hoje, somos capazes de respirar novamente", afirmou

A sentença final será anunciada em oito semanas, mas ele pode pegar até 40 anos de prisão. Outros agentes que participaram da abordagem policial, Alexander Kueng, Thomas Lane e Tou Thao, serão julgados em agosto.

Após ouvir a sentença, ex-policial, demitido dias após o crime, foi algemado e preso sob custódia. O julgamento ocorreu em meio a uma forte tensão e protestos diários , especialmente após a recente morte de Daunte Wright, outro jovem negro nos arredores de Minneapolis. Após a decisão, a tensão dos dias anteriores se transformou em comemoração. Do lado de fora do tribunal, centenas de pessoas celebraram o veredicto, assim como na praça George Floyd, cruzamento onde o segurança foi morto e agora leva seu nome.

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O advogado da família, Ben Crump, por sua vez, classificou a decisão como  “um ponto de inflexão na história” dos Estados Unidos. Após o veredicto, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, voltou a ligar para os familiares de Floyd e disse se sentir “muito aliviado”.

“A justiça obtida com dor finalmente chegou para a família de George Floyd”, escreveu Crump no Twitter. “Este veredicto envia uma mensagem clara sobre a necessidade de prestação de contas por parte das forças de segurança. Justiça para a América negra é justiça para toda a América!”.

Em comunicado, o ex-presidente Barack Obama também celebrou a decisão:  “Hoje, um júri fez a coisa certa. Mas a verdadeira justiça exige muito mais.”

Mais cedo, Biden havia dito que as evidências sobre a responsabilidade do ex-policial, apresentadas no julgamento, eram “avassaladoras”. O presidente, que telefonou na segunda-feira para a família, esperou que os jurados ficassem isolados para dar declarações sobre o caso .

— Ele [Biden] sabe o que é perder um membro da família e conhece o processo pelo qual estamos passando. Ele só queria que nós soubéssemos que ele está rezando por nós, na esperança de que tudo acabe bem — disse Philonise, irmão de George Floyd, em declarações à TV NBC.

Os 12 jurados deliberaram por mais de dez horas, isolados em um hotel de Minneapolis onde passaram a noite, para chegar a um veredicto unânime. O grupo, contando dois suplentes que foram dispensados, era formado por seis mulheres brancas, dois homens brancos, três homens negros, uma mulher negra e duas mulheres multirraciais, de acordo com documentos do tribunal. Suas identidades não foram reveladas.

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Na segunda-feira, acusação e defesa apresentaram seus argumentos finais no julgamento. O promotor Steve Schleicher pediu aos jurados para “acreditarem no que seus olhos veem” enquanto reproduzia o vídeo que mostrava o ex-policial, de 45 anos, imobilizando Floyd , de 46 anos, enquanto o homem negro dizia que não conseguia respirar. Ao longo do julgamento, os promotores acusaram Chauvin de ter usado força desproporcional, deixando Floyd sem oxigênio.

O principal advogado de Chauvin, Eric Nelson, por sua vez, rebateu a acusação dizendo que ele se comportou como qualquer “policial razoável”, e seguiu o treinamento que recebeu ao longo de 19 anos no Departamento de Polícia de Minneapolis.

Segundo a defesa, Floyd teria morrido devido aos efeitos das drogas que usou, e não por asfixia. O laudo toxicológico afirma que o segurança tinha fentanil e metanfetamina no corpo, mas os médicos legistas do Ministério Público — um especialista em sistema respiratório e um médico do Departamento de Polícia de Louisville — afirmaram que a morte ocorreu devido à falta de oxigênio.

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Chauvin deteve Floyd por supostamente usar uma nota falsificada de US$ 20 para comprar cigarros. O vídeo da morte de Floyd, que foi exibido de vários ângulos, tornou-se uma peça central do julgamento. Os jurados passaram horas assistindo e revendo as imagens no tribunal.

Atenção: imagens fortes. Policiais cercam o detido, George Floyd, já no chão, e ele grita. A morte de George gerou mais protestos violentos pelo terceiro dia em Minneapolis, nos Estados Unidos. Após as manifestações, o policial foi preso
Atenção: imagens fortes. Policiais cercam o detido, George Floyd, já no chão, e ele grita. A morte de George gerou mais protestos violentos pelo terceiro dia em Minneapolis, nos Estados Unidos. Após as manifestações, o policial foi preso

Nos EUA, proteções sindicais que blindam policiais de investigações, padrões legais que lhes dão o benefício da dúvida e a tendência de aceitar a palavra dos agentes resultam em poucas condenações. Chauvin é o sétimo policial a ser condenado por assassinato em serviço desde 2005. Desde então, cerca de 15 mil homicídios foram cometidos por agentes.

Uso desproporcional da força

Nas três semanas de julgamento, os depoimentos mais impactantes foram de policiais experientes e superiores de Chauvin dizendo que ele fez uso desproporcional da força. Richard Zimmerman, o policial mais antigo do Departamento de Polícia de Minneapolis, disse que colocar um joelho no pescoço de alguém enquanto ele está algemado de bruços, disse ele, é empregar “força mortal”.

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— Se o seu joelho está no pescoço de uma pessoa, isso pode matá-la — disse o tenente Zimmerman, acrescentando que as pessoas algemadas geralmente representam pouca ameaça aos policiais.

Isto foi reforçado pelo depoimento de Medaria Arradondo, o chefe do Departamento de Polícia da cidade, que disse que Chauvin desrespeitou as normas técnicas e o código de ética do Departamento de Polícia de Minneapolis durante a prisão.

— Não faz parte da nossa formação e certamente não faz parte da nossa ética e dos nossos valores — disse Arradondo.

A ex-comandante do programa de treinamento do departamento, Katie Blackwell, também disse que o ato de Chauvin de colocar o joelho no pescoço de Floyd não estava de acordo com o treinamento fornecido aos oficiais.

— Não sei que tipo de posição improvisada é essa — disse Blackwell.

Dois paramédicos que atenderam Floyd testemunharam que o encontraram sem sinais de vida. Um deles, Derek Smith, sentiu o pescoço de Floyd enquanto os policiais ainda estavam em cima dele e disse que não detectou a pulsação sanguínea.

As tentativas de Smith de reanimá-lo, incluindo o uso de um desfibrilador e de uma máquina que fornece compressões torácicas, não tiveram qualquer efeito para melhorar a condição de Floyd.