Mundo Guerra na Ucrânia

Com comboio gigantesco perto de Kiev, Rússia avisa que atacará alvos na capital e tira TVs do ar

Sede do governo da segunda maior cidade do país é bombardeada em nova fase da ofensiva de Moscou, que pede que moradores se afastem de locais estratégicos na capital
Foto divulgada pelo Ministério do Interior ucraniano mostra fumaça após um ataque com mísseis contra uma torre de TV em Kiev Foto: - / AFP
Foto divulgada pelo Ministério do Interior ucraniano mostra fumaça após um ataque com mísseis contra uma torre de TV em Kiev Foto: - / AFP

KHARKIV e KIEV, UCRÂNIA — Com um comboio gigantesco aparentemente pronto entrar na capital da Ucrânia , Kiev, o governo russo atacou a principal torre de rádio e TV da cidade na tarde desta terça-feira, interrompendo todas as transmissões, de acordo com o Ministério do Interior ucraniano. Cinco pessoas morreram, segundo o governo local.

Embora Moscou tenha anunciado nesta terça que atacaria alvos militares em Kiev, e pedido que os civis se retirassem das proximidades, não se sabe, ainda, quando e se as forças russas desfechariam um ataque terrestre maciço à capital, o que, segundo disseram fontes do governo americano ontem, poderia demorar ainda mais de 24 horas.

Vídeos capturaram pelo menos mais duas explosões na área próxima à torre. Em comunicado no Facebook, o Ministério do Interior da Ucrânia confirmou que os canais de TV estão temporariamente fora do ar, "porque o hardware de transmissão da torre foi danificado". A torre, no entanto, não foi derrubada.

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Após o bombardeio, o Ministério das Relações Exteriores disse que a Rússia foi "bárbara". O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, confirmou que o Memorial do Holocausto de Babi Yar foi atingido . O museu fica no local em que em que 30 mil judeus ucranianos foram mortos em setembro de 1941, durante a Segunda Guerra Mundial pelos nazistas.

— Qual o sentido de dizer 'nunca mais' por 80 anos, se o mundo fica quieto quando uma bomba cai no local de Babi Yar?  — afirmou  o presidente.

Kiev está cercada há vários dias. Imagens de satélite registraram, na noite de segunda-feira, um comboio de veículos militares russos de cerca de 64 quilômetros de extensão indo em direção à cidade. Segundo a empresa Maxar, responsável pela imagem, podem ser vistos tanques, peças de artilharia, veículos de transporte e outros equipamentos de logística.  De acordo com a CNN, a fila se estende da área ao redor do aeroporto de Antonov, que fica a cerca de 25 quilômetros do Centro de Kiev, ao sul, até a cidade de Prybirsk, ao norte.

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Antes do ataque à torre de TV, o Ministério da Defesa russo anunciara que iria atacar locais em Kiev pertencentes ao serviço de segurança da Ucrânia, além de uma unidade de operações especiais. Os ataques, segundo nota do ministério publicada nas agências de notícias russas Tass e RIA, visam evitar "ataques de informação" contra a Rússia, para "acabar com a guerra psicológica e midiática" da Ucrânia. O comunicado também instava moradores próximos a esses locais a deixarem suas casas.

Segundo a ONU, até agora 136 civis foram mortos na ofensiva russa na Ucrânia, sendo 13 crianças, e 400 ficaram feridos. O Ministério das Relações Exteriores da Índia confirmou que um estudante indiano foi morto durante o bombardeio em Kharkiv.

A cidade de Kharkiv está sob cerco intenso desde que o presidente russo, Vladimir Putin, ordenou a invasão contra a Ucrânia.
A cidade de Kharkiv está sob cerco intenso desde que o presidente russo, Vladimir Putin, ordenou a invasão contra a Ucrânia.

Em Moscou, o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, foi na direção contrária à do governo ucraniano e justificou a ofensiva em termos defensivos.

— O principal para nós é proteger a Federação Russa da ameaça militar representada pelos países ocidentais que estão tentando usar o povo ucraniano na luta contra nosso país — disse ele, afirmando ainda que a Rússia busca evitar expor civis. —  Gostaria de salientar que os ataques são realizados apenas em alvos militares e exclusivamente com armas de alta precisão.

Ele chamou a atenção para o fato de que os militares russos não estão ocupando o território ucraniano. Segundo ele, durante os confrontos, o lado ucraniano coloca "sistemas de lançamento de foguetes, armas e morteiros de grande calibre nos pátios de prédios residenciais, perto de escolas e jardins de infância, e usa civis como escudos humanos".

