Exclusivo para Assinantes
Mundo Coronavírus

De 12 líderes globais, oito tiveram aumento de popularidade durante a pandemia de coronavírus

Ações para enfrentar o quadro impulsionaram os números de dirigentes como Boris Johnson, Giuseppe Conte, Angela Merkel e Alberto Fernández; índices de Jair Bolsonaro e Donald Trump ficaram estagnados
Chanceler alemã Angela Merkel durante uma entrevista coletiva no dia 6 de maio Foto: POOL New / REUTERS
Chanceler alemã Angela Merkel durante uma entrevista coletiva no dia 6 de maio Foto: POOL New / REUTERS

RIO — O enfrentamento da pandemia do novo coronavírus repercutiu na avaliação de alguns dos principais líderes mundiais. Entre 12 chefes de Estado e de governo cujos índices de popularidades entre janeiro e maio foram analisados pelo GLOBO, oito tiveram crescimento em sua aprovação popular.

Decifrando respostas : Como a ciência política explica as reações de Brasil, Argentina e México ao novo coronavírus

Para seis deles, a alta passou dos 10 pontos percentuais, caso da chanceler alemã Angela Merkel (14 pontos), dos primeiros-ministros britânico, Boris Johnson (24), italiano, Giuseppe Conte (20), e canadense, Justin Trudeau (15), além dos presidentes argentino Alberto Fernández (17) e chileno Sebastián Piñera (14). O primeiro-ministro indiano Narendra Modi e o presidente francês Emmanuel Macron tiveram aumentos menores, respectivamente de seis e cinco pontos percentuais.

Dois dos líderes — o premier japonês Shinzo Abe e o presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador — tiveram queda de popularidade. E dois — o americano Donald Trump e Jair Bolsonaro — ficaram estagnados, embora o instituto Datafolha tenha registrado queda da aprovação do brasileiro quando a pergunta é específica sobre sua atuação na crise do coronavírus.

Ameaças à frente: 'Nossa incapacidade de agir rápido contra a pandemia nos meteu em uma situação terrível', afirma Adam Tooze

Por causa das diferentes metodologias das pesquisas, o levantamento não permite uma comparação exata da popularidade dos líderes, mas mostra como os cidadãos de seus países os avaliam neste ano marcado pela pandemia. O aumento da aprovação da maioria deles reproduz um fenômeno já visto em períodos de guerra e grandes crises, o de “união em torno da bandeira”, afirma Carlos Gustavo Poggio , professor de Relações Internacionais da Faap.

— Nos EUA, vimos isso acontecer no governo de John Kennedy, durante a crise dos mísseis cubanos, no de George Bush pai, na Guerra do Golfo, e no de Bush filho, depois do 11 de setembro (de 2001) — lembra Poggio. — Pandemias, como guerras, são eventos que causam traumas na sociedade. Há muita insegurança e a população tende a buscar respostas nos seus líderes. As variações de popularidade dependem de se a população considera a resposta adequada ou não.

Boris Johnson foi quem teve o aumento mais expressivo, indo de 42% a 66% de aprovação entre janeiro e abril, segundo a YouGov. Os números refletem a mudança da posição dele em relação à Covid-19: depois de relutar em impor a quarentena, o britânico reviu sua posição e ainda angariou solidariedade ao ser contaminado e internado em uma UTI .

Recompensados

Líderes que enfrentavam protestos sociais antes da pandemia recuperaram parcialmente a popularidade, como Macron e Piñera. O chileno, que tinha 11% de aprovação em janeiro, subiu para 25% no fim de abril, segundo o instituto Cadem . Já a aprovação do francês passou de 35% para 46%, caindo para 40% em maio, segundo sondagem Ifop-Fiducial.

— Eles acabaram recompensados por uma certa percepção de seriedade ao lidar com a crise — pondera Poggio.

O recuo de Macron em maio segue tendência também vista nos períodos anteriores de crises: à medida que a situação se atenua, as reivindicações anteriores voltam.

— Com o tempo, a população começa a julgar o líder não só por um assunto único, mas por outras questões. A união em torno da bandeira não é um efeito duradouro — explica o professor.

Negacionistas

Dos líderes analisados, Bolsonaro é o único a adotar um discurso negacionista diante da pandemia, enquanto Trump mantém uma conduta errática, ora falando dos riscos à saúde, ora insistindo na volta das atividades econômicas.

A posição do brasileiro se refletiu na queda da avaliação do seu desempenho na pandemia, de acordo com o Datafolha. Em março, 35% o consideravam ótimo ou bom, índice que caiu para 27% no fim de abril, com as respostas ruim ou péssimo passando de 33% para 45%. Apesar disso, a avaliação geral do governo Bolsonaro se manteve, com o percentual de ótimo e bom passando de 30% em dezembro para 33% no fim abril, enquanto os que classificam o governo como ruim ou péssimo passaram de 36% para 38%.

Coronavírus: Agenda de Bolsonaro prioriza ministros militares durante crise

O mexicano López Obrador também menosprezou o impacto da pandemia. Sua aprovação muita alta em janeiro, de 71%, segundo pesquisa do El Financiero, caiu para 60% no início de março. Depois que ele orientou a população a ficar em casa, o índice voltou a subir, para 68%. Já o japonês Abe, criticado pela demora em recomendar medidas de isolamento social mais rígidas, viu sua aprovação passar de 34% no início do ano, segundo pesquisa Morning Consult, para 30% em março e 31% neste mês de maio.

Base fiel

Trump, por sua vez, hoje lidera o país com mais casos (1,3 milhão) e mortes (quase 78 mil) provocadas pelo novo coronavírus. Ele manteve o apoio de sua base fiel, mas, no ano em que disputa a reeleição, sua aprovação não avançou. De acordo com pesquisa da Universidade de Monmouth, o americano tem em maio os mesmos 43% que tinha em janeiro.

— O caso do Trump é específico. Nos quatro anos de mandato, sua aprovação não cai abaixo dos 40%, mas não sobe acima de 49%. É o primeiro presidente americano da história a não ultrapassar a barreira dos 50% — pontua Poggio.

De acordo com o professor, o fenômeno é característico de países com alta polarização política. No entanto, o fato de Trump não ter conseguido aumentar sua popularidade pode ter impacto na eleição de novembro.

— Se ele chegar a novembro com 42% de aprovação, vai ser muito diferente de se chegar com 48% — diz Poggio.

Na média das pesquisas recentes do site Real Clear Politics, o democrata Joe Biden lidera as intenções de votos por margem pequena, de 46% a 42%. Biden, porém, tem pouca visibilidade por causa da pandemia e enfrenta há duas semanas uma acusação de agressão sexual feita por uma ex-assessora, que ele nega.