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Conheça os 10 pontos principais do acordo de reconstrução pós-pandemia da União Europeia

Pacto histórico foi firmado após quatro dias de negociações em Bruxelas e estabelece a criação de um fundo de R$ 4,57 trilhões
Primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sanchez (esquerda), presidente francês Emmanuel Macron (centro) e chanceler alemã Angela Merkel observam documentos Foto: JOHN THYS / AFP
Primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sanchez (esquerda), presidente francês Emmanuel Macron (centro) e chanceler alemã Angela Merkel observam documentos Foto: JOHN THYS / AFP

BRUXELAS — Após uma cúpula de quatro noites, os 27 países-membros da União Europeia aprovaram o primeiro grande pacote de estímulos para fazer frente à pandemia . Em abril, o bloco já havia concordado em desbloquear empréstimos de emergência de até € 420 bilhões (R$ 2,5 trilhões), mas o que foi aprovado nesta terça é inédito. O plano prevê uma série de novos investimentos que serão destinados a recuperar os danos que a Covid-19 causou na economia europeia. Conheça os principais pontos do acordo:

Dívida

A Comissão Europeia irá ao mercado para captar € 750 bilhões (R$ 4,57 trilhões). A emissão de títulos conjuntos de dívida europeia, que se encerrará em 2026 (e deverá ser quitada até 2058), provoca há anos discordâncias internas. Por isso, ficou estipulado que seu único fim será fazer frente às consequências da pandemia de Covid-19.

Tamanho

O fundo será de € 750 bilhões (R$ 4,57 trilhões). Apesar do empenho dos chamados “quatro frugais” — Holanda, Áustria, Dinamarca e Suécia — para enfraquecê-lo, acabou mantendo o mesmo volume inicialmente proposto pela Comissão Europeia e pelo presidente do Conselho Europeu, Charles Michel.

Sua composição, no entanto, foi alterada: 90% dos recursos serão destinados ao Fundo de Recuperação e Resiliência (FRR), que deverá financiar investimentos e reformas nacionais apresentadas a Bruxelas. O fundo para salvar empresas, por sua vez, desapareceu. O orçamento plurianual da UE (2021-2027) terá o volume proposto por Michel, € 1,074 trilhão (R$ 6,55 trilhões) — valor inferior ao € 1,1 trilhão (R$ 6,7 trilhões) cogitado em versões iniciais do acordo.

Subsídios e empréstimos

O equilíbrio entre doações e empréstimos também mudou em relação à proposta original. Inicialmente, a Comissão previa que os subsídios fossem € 500 bilhões (R$ 3 trilhões), ou cerca de 66% do total, de modo a não aumentar a dívida dos países mais afetados pela pandemia. Os outros € 250 bilhões (R$ 1,5 trilhão), cerca de 33%, seriam emitidos em forma de empréstimos.

Os “quatro frugais” se recusavam a apoiar subsídios, enquanto a França e a Alemanha defendiam doações de ao menos € 400 bilhões (R$ 2,43 trilhão). No fim, os dois lados concordaram em oferecer € 390 bilhões (R$ 2,37 trilhões) como subsídios e  € 360 bilhões (R$ 2,19 trilhões) como empréstimos.

A chave da caixa

Uma vez que a distribuição dos subsídios foi acordada, a Holanda demandava uma espécie de direito de veto para obrigar os países-membros — em especial a Espanha e a Itália — a se comprometerem com reformas estruturais. O bloco concordou com um freio de emergência que pode barrar desembolsos do fundo, mas sua aplicação prática ainda não está clara.

Os planos nacionais de investimento e reformas serão avaliados pela Comissão Europeia e precisarão ser aprovados por maioria qualificada do Conselho Europeu. Se as iniciativas forem aprovadas nestas duas instâncias, os fundos serão liberados. Para que o dinheiro continue a ser desembolsado, o Comitê Econômico e Financeiro da UE avaliará o cumprimento dos programas nacionais. O objetivo do mecanismo é buscar um consenso, mas se algum país acreditar “excepcionalmente” que há “desvios”, poderá solicitar que a situação seja levada ao Conselho Europeu.

Condições

O documento prevê que os planos nacionais serão avaliados pela Comissão Europeia e devem ser consistentes com as recomendações específicas formuladas pelo Executivo do bloco. As reformas vão desde o âmbito trabalhista, da educação e da renda mínima até o crescimento potencial, a criação de empregos e políticas ambientais.

Descontos

Cinco países — Alemanha, Holanda, Suécia, Áustria e Dinamarca — manterão descontos em sua contribuição para o orçamento da UE, algo que Bruxelas buscava eliminar em sua proposta inicial. Michel ofereceu a esses cinco países € 6,5 bilhões por ano, que serão custeados com contribuições dos demais parceiros. No final, ele aumentou os benefícios dos “quatro frugais”: juntos, seus descontos anuais somarão € 7,6 bilhões.

Divisão do dinheiro

Os fundos serão divididos em dois lotes. Segundo os critérios da Comissão Europeia, 70% serão desembolsados em 2021 e 2022. Os 30% restantes serão pagos em 2023, de acordo com a queda do Produto Interno Bruto dos países em 2020 e as perdas acumuladas nos anos seguintes. Com isso, os países do Leste esperam reduzir o peso do desemprego nas suas contas. Por regra, nenhum país tomará empréstimos maiores do que 6,8% de sua renda nacional bruta.

Novos recursos

Para pagar a dívida, os países-membros concordam em buscar novas fontes de arrecadação. Especificamente, o acordo prevê um imposto sobre plásticos não recicláveis que entraria em vigor em 1º de janeiro de 2021. Também há referência a um mecanismo de ajuste da emissão carbono nas fronteiras, previsto para o primeiro semestre do ano que vem, e um imposto digital, a ser introduzido até 1º de janeiro de 2023.

O Conselho também convida a Comissão a fazer uma proposta revisada focando no comércio de carbono, que poderá ser estendido à aviação e ao setor marítimo. Fala-se ainda em um possível imposto sobre transações financeiras.

Estado de direito

O assunto foi abrandado na versão final do documento. Na proposta inicial, havia um termo condicionante para tratar das “deficiências manifestas” na governança dos países em relação ao Estado de direito. Isto não agradou o líder húngaro, o ultraconservador Viktor Orbán. O documento final diz: "O Conselho Europeu destaca a importância do respeito pelo Estado de direito". O texto acrescenta que a Comissão poderá ainda propor medidas em relação à questão que possam ser aprovadas no Conselho por maioria qualificada.

As vítimas da negociação

A negociação extinguiu alguns fundos e projetos da Comissão Europeia. O fundo para resgatar empresas (€ 26 bilhões que deveriam mobilizar até € 300 bilhões) e o programa de saúde (€ 7,7 bilhões) desaparecem. O Fundo de Transição Justa, cujo objetivo era revitalizar antigas zonas de mineração, passará de € 30 bilhões para € 10 bilhões, e o Horizon Europe, programa de pesquisa e inovação científica, verá sua verba cair de € 13,5 bilhões para € 5 bilhões.