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Entenda em quatro pontos o que poderá acontecer na Bolívia após a renúncia de Morales

Há questionamentos sobre quem governará o país e sobre o futuro do presidente demissionário
Presidente Evo Morales, o primeiro indígena a liderar a Bolívia, durante ritual indígena no templo de Tiwanaku, a 71 km de La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP
Presidente Evo Morales, o primeiro indígena a liderar a Bolívia, durante ritual indígena no templo de Tiwanaku, a 71 km de La Paz Foto: AIZAR RALDES / AFP

LA PAZ —  Após quase 14 anos no poder, Evo Morales anunciou, no domingo, sua renúncia à Presidência da Bolívia . Pressionado por protestos de alas radicais da oposição, motins policiais e pela perda do apoio das Forças Armadas , o líder demissionário disse ter sido vítima de um “golpe cívico-policial” orquestrado por seus opositores, que tomavam as ruas do país há três semanas. A saída de Morales foi seguida por seu vice-presidente e pelos líderes da Câmara e do Senado, ambos do seu partido, o MAS (Movimento ao Socialismo), abrindo uma vacância de poder no país.

A renúncia ocorreu horas após a Organização dos Estados Americanos (OEA) divulgar o resultado preliminar de uma auditoria no pleito presidencial do dia 20 de outubro — o que levou Morales a cumprir com sua promessa de convocar novas eleições caso a organização constatasse indícios de irregularidade. Isto, no entanto, não foi suficiente para conter os opositores.

Análise : Com a renúncia de Morales sob pressão militar, Bolívia volta a ciclo de instabilidade

O resultado da eleição de outubro é central na crise política boliviana, pois motivou uma série de denúncias de fraude e protestos. Morales, que foi declarado vencedor em primeiro turno pelo Tribunal Supremo Eleitoral do país, concorria a um quarto mandato que havia sido rejeitado em referendo em 2016.

Após a renúncia do líder que estava há mais tempo no poder na América Latina, a Bolívia ingressa em um momento de incerteza e possíveis disputas de poder. Entenda em quatro pontos o que poderá acontecer daqui para frente:

Quem é o presidente em exercício do país?

Até a manhã desta terça-feira, não se sabe ao certo.

Pela Carta Magna boliviana, em caso de renúncia, a Presidência será ocupada pelo vice-presidente. Caso o vice também se encontre impossibilitado de assumir, a ordem sucessória estabelece que o cargo seja ocupado pelo presidente do Senado e, em sua falta, pelo presidente da Câmara dos Deputados. Segundo a lei do país, “neste último caso, se convocariam novas eleições no prazo máximo de 90 dias”.

A questão, no entanto, é que o vice de Morales, Álvaro García Linera, e os presidentes de ambas as Casas, Adriana Salvatierra (Senado) e Rolando Borda (Câmara), também anunciaram suas renúncias no domingo, deixando vaga a Presidência.

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A Constituição do país não engloba um cenário em que todas as lideranças não estejam aptas a assumir o poder, abrindo margem para especulações. Na teoria, caberia aos vice-presidentes do Senado e da Câmara, respectivamente, comandar interinamente o país. Se eles não puderem assumir, assume o senador ou deputado decano, dependendo de quem for o mais antigo.

Para que isso ocorra, no entanto, o Congresso do país precisa aprovar a carta de renúncia de Evo Morales e consolidar sua saída — algo que até o momento não aconteceu. A Assembleia Legislativa se reunirá na tarde desta terça-feira para discutir o assunto, mas não está claro se haverá quórum para votar as medidas, visto que o Movimento ao Socialismo (MAS), sigla de Morales, tem maioria em ambas as Casas.

Alguém reivindicou o poder?

A segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Áñez, anunciou na noite de ontem que, em meio às vacâncias, cabe a ela assumir a Presidência. A parlamentar, que pertence à Unidade Democrática, partido de oposição a Morales, convocou a reunião extraordinária que acontecerá na tarde desta terça-feira.

— Eu sou a segunda vice-presidente e, como estabelece nossa Constituição, caberia a mim assumir este cargo com o objetivo único de convocar novas eleições, pacificar o país e retornar à normalidade — disse a senadora a um canal de televisão.

Áñez se baseia no Artigo 41 do Regimento do Senado, que lista como tarefa do segundo vice-presidente “substituir o (a) presidente ou o (a) vice-presidente [do Senado] quando ambos estiverem ausentes por qualquer impedimento”. Constitucionalmente, no entanto, não está claro se sua posição na linha sucessória do Senado a legitimaria para assumir a Presidência do país.

Onde está Evo Morales?

Morales e García Linera estão a caminho do México, onde receberão asilo político.

Na tarde de segunda-feira, o chanceler mexicano Marcelo Ebrard, anunciou que Morales pediu asilo e que seu país o concedeu. O México já abriga 20 membros de seu governo na embaixada em La Paz.

Logo após o anúncio, foi confirmado que o presidente Andrés Manuel López Obrador havia enviado um avião da Força Aérea mexicana que se encontrava no Peru para buscar Morales e seu vice na Bolívia. A aeronave decolou do solo boliviano por volta das 23h de segunda-feira e realizou uma escala de cerca de 4h em Assunção.

A previsão é que Evo Morales chegue ao México entre 13h e 14h desta terça-feira.

Evo Morales será preso?

Na noite de domingo, Morales postou em seu Twitter que a polícia tem uma “ordem de apreensão ilegal” contra ele. Luis Fernando Camacho , empresário sem cargo eletivo que na última semana tomou a frente dos protestos, também disse em suas redes sociais que tais ordens haviam sido expedidas.

O chefe de polícia da Bolívia, Yuri Calderón, que horas antes havia pedido a renúncia de Morales, no entanto, disse que tal ordem não existe.