Ataque em Kharkiv

Durante a madrugada, o prédio do governo regional da segunda maior cidade da Ucrânia , Kharkiv, foi atingido por um míssil. deixando pelo menos dez mortos e 35 feridos de acordo com o assessor do Ministério do Interior, Anton Herashchenko. Zelensky classificou os ataques a Kharkiv como "terrorismo de Estado".

— Lançar um míssil na praça central de Kharkiv é uma verdadeira ação terrorista. Assim, a Rússia se tornou um Estado terrorista, e peço que todos reconheçam isso. Ninguém vai perdoar isso, ninguém vai esquecer — disse Anton, se referindo à Praça da Liberdade, onde fica o prédio da administração regional atingido.

Ataque russo ao prédio do governo regional da segunda maior cidade da Ucrânia, Kharkiv Foto: Foto: Divulgação/Serviço de Emergência da Ucrânia/AFP
Ataque russo ao prédio do governo regional da segunda maior cidade da Ucrânia, Kharkiv Foto: Foto: Divulgação/Serviço de Emergência da Ucrânia/AFP

Entre os prédios atingidos estava o que abriga o consulado da Eslovênia — não havia ninguém no local no momento do ataque.

"Infelizmente, fomos informados de que em um dos ataques militares à cidade de Kharkiv, o Consulado da República da Eslovênia na Ucrânia também foi destruído. Condenamos este ato ultrajante da Federação Russa e sua agressão contra a Ucrânia", escreveu, no Twitter, o Minstério das Relações Exteriores, ao lado de uma hashtag em apoio aos ucrananos.

Josep Borrell, chefe de política externa da União Europeia, por sua vez, afirmou que o bombardeio russo viola as "leis de guerra".

Essa é a segunda vez que Kharkiv é alvo de um grande ataque russo desde o início da guerra, mas, até o momento, a cidade, com 1,4 milhão de habitantes e a apenas 65 quilômetros da fronteira da Rússia, permanece nas mãos dos ucranianos.

Durante a madrugada, outras cidades também sofreram ofensivas russas. No Leste do país, tropas de Moscou atacaram as cidades de  Mariupol e Volnovakha, localizadas entre o território controlado pelos rebeldes separatistas e a Península da Crimeia , anexada pela Rússia em 2014. Enquanto Mariupol ficou sem energia elétrica, Volnovakha, de 20 mil habitantes, ficou praticamente "destruída", de acordo com o governador da região, Pavlo Kirilenko.

"As duas cidades estão sob pressão do inimigo, mas estão resistindo. Em Mariupol, as linhas de energia foram cortadas e a cidade está sem eletricidade", escreveu o governador no Facebook. "Mariupol e Volnovakha são nossas."

Centro de Kharkiv, Ucrânia, área perto do prédio da administração regional, que autoridades da cidade disseram ter sido atingida por um ataque de míssil Foto: Reuters
Centro de Kharkiv, Ucrânia, área perto do prédio da administração regional, que autoridades da cidade disseram ter sido atingida por um ataque de míssil Foto: Reuters

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Mariupol é um porto estratégico onde vivem quase meio milhão de pessoas. A cidade foi cenário de um conflito em 2014, quando foi ocupada pelos separatistas pró-Rússia e depois retomada pelas forças ucranianas.

Após o ataque, o comandante das forças separatistas do território pró-Rússia de Donestk, Eduard Basurin, anunciou que que Mariupol "será completamente cercada" nesta terça-feira. Segundo ele, as tropas permitirão que os civis deixem a cidade por "dois corredores humanitários" abertos até quarta-feira.

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O Exército russo também se aproxima da cidade de Kherson, no Sul do país, declarou na madrugada desta terça-feira o prefeito Igor Kolikhayev. Nas redes sociais, vídeos mostram as forças russas já entrando na cidade, de 290 mil habitantes, que fica ao norte da Península da Crimeia.

A partir da Crimeia, as tropas russas avançaram em direção a essa região do território ucraniano e, durante o fim de semana, tomaram o controle de Berdiansk, no Mar de Azov, e cercaram Kherson.

"O Exército da Rússia está instalando pontos de controle nas entradas de Kherson. É difícil dizer como a situação vai evoluir", afirmou o prefeito em sua página no Facebook.

Apesar da ofensiva, no entanto, até agora o Exército russo não tomou nenhuma grande cidade ucraniana . Para proteger a capital, Zelensky anunciou um novo plano de defesa, que inclui a nomeação de um novo general para fazer a estratégia militar e o prefeito, Vitalii Klitschko, para organizar a parte civil e de voluntários. O mandatário afirmou que defender Kiev "é prioridade", já que a queda da capital significaria uma grande chance de vitória dos russos na guerra.

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