Mundo Celina

Multidão toma as ruas de Santiago em marcha no Dia Internacional da Mulher

Mais de 2 milhões de pessoas participaram do ato, segundo organizadoras; protestos pelo mundo pediram proteção contra agressões e igualdade de direitos
Dois milhões de pessoas participam de marcha no Dia Internacional das Mulheres em Santiago Foto: STRINGER / REUTERS
Dois milhões de pessoas participam de marcha no Dia Internacional das Mulheres em Santiago Foto: STRINGER / REUTERS

SANTIAGO — Uma multidão estimada em 2 milhões de pessoas, de acordo com os organizadores, tomou as ruas de Santiago em uma manifestação que marcou o Dia Internacional da Mulher. A marcha se concentrou na Praça Itália , centro da capital chilena e espécie de símbolo dos protestos que há quatro meses pressionam o governo de Sebastián Piñera e já conseguiram mudanças práticas, como a convocação de um referendo sobre a elaboração de uma nova Carta Magna . A atual foi elaborada ainda na ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).

Multidão tomou as ruas do centro de Santiago neste domingo: organizadores falam em 2 milhões de pessoas.
Multidão tomou as ruas do centro de Santiago neste domingo: organizadores falam em 2 milhões de pessoas.

O protesto transcorreu de forma pacífica, com alguns incidentes isolados. Segundo os carabineiros, 19 agentes ficaram feridos e 16 pessoas foram presas. Longe dos confrontos, muitas manifestantes portavam lenços verdes, símbolo de um movimento surgido na Argentina em defesa da legalização do aborto no país e rapidamente replicado pelo mundo, além de cartazes pedindo ações do governo e da sociedade para enfrentar a violência contra as mulheres. O hino contra a opressão machista, "O estuprador é você", surgido em protestos no final do ano passado, foi executado até mesmo diante do palácio de La Moneda, sede da Presidência.

— Somos uma geração de mulheres que gritou e acordou. Não temos mais medo, nos atrevemos a falar e lutar — disse Valentina Navarro, de 21 anos, à agência Reuters.

Desde o início dos protestos no Chile, no ano passado, surgiram centenas de denúncias de abuso sexual cometidos contra manifestantes, especialmente por forças de segurança. Em resposta, feministas chilenas passaram a convocar atos cada vez mais frequentes e numerosos, como forma de pressão sobre as autoridades. O surgimento de "O estuprador é você", replicado nas ruas de vários países e até por deputadas do Parlamento da Turquia, deu ainda mais visibilidade ao movimento. Segundo números oficiais, sete mulheres foram mortas em 2020 e mais de 60 em 2019, simplesmente pelo fato de serem mulheres.

Manifestantes fazem performance de dança durante protesto em Santiago Foto: STRINGER / REUTERS
Manifestantes fazem performance de dança durante protesto em Santiago Foto: STRINGER / REUTERS

Além da marcha, foi convocada uma greve geral das mulheres neste domingo e na segunda-feira.

— Sabemos que hoje vamos fazer história. Hoje damos início a um ano de mobilizações, revolta, onde o feminismo será protagonista — disse Javiera Manzim, representante do Coordinadora 8M, responsável pelo ato deste domingo. Ela também ressaltou que um dos temas em destaque neste domingo é a defesa de uma maior participação feminina na política. Na semana passada, o Congresso aprovou um mecanismo para garantir a paridade entre homens e mulheres em uma eventual Assembleia Constituinte. Hoje há apenas 35 mulheres no Parlamento do país, que tem 155 cadeiras.

Em mensagem para o Dia Internacional da Mulher, a alta comissária da ONU para os direitos humanos, a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet , também defendeu o aumento da presença feminina na vida política.

"Mudar os estereótipos de gênero exige maior presença das mulheres na vida pública e maior reconhecimento de suas contribuições. Mais mulheres na política é a base para conseguir sociedades melhores e democracias mais fortes", afirmou na nota.

Contra o feminicídio

O Dia Internacional da Mulher também foi marcado por manifestações em várias cidades ao redor do mundo. Na Cidade do México, o foco das ações foi o aumento no número de casos de feminicídio — estima-se que sejam 10 todos os dias. As manifestantes escreveram o nome de 3 mil mulheres mortas desde 2016 na frente do Palácio Nacional, sede do Executivo mexicano, e defenderam punições aos agressores e políticas de proteção mais efetivas. Assim como no Chile, foi convocada uma greve geral das mulheres nesta segunda-feira.

Manifestantes pintam os nomes de 3 mil vítimas de feminicídio diante da sede do governo na Cidade do México Foto: HENRY ROMERO / REUTERS
Manifestantes pintam os nomes de 3 mil vítimas de feminicídio diante da sede do governo na Cidade do México Foto: HENRY ROMERO / REUTERS

Na Argentina, o maior protesto foi marcado para a segunda-feira, e o tema principal promete ser a legalização do aborto. O presidente Alberto Fernández vai enviar um projeto de lei sobre o tema para o Congresso e há oposição de alguns setores da sociedade, como a Igreja. Em um dos atos deste domingo, um grupo se reuniu diante da Catedral de Buenos Aires para um panelaço, algo que se repetirá na segunda-feira. Já em Luján , a cerca de 68 km da capital argentina, o bispo da cidade realizou uma missa contra o aborto, acompanhada por centenas de pessoas. O lema do evento foi "Sim às mulheres, sim à vida".

Na Europa, os atos foram esvaziados por causa do coronavírus, mas levaram algumas milhares de pessoas às ruas. No maior deles, em  Madri, o repúdio à violência contra a mulher foi o principal tema: um dos cartazes levados pelas manifestante dizia que "o machismo mata mais do que o coronavírus". Depois um estupro coletivo ocorrido em Pamplona , em 2016, o movimento feminista ganhou força no país, colocando o governo contra a parede para aprovar medidas mais duras contra os abusadores. Uma delas foi apresentada em janeiro, um projeto que muda a lei sobre casos de abuso, estabelecendo que qualquer forma de contato sexual não-consentido será considerada estupro. O projeto enfrenta oposição do partido Vox, de extrema direita, que vê a proposta como uma forma de "discriminação contra os homens".

Manifestantes em marcha no Dia Internacional das Mulheres, em Madri Foto: PIERRE-PHILIPPE MARCOU / AFP
Manifestantes em marcha no Dia Internacional das Mulheres, em Madri Foto: PIERRE-PHILIPPE MARCOU / AFP

Também por causa do coronavírus, atos na Coreia do Sul acabaram cancelados — o país registra o segundo maior número de casos fora da China. Nas Filipinas, o alvo foi o presidente Rodrigo Duterte, conhecido por seus comentários pouco protocolares sobre as mulheres. Uma efígie dele foi queimada. No Paquistão, pequenos grupos foram às ruas pedir mais direitos, mais segurança contra abusos e o fim de regras relacionados a "códigos de honra", que por vezes condena as mulheres à morte. No Quirguistão, participantes de um ato contra a violência de gênero foram atacadas por homens mascarados e presas logo depois. As autoridades disseram que elas foram detidas "para sua própria segurança" e que a manifestação não fora informada com antecedência.