Clima e ciência
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Por Ana Lucia Azevedo

É no lugar mais frio da Terra que acontece um dos maiores extremos climáticos já registrados. A Antártica está com a menor cobertura de gelo marinho em pleno inverno, quando ele deveria aumentar em vez de diminuir. E os extremos se manifestam em seu maior símbolo, o pinguim-imperador. O calor das mudanças climáticas matou uma geração inteira do animal que simboliza a resiliência da natureza, revela um estudo publicado nesta quinta-feira por cientistas da British Antarctic Survey (BAS).

A morte dos pinguins, o degelo das grandes plataformas no literal fim do mundo não é a história triste de um reino distante. A Antártica é um dos grandes agentes do clima global. Se a Antártica tem problemas, o resto do planeta sente também, na forma de calor, tempestade, seca e todo tipo de extremo, alertam os cientistas.

Os pinguins-imperadores, símbolos da Antártica e da resistência porque se reproduzem sob tempestades de neve acossados por fome e ventos com a força de furacões, sucumbiram a um degelo recorde, em 2022. Com as perdas previstas para 2023, a espécie, a maior dos pinguins, entra em rota de extinção.

Derretimento do gelo — Foto: Editoria de Arte
Derretimento do gelo — Foto: Editoria de Arte

Praticamente todos os filhotes morreram em quatro das cinco principais colônias da espécie porque não houve gelo onde o frio que já não é mais eterno, destaca o estudo publicado hoje na revista Communications Earth and Environment, do grupo da britânica Nature.

— Nunca vimos os pinguins-imperadores falharem na reprodução numa escala dessas — frisou o líder do estudo, Peter Fretwell.

A dimensão da tragédia fez a normalmente comedida linguagem científica subir o tom: “Redução recorde de gelo em 2022 leva à catastrófica falha na reprodução de pinguins-imperadores”.

A tragédia dos imperadores aconteceu nas colônias do centro e do leste do Mar de Bellingshausen, sua principal área de reprodução. Os pinguins dependem das plataformas de gelo sobre o mar para fazer seus ninhos e é nelas que os filhotes eclodem e criam penas. Mas em 2022 a perda nessa região de Bellingshausen foi de 100% e não houve gelo para os pinguins se criarem.

Degelo recorde devasta os pinguins-imperadores

Degelo recorde devasta os pinguins-imperadores

É uma notícia ruim para toda a Humanidade, destacou a glaciologista (especialista em gelo) da Universidade de Leeds, Anna Hogg, não envolvida no estudo. A Antártica tem 90% do gelo do planeta. Desempenha papel crucial na regulação do clima da Terra. Se as coisas vão mal na Antártica, vão mal mundo afora. É de lá que vem o frio essencial para o regime climático da América do Sul.

Os polos Norte e Sul influenciam o clima planetário de forma mais crítica que as demais regiões. E são também os mais sensíveis a alterações.

A Antártica tem registrado recorde sobre recorde de extremos. Foi medido lá em 2022 o maior aumento de temperatura da Terra. O aumento aconteceu justamente no lugar mais frio da própria Antártica e de toda a Terra. Em 18 de março de 2022, a estação de pesquisa Concordia, no interior do continente, registrou -11,5°C.

Parece gelado. Só que não para lá, onde o normal oscila em torno de -49°C. Isso fez daquele dia 38°C mais quente que o normal. Seria o mesmo que dizer que a temperatura de São Paulo chegou a 58°C num dia em que se esperaria 20°C.

Perto do ponto sem retorno

A Antártica viu em 2022 o maior aquecimento já registrado no planeta. E em 2023 o que já era uma desgraça se agravou de tal forma que fez cientistas alertarem que a Antártica pode estar perto de um ponto de não retorno, caso o gelo não volte a se formar e pode colapsar muito antes que outros hotspots do clima global, como a Amazônia.

Regina Rodrigues professora de oceanografia e clima da Universidade Federal de Santa Catarina e coordenadora do grupo que estuda o Oceano Atlântico e suas ondas de calor da Organização Meteorológica Mundial (OMM), destaca que as mudanças em curso no continente mais frio da Terra são as mais impressionantes em curso.

Em 2023 algo nunca registrado acontece em pleno inverno de trevas da Antártica. O gelo marítimo que forma uma espécie de barreira em torno do continente não está se recompondo como seria normal no inverno.

Um volume sem precedentes de gelo derreteu em fevereiro, no verão. Mas havia confiança de que, com a chegada do severo inverno da Antártica, ele seria recomposto. Não foi isso o que aconteceu.

Perda do tamanho do Amazonas

O inverno chegou, o Sol não se ergue acima da linha do horizonte, mas a extensão de gelo marinho está 1,5 milhão de quilômetros menor do que o recorde de redução anterior, batido em 2022. Isso significa que este ano uma área do tamanho do estado do Amazonas está sem gelo.

Se o declínio continuar, as consequências serão sentidas mundo afora. O gelo marinho, como o nome indica, já está no mar e por isso seu derretimento não afeta o nível dos oceanos. Mas sem ele, as plataformas de gelo em terra perdem a proteção contra a ação erosiva do mar e são comidas pelas entranhas. Elas começam a derreter e aí sim, o nível do mar se eleva, pondo em risco cidades costeiras.

Menos gelo, mais aquecimento. Pois o gelo é branco e reflete a radiação solar. Já o oceano é mais escuro, absorve calor e esquenta. Isso gera uma reação em cadeia. Menos gelo se forma, mais calor é exportado, a salinidade é reduzida, as correntes marinhas se alteram e o clima muda.

— O gelo não está se formando nem em plena noite perpétua do inverno antártico. Era para o gelo estar aumentando e ele está diminuindo. Isso assusta muito e espero que seja temporário — ressalta Rodrigues.

Tanto gelo foi perdido que pode levar décadas, talvez séculos, para que se recupere, disse a oceanógrafa Anna Hogg, uma das autoras de um recém-lançado estudo sobre a situação da Antártica.

Enquanto isso, os imperadores, famosos pela longa marcha para alcançar suas áreas de reprodução, marcham literalmente para o desconhecido. O grupo da BAS prevê que, mantido o ritmo de aquecimento, 90% de todas as colônias terão desaparecido até o fim do século.

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