Mundo Guerra na Ucrânia

Putin anuncia ações do Estado na economia para enfrentar guerra e diz que 'domínio global do Ocidente' está no fim

Presidente mistura nacionalismo, vitimismo e desafio aos EUA e à UE em discurso, mas reconhece que povo russso vai enfrentar mais desemprego e inflação
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, na reunião televisionada com ministros desta quarta-feira Foto: Agência RIA
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, na reunião televisionada com ministros desta quarta-feira Foto: Agência RIA

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou nesta quarta-feira um pacote econômico em que o Estado assume um papel muito maior na economia russa, com medidas como pagamentos de auxílios a pessoas com dificuldades e controle de preços de bens essenciais.

As medidas foram anunciadas em um discurso de alto teor político, no qual o presidente se dirigiu ao povo russo para justificar a invasão da Ucrânia. Suas afirmações, pronunciadas durante uma reunião televisionada com ministros, se dirigiram principalmente ao público interno e tiveram o objetivo de justificar a guerra, com tintas nacionalistas exacerbadas, muitas menções críticas ao Ocidente e vitimismo.

Os tópicos que abordou foram diversos: não houvesse o ataque, a Ucrânia receberia em breve ajuda estrangeira para desenvolver armas nucleares e lançaria uma ofensiva contra a Rússia. A “operação militar especial” — eufemismo oficial russo para a invasão — “era inevitável e “vai conforme o planejado”. As sanções econômicas contra o país não têm relação com a invasão. “O Ocidente”, ele disse, “está tentando cancelar a Rússia”.

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Em relação ao pacote econômico, as principais medidas, segundo a agência russa RIA, são: aumento dos pagamentos sociais; apoio direcionado para cidadãos que se encontram numa situação de vida difícil; monitoramento dos preços de bens essenciais; medidas para assegurar o emprego, incluindo ações para a formação avançada dos profissionais; concessão de empréstimos e redução das barreiras administrativas e a empresas.

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Várias vezes, Putin tentou descolar as sanções contra a Rússia da guerra, descrevendo-as como um tipo de medida que seria inevitável. Embora tenha reconhecido que as sanções farão “os custos da energia no Ocidente subirem” — o que, em teoria, deveria significar que os países ocidentais quisessem evitá-las —, Putin afirmou que o “Ocidente teria imposto sanções à Rússia de qualquer maneira, pois apenas buscava uma razão para impor sanções à Rússia”.

— A política de conter a Rússia é deliberada e de longo prazo — afirmou. — Quero dizer com a maior franqueza: por trás das conversas hipócritas e das ações atuais do chamado Ocidente coletivo, existem objetivos geopolíticos hostis. Eles não precisam, simplesmente não precisam de uma Rússia forte e soberana.

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Putin disse que o “Ocidente está tentando provocar confrontos civis na Rússia” e, para isso, “visa atingir todas as famílias russas” e lança “uma campanha de desinformação sem precedentes”. Ele criticou pontualmente algumas das sanções, como o bloqueio das reservas do Banco Central russo em ouro, euro e dólar depositadas no exterior, dizendo que “a captura de ativos russos no exterior é uma lição para os negócios russos”. Putin disse que é esperado um aumento na inflação e no desemprego.

— A nova realidade exigirá mudanças profundas na economia — afirmou.

Pouco depois, acrescentou que “direito de propriedade será respeitado”, para espantar lembranças da era soviética. Insinuou ainda que um calote é provável, citando um prognóstico da maioria dos analistas financeiros.

— Os Estados Unidos e a União Europeia efetivamente decretaram um calote russo — disse.

Dezenas de firmas, do Mc Donald's a grifes italianas, já anunciaram o fim das atividades na Rússia.

Putin comparou várias vezes as sanções ao nazismo, para incitar o orgulho russo pela vitória sobre a Alemanha de Hitler. Ele comparou as sanções aos “pogroms”, disse que “o regime pró-nazista de Kiev possivelmente em breve teria armas de destruição em massa” e afirmou que o Ocidente quer “organizar uma Blitzkrieg econômica”. Mesmo assim, empregou termos de forma nacionalista.

— Estou convencido de que uma autopurificação tão natural e necessária da sociedade só fortalecerá nosso país, nossa solidariedade, coesão e prontidão para responder a quaisquer desafios — afirmou.

Quanto à guerra, Putin afirmou que a sua operação militar especial estava "indo conforme o planejado". O conflito, porém, completa três semanas nesta quinta-feira sem que nenhuma das dez maiores cidades da Ucrânia tenha sido dominada, com a campanha pouco avançando e a maioria das forças russas em pausa, após perder centenas de veículos blindados e um número ainda indeterminado de soldados, mas estimado em milhares.

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O presidente russo acusou o Ocidente de levar as autoridades de Kiev a derramar sangue, fornecendo-lhes armas e mercenários. Segundo a Reuters, o presidente russo deve decidir nos próximos dias se interrompe a sua ofensiva, mas, de acordo com uma fonte russa não identificada da agência, "a chance disto é pequena".

No mesmo dia em que a Chancelaria russa anunciou avanços nas negociações, Putin fez no discurso uma breve menção a uma saída diplomática, dizendo que "sempre esteve disposto" a negociar. O tom geral de sua mensagem, entretanto foi de desafio e triunfo:

— Se o Ocidente pensa que a Rússia vai recuar, não entende a Rússia — disse Putin. — Os eventos atuais põem fim à dominação política e econômica global do Ocidente.