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Atirador que atacou mercado judaico em Nova Jersey escreveu textos antissemitas

Suspeito teria vínculos com movimento ‘Israelitas Hebreus Negros’ , que é considerado grupo de ódio e não tem reconhecimento da comunidade judaica
Foto: RICK LOOMIS / AFP
Foto: RICK LOOMIS / AFP

NOVA JERSEY - Um dos atiradores envolvidos nos ataques que deixaram seis pessoas mortas, incluindo um policial, nesta terça-feira em Jersey City, Nova Jersey, tem vínculos com o movimento Israelitas Hebreus Negros, classificado como um grupo de ódio, e publicou textos anti-semitas online, disse uma autoridade policial nesta quarta-feira.

A maior parte do ataque violento  aconteceu em um supermercado kosher, onde três pessoas foram mortas. As autoridades agora acreditam que a loja foi escolhida por seus vínculos com o judaísmo.

A polícia identificou os dois suspeitos como David Anderson e Francine Graham. Anderson parece ser ligado ao movimento Israelitas Hebreus Negros, embora o grau de seu envolvimento nesse grupo permaneça incerto, disse a autoridade.

Os Israelitas Hebreus Negros não têm conexão com o judaísmo convencional e não são reconhecidos pela comunidade judaica. O Southern Poverty Law Center (SPLC), um grupo da sociedade civil que acompanha movimentos de ódio, os denominam como um grupo deste tipo.

elo menos seis pessoas, incluindo um policial e os dois suspeitos, foram mortas em Jersey City, em Nova Jersey, na tarde desta terça-feira, após duas pessoas abrirem fogo numa loja de conveniências.
elo menos seis pessoas, incluindo um policial e os dois suspeitos, foram mortas em Jersey City, em Nova Jersey, na tarde desta terça-feira, após duas pessoas abrirem fogo numa loja de conveniências.

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Bomba no carro

No final de 2008, o SPLC escreveu que "faixas extremistas" do movimento defendem a supremacia negra. Também disse que os membros radicais desses grupos "acreditam que os judeus são impostores diabólicos e (..) condenam abertamente os brancos como personificando o mal, merecedores apenas da morte ou da escravidão". O SPLC também disse que "a maioria dos israelitas hebreus não é explicitamente racista nem antissemita e não defende a violência".

Os investigadores encontraram um texto escrito em tom de manifesto dentro da van dos agressores, disseram as autoridades policiais e outro agente familiarizado com o caso. O documento, descrito como breve e "desmedido", não sugeria qualquer motivo claro para o tiroteio. Os investigadores também encontraram uma bomba caseira dentro do veículo, disse o oficial da lei.

O policial não pôde fornecer mais detalhes sobre os textos na internet escritos pelo suspeito, nem onde foram publicados. Ele disse que os investigadores ainda estão revisando essas informações.

Nenhuma das três vítimas dentro da loja teve o nome revelado pelas autoridades, mas várias pessoas ligadas à comunidade judaica em Jersey City identificaram duas delas como Mindel Ferencz, 33, que gerenciava o mercado com o marido, e Moshe Deutch, um estudante rabínico de 24 anos que vivia no Brooklyn. O policial de Jersey City que foi morto foi identificado na terça-feira como o detetive Joe Seals, que trabalhava como agente há 15 anos e pai de cinco filhos.

Supermercado kosher foi alvo

O prefeito de Jersey City, Steven Fulop, disse que as imagens de câmeras de vigilância mostram  que os dois atiradores tinham como alvo um supermercado kosher, onde a maior parte do ataque aconteceu.

Fulop disse na quarta-feira que as imagens revelaram que, depois que os agressores atiraram no detetive Seals, em um incidente anterior, eles dirigiram lenta e deliberadamente até o mercado, a cerca de 1,6 km de distância dali.

— Ontem à noite, após uma extensa revisão do nosso sistema de câmeras de segurança, ficou claro pelas câmeras que esses dois indivíduos tinham como alvo o local de compras Kosher — afirmou. — Os criminosos pararam na frente do mercado e calmamente abriram a porta com dois fuzis.

Tanto Fulop quanto o diretor de segurança pública de Jersey City, James Shea, disseram que depois que os agressores deixaram a van, eles passaram por transeuntes na rua e alvejaram pessoas dentro do supermercado. Dois policiais que estavam a duas quadras dali responderam ao incidente, acrescentou.

— Agora sabemos que o incidente não começou com tiroteios entre policiais e agressores e depois se transferiu para a loja — disse Shea. — Primeiro houve um ataque aos civis dentro da loja.

Fulop não disse se a violência estava relacionada ao antissemitismo, embora em um post relacionado no Twitter, ele tenha acrescentado que "o ódio e o antissemitismo nunca fizeram parte” de Jersey City.

Segundo Shea, os motivos dos agressores ainda estão sendo investigados.

Inicialmente, os investigadores disseram acreditar que os agressores escolheram o mercado aleatoriamente e que o episódio não era um crime de ódio; Shea acrescentou na terça-feira que "não há indicação" de terrorismo.

Na noite de terça-feira, no entanto, Fulop disse no Twitter que as autoridades chegaram a acreditar que os agressores tinham "escolhido o local que atacaram".

Tiroteio no cemitério

Na terça, o detetive Seals se aproximou dos dois agressores, um homem e uma mulher, que estavam dentro de uma van do serviço de entregas U-Haul em um cemitério perto do mercado kosher porque o veículo estava ligada a um homicídio no fim de semana, de acordo com as autoridades.

As imagens de vigilância por vídeo mostram a dupla atirando no detetive e depois fugindo e estacionando em frente ao mercado kosher, onde entraram armados.

Por quase uma hora, os moradores das redondezas puderam ouvir disparos rápidos de tiros vindos da área ao redor do mercado. Mais tarde, os investigadores encontraram uma bomba dentro da van, disse o funcionário.

Líderes comunitários hassídicos na manhã desta quarta-feira deram mais detalhes sobre as vítimas. Mindel Ferencz, cuja família era dona do mercado, estava trabalhando na loja no momento do ataque. Cerca de cinco anos atrás, ela e o marido estavam entre os primeiros judeus hassídicos a se mudarem para Jersey City de Williamsburg, no Brooklyn. O casal teve três filhos, disse o rabino Mordechai Feuerwerker, líder da comunidade hassídica local.

— Eu já chorei muito. Estou me sentindo arrasada — disse a sogra da vítima, Victoria Ferencz, 72, que ouviu a notícia na quarta-feira de manhã pela mídia judaica. — Sinto muito pelo meu filho. Ela está indo para o céu, mas ele e seus filhos terão dificuldades.

No momento do tiroteio, o filho havia ido a uma sinagoga próxima e a mulher ficou no mercado, contou. Tiros foram ouvidos e a sinagoga foi bloqueada.

Outra vítima foi Deutsch, o estudante rabínico de 24 anos. Em Manhattan, em uma entrevista coletiva na prefeitura, o rabino David Niederman, diretor executivo e presidente das Organizações Judaicas Unidas de Williamsburg, disse que Deutsch ajudou a liderar um movimento de coleta de alimentos neste ano durante as férias  e ajudou a alimentar duas mil pessoas.

O rabino Niederman descreveu o Deutsch como "extremamente gentil e generoso" e uma "pessoa sempre lembrada quando seus colegas precisavam de ajuda".

Enquanto ele falava sobre a jovem vítima, o rabino engasgou.

— Você pode imaginar algumas centenas de balas entrando no corpo de uma criança de 24 anos? — disse o rabino Niederman. — Como nós, como povo, comunidade, suportamos isso?