Depois de confirmar a saída da campanha pela reeleição, o presidente dos EUA, Joe Biden, fará um discurso à nação nesta quarta-feira para, segundo a Casa Branca, “falar sobre o que está por vir” e sobre como ele “terminará o trabalho para o povo americano”. Apesar do pronunciamento já ser ventilado desde domingo, a escolha da data chamou a atenção: no mesmo dia, o premier de Israel, Benjamin Netanyahu, dará um discurso no Congresso, já cercado de polêmica
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Apesar dos motivos de Biden serem razoavelmente conhecidos, especialmente depois das semanas de pressão para que desistisse da reeleição, o discurso da quarta-feira é considerado histórico por analistas políticos americanos: o democrata é o primeiro presidente eleito desde Lyndon Johnson, em 1968, a não concorrer a mais um mandato.
Ao contrário de Johnson, que anunciou a decisão em um pronunciamento na TV, Biden comunicou os americanos em uma mensagem no X, na tarde de domingo, seguida por uma outra publicação endossando Kamala Harris à Presidência. Ele garante que cumprirá o mandato até o final, rejeitando, até o momento, questionamentos vindos do Partido Republicano (e até do Partido Democrata), para renunciar imediatamente.
“Todos que pedem a Joe Biden que ‘saia da corrida’ sem também pedir que ele renuncie à Presidência estão envolvidos em um nível absurdo de cinismo. Se você não pode concorrer, você não pode servir. Ele deveria renunciar agora”, escreveu no X, no sábado, o candidato a vice na chapa de Donald Trump, J.D. Vance.
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Logo depois do anúncio da Casa Branca, foi impossível não notar que o pronunciamento foi marcado no mesmo dia, com uma diferença de poucas horas, em que um velho conhecido e hoje desafeto de Biden falará ao Congresso: o premier israelense Benjamin Netanyahu, que discursará no local pela quarta vez.
Com a guerra em Gaza se aproximando de seu décimo mês, sem qualquer perspectiva de um cessar-fogo duradouro, com chances cada vez menores de resgatar as dezenas de reféns ainda em poder do Hamas e diante de problemas políticos cada vez maiores, Netanyahu se volta a um velho aliado em busca de um apoio que ele sabe que (provavelmente) terá.
Na carta em que convidou o premier para discursar, o presidente da Câmara, o republicano Mike Johnson, disse que ele teria no plenário um espaço para compartilhar “a visão do governo para defender a democracia, combater o terrorismo e estabelecer uma paz justa e duradoura na região”.
Posições em xeque
Entre os republicanos, a presença deve ser majoritária na Casa, mas entre os democratas a questão é um pouco mais complicada. Apesar de Israel ser um tema quase sempre consensual no Congresso, a guerra em Gaza fez com que muitos questionassem seu apoio às políticas de Netanyahu. Mesmo o governo Biden, que tem sofrido críticas pelo apoio militar aos israelenses, tem bloqueado o envio de algumas armas e incluiu lideranças de assentamentos na Cisjordânia, envolvidos com ataques a palestinos, em listas de sanções.
— Não vou ouvir o sr. Netanyahu — disse na sexta-feira o senador Bernie Sanders ao programa “Morning Joe” da MSNBC. — Acho que ele é um criminoso de guerra. Acho que ele nunca deveria ter sido convidado. E acho que é um problema real para a administração Biden, mas acima e além disso, Trump será pior — mesmo nessa questão.
No último discurso do premier no Congresso, em 2015, 60 parlamentares democratas boicotaram a fala. Agora, o número deve ser ainda maior, segundo analistas políticos. Mas alguns pesos pesados do partido devem estar no plenário: Chuck Schumer, líder da maioria no Senado, que chegou a pedir eleições gerais em Israel em março, disse ser necessário fortalecer a aliança bilateral.
— A visita e o discurso do primeiro-ministro dão ao Congresso a oportunidade de mostrar quão sério e bipartidário é o apoio ao nosso parceiro Israel e de demonstrar a nossa determinação pela paz e estabilidade no Oriente Médio — disse o deputado Greg Landsman ao site Inside Congress. — Se as pessoas quiserem assistir de casa, tudo bem.
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Uma ausência confirmada é a da vice-presidente e agora virtual candidata democrata à Presidência, Kamala Harris. Ela deveria presidir a sessão, mas estará em um comício em Indianápolis no mesmo horário. A função caberá ao senador Ben Cardin, presidente da Comissão de Relações Exteriores, depois que a presidente pro tempore do Senado, Patty Murray, também disse que não comparecerá.
Alheio às críticas e divisões internas entre os democratas, Netanyahu chegou aos EUA na segunda-feira, em meio a um forte esquema de segurança na capital americana, onde há expectativa de grandes protestos contra ele.
Na quinta-feira, está prevista uma reunião com o presidente Biden na Casa Branca, que ficou em suspenso até o último minuto por causa do diagnóstico de Covid do democrata, na semana passada, e que não teve a pauta divulgada. Um dia depois, ele se encontrará com Donald Trump, em sua residência de Mar-a-Lago, na Florida, um anúncio feito pelo próprio ex-presidente em sua rede social, o Truth Social, já citando a rival nas urnas em novembro, Kamala Harris.
“Durante o meu primeiro mandato, tivemos paz e estabilidade na região, assinando até os históricos Acordos de Abraão”, disse Trump nesta terça-feira. “Tal como disse nas discussões com o presidente [da Ucrânia, Volodymyr] Zelensky e outros líderes mundiais nas últimas semanas, a minha agenda de PAZ ATRAVÉS DA FORÇA demonstrará ao mundo que estas guerras terríveis e mortais e conflitos violentos devem acabar. Milhões estão morrendo e Kamala Harris não é de forma alguma capaz de impedir isso.”