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Entenda em 4 pontos a nova lei antiaborto do Texas e como ela pode afetar outros estados

Legislação é a mais restritiva no país em cinco décadas, desde o caso Roe versus Wade
Manifestantes contra a lei antiaborto do Texas do lado de fora o Capitólio do Texas Foto: MONTINIQUE MONROE / NYT
Manifestantes contra a lei antiaborto do Texas do lado de fora o Capitólio do Texas Foto: MONTINIQUE MONROE / NYT

Uma nova lei antiaborto do Texas, que teve seu bloqueio recusado pela Suprema Corte dos EUA na noite de quarta-feira, basicamente proíbe o aborto no estado, apesar de uma decisão do tribunal, em 1973, que estabeleceu o procedimento como um direito constitucional, em um julgamento conhecido como o caso Roe versus Wade.

A nova medida, a mais restritiva em cinco décadas em questões de aborto, pode pavimentar o caminho para outros estados adotarem leis semelhantes, já que a forma com que ela foi formulada levanta questões sobre se a legislação pode ser contestada ou não.

Entenda abaixo em quatro pontos o que foi a decisão de 1973, como a nova lei afeta o direito das mulheres no Texas e como ela pode levar a novas mudanças em todo o país.

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O que é a decisão do caso Roe versus Wade?

Roe versus Wade é o nome do caso que levou ao veredicto da Suprema Corte que, em 1973, estabeleceu o direito constitucional ao aborto nos EUA até o período entre a 22ª e a 24ª semanas de gestação, a partir do qual o feto tem mais chances de sobreviver fora do útero. A medida obrigou a a modificação de todas as leis federais e estaduais que proscreviam ou restringiam o aborto e que eram contrárias à decisão.

Historicamente, o veredicto sempre foi contestado por setores ligados ao Partido Republicano, mas a pressão aumentou com a composição atual da Suprema Corte, que tem seis juízes conservadores e três progressistas, graças às três indicações feitas pelo ex-presidente Donald Trump.

O que diz a lei do Texas?

A lei texana proíbe a realização de abortos após seis semanas de gestação, 18 semanas antes do que determina o veredicto de 1973. Na prática, é uma proibição quase total ao aborto, já que muitas mulheres até esse momento não sabem que estão grávidas. Não há exceções para gestações causadas por incesto ou estupro — a única brecha é quando a saúde da gestante está em risco, mas ainda assim é exigida uma prova escrita de um médico atestando o problema. Segundo a União das Liberdades Civis Americanas (Aclu, na sigla em inglês), entre 85% e 90% das pessoas que realizam abortos no Texas têm pelo menos seis semanas de gestação.

Sancionada pelo governador republicano Greg Abbott, a legislação foi redigida visando barrar possíveis contestações judiciais em cortes federais ao permitir que cidadãos comuns apresentem processos em cortes estaduais contra indivíduos que realizem, “ajudem ou viabilizem” a interrupção da gravidez, com exceção da paciente. Outras leis de aborto são executadas por funcionários estaduais e locais, com possibilidade de sanções criminais. Agora, qualquer cidadão pode processar as pessoas envolvidas no procedimento, com exceção da paciente.

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Há outros casos semelhantes?

Outros estados aprovaram leis semelhantes, mas elas enfrentam recursos na Justiça e, por isso, ainda não entraram em vigor. A do Texas é a primeira a ser implementada, o que a transforma no estado mais restritivo dos EUA em questões de acesso a serviços de aborto.

De maneira mais ampla, segundo o Instituto Guttmacher, uma organização que defende os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, 90 restrições estaduais ao aborto foram implementadas entre janeiro e junho deste ano, mas a maioria delas enfrenta recursos judiciais.

Quais são as implicações da lei do Texas?

Além de na prática funcionar como uma proibição total ao aborto, podem ser processados médicos, funcionários de clínicas, conselheiros e até mesmo motoristas que levarem a paciente para o procedimento — a paciente não pode ser processada. Qualquer americano, independentemente de ter ou não relação com caso, poderá dar início à ação legal e, se vencer, terá o direito de receber até US$ 10 mil e ter seus gastos com a ação reembolsados pela pessoa processada.

Ainda há possíveis implicações no futuro além das fronteiras do Texas. Por causa da forma como a lei foi redigida, outros estados que tentam implementar medidas semelhantes podem utilizá-la para terem sucesso em seus requerimentos.

Até julho, segundo o Instituto Guttmacher, oito estados haviam aprovado vetos efetivos ao aborto, que aguardam as definições judiciais em várias instâncias para entrarem em vigor. Algumas das medidas mais duras são do Arkansas e de Oklahoma. Elas vetam a interrupção durante qualquer ponto da gestação, abrindo exceções apenas quando a vida da paciente está em risco.

Com a nova lei, muitos já acreditam que a Suprema Corte, com sua nova formação, fará alterações substanciais na legislação de 1973, segundo disse ao Washington Post Mary Ziegler, professora de direito da Universidade do Estado da Flórida e autora de "Aborto e o direito na América: Roe versus Made até o presente".

— As questões restantes são como e quando.