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Lasso toma posse como presidente do Equador e promete vacinar metade da população em cem dias

Novo presidente lembra que 'a vacina não tem ideologia'; em discurso contra antecessores, ex-banqueiro anuncia fim da 'era dos caudilhos', uma referência a Rafael Correa
Jair Bolsonaro levanta o braço do novo presidente do Equador, Guillermo Lasso, durante sua posse em Quito Foto: STR / AFP
Jair Bolsonaro levanta o braço do novo presidente do Equador, Guillermo Lasso, durante sua posse em Quito Foto: STR / AFP

QUITO — Em um discurso de mais de uma hora, com fortes críticas aos governos anteriores, o ex-banqueiro de direita Guillermo Lasso foi empossado nesta segunda-feira como presidente do Equador para um mandato de quatro anos , substituindo Lenín Moreno. No discurso, Lasso prometeu começar um ousado plano de vacinação, que imunizaria 9 milhões de pessoas, ou seja, metade da população equatoriana, nos primeiros cem dias de governo, e pôr fim à "era dos caudilhos", em referência ao ex-presidente Rafael Correa, radicado na Bélgica.

— Entra em vigor agora o mesmo um plano nacional onde iremos vacinar 9 milhões de equatorianos nos primeiros cem dias de governo. Com isso, contamos com a ajuda da comunidade internacional, com todas as vacinas que sejam possíveis, porque a vacina não tem ideologia. Vacinaremos sem descanso, porque o vírus não descansa — afirmou.

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Com uma população de 18 milhões de pessoas, o Equador é o sétimo país da América Latina em número de casos (418.851) e mortes (20.193), de acordo com o site Our World in Data. Até agora, apenas 7,9% da população foram imunizados com pelo menos uma dose, e menos de 3% receberam duas doses. Para colocar em ação seu plano ambicioso, Lasso teria procurado a Rússia e a China para comprar vacinas e pôs um empresário farmacêutico, Carlos Cueva, a cargo do programa.

O presidente, um milionário de 65 anos e pai de cinco filhos, é o primeiro conservador eleito para governar o Equador em quase duas décadas. Em seu discurso, ele também criticou por várias vezes os governos anteriores . Sem citar diretamente Correa ou Moreno, anunciou o fim do que chamou de "era dos caudilhos" no país:

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— Neste governo, que nasce hoje, neste novo século de republicanismo, termina a era dos caudilhos — disse. — Reivindicamos este dia para recuperar a alma democrática deste país, que começa pelas coisas mais básicas: começa por não acumular mais poder na figura do presidente da República.  Depois de mais de dez anos de autoritarismo, aprendemos a mais grande lição democrática: que não existe democracia sem a participação dos cidadãos.

Apesar das críticas, no entanto, Lasso também afirmou que não perseguiria ou calaria seus adversários. Condenado a oito anos de prisão por corrupção,  Correa vive autoexilado na Bélgica, terra de sua mulher.

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— Governaremos para todos, não a favor de um setor privilegiado e nem contra ninguém. Que os ideais democráticos sirvam para reconstruir um país diverso onde todos tenham espaço. Esse círculo vicioso acaba aqui — afirmou. — O Equador precisa significar uma promessa de equilíbrio na vida comum, equilíbrio entre as causas de seu povo, equilíbrio entre o crescimento econômico e a justiça social. Dois fundamentos que serão os alicerces de um país próspero e igualitário.

Cultura da reconciliação

Lasso foi empossado pela presidente da Assembleia Nacional, Guadalupe Llori, deputada do Pachakutik eleita com o apoio do partido do presidente, o Movimento Criando Oportunidades (Creo), de direita. O apoio levou o líder indígena Yaku Pérez, terceiro lugar no pleito, a deixar o Pachakutik, braço político da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), dias depois.

Em seu discurso, Llori também fez críticas indiretas a Correa, a quem acusa de perseguição política.

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— Este é um dia histórico porque, depois de mais uma década, se respira a liberdade democrática e uma mudança de poder. A Assembleia Nacional e o Executivo não serão governados por pessoas da mesma linha política, mas começamos a reconstruir a cultura de reconciliação do Equador —  disse a deputada. — A palavra "esquerda" não é má, a palavra "direita" não é má. O perigo está na corrupção, no autoritarismo, na discriminação e na xenofobia. Perigosa é a palavra dogmatismo.

Apesar do discurso conciliatório, no entanto, o novo presidente encontrará dificuldade para aprovar medidas no Congresso com poucos aliados e liderado pelo Pachakutik, que se opôs diversas vezes a projetos dos setores de mineração e petróleo.

Na política externa, Lasso quer aumentar a pressão por acordos de livre comércio com seus maiores aliados e antecipou que o país pretende entrar na Aliança do Pacífico o mais rapidamente possível. O novo presidente assume uma economia que despencou 7,8% no ano passado e que só deve se recuperar ao seu nível pré-pandêmico em 2024, de acordo com uma previsão do FMI. Para tentar conter a crise agravada pela pandemia, o ex-banqueiro prometeu incentivar novos investimentos do setor privado e pedir uma revisão do acordo de US$ 6,5 bilhões do FMI para suavizar alguns de seus termos.

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— Enfrentamos meses difíceis pela frente, que testarão nossa determinação nacional — disse. — A partir de agora os convocamos a iniciar a reativação econômica sem medo. Aqui está a oportunidade esperada, mostrar que sem perseguições vocês estão prontos para colocar seus recursos a serviço da sociedade equatoriana.

Conservador da Opus Dei, o político também prometeu medidas para acabar com o preconceito de gênero e defendeu um governo laico, mas promovendo uma "reconciliação entre o Estado e as igrejas":

— A luta pela igualdade de gênero não é só das mulheres. É um problema nacional que deve ser abordado pelo governo equatoriano. Quando o desemprego afeta mais uma mulher do que um homem, quando uma mulher ganha menos que um homem, ou quando uma mulher é agredida, sofremos todos. Somos menos livres e menos justos. Colocaremos em prática todas as políticas necessárias para garantir que isso acabe.

Participaram da cerimônia os presidentes do Brasil, Jair Bolsonaro ; da República Dominicana, Luis Abinader; e do Haiti, Jovenel Moise, assim como do rei da Espanha, Felipe VI. A Secretaria de Comunicação havia antecipado a presença na posse dos presidentes da Colômbia, Iván Duque; do Chile, Sebastián Piñera; e do Uruguai, Luis Lacalle Pou. Eles não compareceram.