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Milhares vão às ruas no Leste da Alemanha contra extrema direita

População da Turíngia rechaça o polêmico apoio da AfD na eleição do primeiro-ministro do estado, Thomas Kemmerich, que renunciou ao cargo
Alemães protestam contra forças da extrema-direita na Turíngia Foto: JENS SCHLUETER / AFP
Alemães protestam contra forças da extrema-direita na Turíngia Foto: JENS SCHLUETER / AFP

TURÍNGIA — Milhares de manifestantes foram às ruas em Erfurt, capital do estado da Turíngia, onde, no último dia 5, pela primeira vez na história do pós-guerra na Alemanha , um líder regional foi eleito graças aos votos da extrema direita .

Os manifestantes se reuniram ao meio-dia no centro da cidade, sob o lema "Não aos pactos com os fascistas : Nunca e em lugar nenhum!". Entre cartazes e bandeiras, podia-se ler alguns que diziam "Não queremos o poder a qualquer preço".

A manifestação foi organizada por ONGs, artistas, sindicalistas e autoridades políticas, reunidos na aliança #Unteilbar (indivisível) e apoiados por movimentos como Fridays for Future e Bund.

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— Protesto porque a influência da AfD (o partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha) é muito incômoda nas regiões do Leste — afirmou a moradora de Erfurt Maria Reuter, 74. — Continuo sendo otimista, mas limites foram ultrapassados.

A escolha de Thomas Kemmerich , do Partido Democrático Liberal (FDP), como chefe do governo estadual pegou todos de surpresa. Foi a primeira vez que a União Democrata Cristã (CDU) da chanceler Angela Merkel se alinhou à extrema direita nesse tipo de eleição parlamentar.

Depois de severas críticas e protestos em várias cidades do país, Kemmerich acabou renunciando 24 horas após a sua eleição por uma margem estreita de votos. Mas para os organizadores da manifestação, o estrago já estava feito.

— Esta eleição marca o fim de um tabu — disse Maximilian Becker, porta-voz do grupo. —Queremos mostrar que o que acontece na Turíngia não ficará sem resposta.

Golpe baixo

A eleição ocorreu após meses de negociações infrutíferas para tentar formar uma coalizão majoritária depois da eleição regional de outubro. O AfD, que cresceu explorando sua oposição à política de imigração de Merkel, ficou em segundo lugar nas eleições estaduais daquele mês. O primeiro-ministro do estado, Bodo Ramelow , do partido A Esquerda, perdeu a maioria para liderar a coalizão regional ao lado dos social-democratas e dos verdes.

A votação do dia 5 pretendia confirmar Ramelow para um segundo mandato à frente de um governo minoritário. Depois de duas votações em que não conseguiu a maioria absoluta do Parlamento regional, Ramelow deveria ser confirmado com uma maioria simples. Em vez disso, o FDP indicou Thomas Kemmerich como candidato, com o apoio da CDU.

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Foi nesse momento que a AfD, que havia indicado seu próprio candidato, voltou atrás e apoiou o liberal Kemmerich, impedindo a reeleição de Ramelow. Em outubro, o FDP mal obteve votos suficientes para entrar no Legislativo estadual.

Clima de tensão

Como amostra do clima de tensão na Alemanha, sedes do FDP têm sido alvo de ataques em todo o país há dias, segundo a revista Spiegel. Na Turíngia , as instituições estão paralisadas há mais de uma semana.

Já a AfD, pretende continuar dinamitando o jogo político alemão. A extrema direita, acusada pela chanceler Angela Merkel de querer destruir a democracia, ameaça agora transferir seus votos, no caso de uma nova eleição na região, a Bodo Ramelow, personalidade da esquerda radical que esteve à frente da Turíngia até 2019 e rejeita qualquer contribuição de votos do outro extremo do tabuleiro político.

Os partidos, com exceção da AfD , devem se reunir na próxima segunda-feira, em Erfurt, para buscar uma saída para a crise. Várias opções estão sobre a mesa para governar a região, núcleo das incertezas envolvendo o cenário eleitoral alemão. A crise se propaga em uma Alemanha que viverá até 2021 o fim da era Angela Merkel, chanceler no poder há 14 anos.

Alguns membros do partido conservador CDU , principalmente nas regiões da antiga Alemanha Oriental , estão inclinados a se aliar à extrema direita, particularmente poderosa nessa parte do país, mais pobre.

Na Turíngia, o salário médio anual era de 35.701 euros em 2018, contra a média de 42.962 no país, segundo o departamento de estatísticas.

Embora o desemprego nesta parte da Alemanha seja apenas um pouco superior ao índice federal (5,3%, contra 5%), a Turíngia observa um grave déficit de natalidade, os jovens estão partindo, e mais de um em cada quatro habitantes (25,7%) tem mais de 65 anos, contra um em cada cinco na Alemanha.