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Relações com a China estão no pior momento em mais de 40 anos, diz ministro da Defesa de Taiwan

Chiu Kuo-cheng diz que Pequim já tem capacidade de invadir a ilha, e afirma que militares precisam se manter em alerta permanente; representantes de EUA e China se comprometem em manter uma 'competição responsável'
Helicóptero leva bandeira taiwanesa durante ensaios para os festejos do Dia Nacional de Taiwan, a ser celebrado no dia 10 de outubro Foto: ANN WANG / REUTERS
Helicóptero leva bandeira taiwanesa durante ensaios para os festejos do Dia Nacional de Taiwan, a ser celebrado no dia 10 de outubro Foto: ANN WANG / REUTERS

TAIPÉ — O ministro da Defesa taiwanês declarou nesta quarta-feira que este é o pior momento das relações entre o arquipélago e a China em mais de quatro décadas, com trocas frequentes de acusações e com a incursão de dezenas aeronaves militares chinesas na zona de defesa aérea de Taiwan nos últimos dias. As palavras do ministro foram ditas no mesmo dia em que representantes do alto escalão dos governos dos EUA e da China se reuniram presencialmente para tentar aparar algumas arestas e garantir uma "competição responsável".

Antes de uma sessão parlamentar que analisou uma proposta para a compra de equipamentos militares, Chiu Kuo-cheng afirmou que a China tem a capacidade de invadir Taiwan “imediatamente”, e que poderia levar adiante uma operação para assumir o controle do território de forma total “até 2025”. Ele apontou que esse é apenas um cenário possível, mas que as autoridades precisam estar preparadas.

— Para mim, um militar, a urgência está agora, diante de mim — declarou, apontando que, para ele, este é o pior momento das relações entre Pequim e Taipé em mais de quatro décadas.

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Embora ações militares da China próximas ao espaço aéreo e às águas territoriais taiwanesas sejam recorrentes, a frequência de operações chinesas vem aumentando — entre sexta-feira da semana passada e terça-feira, 150 aeronaves militares, incluindo caças e bombardeiros com capacidade nuclear, estiveram na zona de defesa aérea de Taiwan.

Nesta quarta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, chamou as ações chinesas de “provocadoras e potencialmente desestabilizadoras”, e alertou para o risco de um erro de cálculo pelos envolvidos.

— É muito importante que ninguém tome ações unilaterais para mudar o status quo pela força Precisamos que a China interrompa essas ações — declarou, em entrevista à Bloomberg. Mais tarde, em coletiva de imprensa, reafirmou o compromisso “firme” dos EUA com Taiwan.

Resposta aos EUA

A movimentação é apontada como uma resposta de Pequim à mudança de estratégia de política externa dos EUA, que agora coloca a região da Ásia e do Pacífico como prioridade central de governo, tendo como objetivo a contenção da China .

Essa visão passa pelo fortalecimento de alianças com lideranças regionais, incluindo a formação de novos pactos de defesa, como o Aukus, ao lado de Reino Unido e Austrália, e a retomada de antigos fóruns, como o Quarteto, com Índia, Japão e Austrália.

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Além do apoio às nações da região, os EUA também intensificam suas operações militares em zonas consideradas de influência chinesa — no mês passado, navios americanos, britânicos e japoneses participaram de exercícios navais na costa de Okinawa, ilha do Japão que fica a 700 km de Taiwan. Para analistas, os voos chineses pelo Estreito de Taiwan são uma resposta aos exercícios e ao ao aumento da presença militar americana.

No Parlamento, o ministro Chiu reconheceu que, embora essas incursões não sejam direcionadas a Taiwan, as autoridades precisam ficar em alerta permanente, mais uma razão apontada para a aprovação do orçamento adicional de T$ 240 bilhões (R$ 47 bilhões) para a fabricação de novas armas, incluindo navios e mísseis.

Embora possua um governo democraticamente eleito e exerça um sistema político, legislativo e econômico próprio, Taiwan é vista como parte do território chinês, em uma política chamada de “Uma só China”, e parcerias do arquipélago com outras nações, como os EUA, são vistas como violação da soberania chinesa. Apens 17 países têm relações diplomáticas com Taipé.

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Os americanos concordaram, em 1979, em reconhecer Pequim como única representante do povo chinês, mas mantiveram uma aliança com Taipé, que inclui o fornecimento de armas, visando evitar um eventual controle chinês do Estreito de Taiwan, vital para a navegação na região.

Reunião inconclusiva

Nesta quarta, o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, e o responsável pela política externa no Partido Comunista chinês, Yang Jiechi, se reuniram em Zurique. A Casa Branca emitiu uma nota mencionando que Sullivan sugeriu áreas em que os dois países poderiam trabalhar juntos para "administrar a competição entre EUA e China" e  enfrentar "desafios transnacionais vitais". Segundo a nota, o conselheiro de Segurança Nacional também voltou a levantar uma série de questionamentos sobre ações chinesas, mencionando, além de Taiwan, as situações em Xinjiang, onde há denúncias de graves violações dos direitos humanos, em Hong Kong e no Mar do Sul da China.

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"Sullivan deixou claro que vamos continuar a investir em nossa própria força como nação e a trabalhar com nossos aliados e parceiros, e também continuar nosso contato com a China, em alto nível, para garantir uma competição responsável", diz a nota.

Do lado chinês, segundo a agência estatal Xinhua, Yang disse a Sullivan que um confronto entre a China e os EUA poderia causar "sérios danos aos dois países e ao mundo". O diplomata declarou ainda que os EUA "devem entender a natureza de ações que beneficiem os dois lados, além de compreender as políticas internas e externas da China". Por fim, Yang Jiechi afirmou que Pequim se opõe ao uso do termo "competição" para definir as relações bilaterais, e destacou que questões como Taiwan, Hong Kong  e Xinjiang dizem respeito à política interna chinesa.