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Atentados a bares na Alemanha foram motivados por xenofobia; autor deixou manifesto racista

Merkel classifica massacre como 'crime arrepiante' provocado pelo ódio e pelo racismo; cinco das nove vítimas eram de origem turca
Políciais vigiam a casa do suspeito de dois ataques a bares na Alemanha, que deixaram nove mortos Foto: THOMAS LOHNES / AFP
Políciais vigiam a casa do suspeito de dois ataques a bares na Alemanha, que deixaram nove mortos Foto: THOMAS LOHNES / AFP

BERLIM — Os ataques a tiros contra dois bares na cidade de Hanau, na Alemanha, na noite de quarta-feira, foram motivados por xenofobia, informou o ministro do Interior do estado de Hesse, Peter Beuth, nesta quinta-feira. Um alemão de 43 anos, identificado pela imprensa como Tobias R., fez vários disparos na direção de dois bares onde os frequentadores fumavam narguilé, um hábito comum no Oriente Médio, deixando pelo menos nove mortos.

De acordo com as autoridades, o suspeito tinha um histórico de extremismo de direita e foi encontrado morto em sua própria casa, ao lado do cadáver da mãe, de 72 anos, elevando o número de mortes para 11. O pai, que estava do lado de fora, escapou ileso. A chanceler federal Angela Merkel classificou o massacre como "um crime arrepiante" provocado por ódio, xenofobia e racismo.

— O racismo é um veneno, o ódio é um veneno que existe em nossa sociedade — afirmou Merkel. — É um dia muito triste para a Alemanha.

Local dos ataques
200km
Dinamarca
Tiros foram disparados de dentro de carro contra bares onde se fuma narguilé
Mar do
norte
Polônia
Berlim
Holanda
Alemanha
Bélgica
Frankfurt
Rep.
Tcheca
Hanau
França
Áustria
Suíça
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Tiros foram disparados de dentro de carro contra bares onde se fuma narguilé
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Hanau é uma cidade de 100 mil habitantes no estado de Hesse, a cerca de 25 quilômetros a leste de Frankfurt, onde vivem muitos imigrantes. Pelo menos cinco das vítimas eram turcos, de acordo com o embaixador de Ancara em Berlim. No Twitter, o porta-voz da Presidência turca,  Ibrahim Kalin, afirmou que o "racismo é um câncer coletivo" e disse esperar que "autoridades alemãs mostrem o máximo esforço para esclarecer o caso".

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O promotor público Peter Frank revelou ainda que o autor do massacre publicou nas redes sociais mensagens em vídeo e um manifesto que, "além de pensamentos obscuros e teorias absurdas da conspiração, apontava para pontos de vista profundamente racistas". O texto de 24 páginas, depois apagado da internet, expressa um "ódio aos estrangeiros e aos não brancos", explicou o jornalista alemão Peter Neumann, especialista em terrorismo do King's College de Londres.

"Ele faz um apelo ao extermínio de vários países do Norte da África, Oriente Médio e Ásia Central, usando termos explicitamente eugenistas, afirmando que a ciência demonstra que algumas raças são superiores", disse Neumann no Twitter. O terrorista alegava ter sido "vigiado toda sua vida pelos serviços secretos" —  embora nunca tenha sido fichado nem pela polícia nem pelo serviço secreto alemão —   e se descreve com um "celibatário involuntário", enquanto "confessa nunca ter mantido uma relação com uma mulher". Diz ainda que nunca encontrou parceira porque tinha "padrões muito altos".

O manifesto de Tobias R. o aproxima de autores de outros atentados do tipo ocorridos nos últimos anos na Noruega, nos Estados Unidos e na Nova Zelândia.  De acordo com David Begrich, sociólogo especialista na ultradireita, as teorias conspiratórias são comuns nesse círculo. "Há um clima de conjecturas e suspeitas, no qual sustentam que estão sendo manipulados, mas sabem da verdade", disse Begrich ao jornal espanhol El País.

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O primeiro tiroteio aconteceu em um bar de narguilé, o Midnight, em Kurt-Schumacher-Platz, no centro de Hanau, com oito ou nove disparos que partiram de um carro. Neste local, o atirador matou três pessoas. Em seguida, o criminoso seguiu em seu automóvel até um segundo estabelecimento, o Arena Bar, no bairro de Kesselstadt, na periferia da cidade, onde abriu fogo novamente, matando cinco pessoas, incluindo uma mulher. Uma nona vítima morreu no hospital.

— As vítimas são pessoas que conhecemos há muitos anos — afirmou o filho do gerente de um dos bares, onde dois funcionários estão entre as vítimas. — É um choque para todos.

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Nas redes sociais, o alto representante da União Europeia (UE), Joseph Borrell disse que a melhor maneira de expressar solidariedade com as famílias e vítimas "é agir contra o ódio, o racismo e a violência, dentro e fora da UE".

A imigração e a desaceleração da economia ajudaram a criar apoio a grupos radicais na Alemanha, que abriga três milhões de pessoas de origem turca, incluindo 1 milhão de curdos.Há poucos dias, uma pessoa morreu a tiros e quatro ficaram feridas perto de uma casa de shows em Berlim, que promovia um espetáculo de humor turco na noite do ataque. Os motivos do ataque na capital alemã não foram esclarecidos.

A ameaça de terrorismo da extrema direita também preocupa as autoridades alemãs, especialmente desde o assassinato em junho passado de um deputado do partido de Merkel que era favorável a imigrantes. Na sexta-feira passada, 12 membros de um grupo de extrema direita foram presos como parte de uma investigação antiterrorista. Acredita-se que eles planejavam ataques em larga escala contra mesquitas que imitavam o atentado de Christchurch na Nova Zelândia, em março de 2019, que deixou 49 mortos.

Em outubro do ano passado, outro extremista tentou atacar uma sinagoga em Halle. Como não conseguiu entrar no prédio, atirou em um transeunte e no cliente de um restaurante de kebab.