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Entenda os próximos passos do Brexit após aval do Parlamento

Discussões para que Parlamento britânico aprove o acordo de saída da UE deverão começar já na semana que vem
Primeiro-ministro Boris Johnson é recebido por seus aliados na sede do governo, na rua Downing Foto: STEFAN ROUSSEAU / AFP
Primeiro-ministro Boris Johnson é recebido por seus aliados na sede do governo, na rua Downing Foto: STEFAN ROUSSEAU / AFP

LONDRES — O premier britânico, Boris Johnson , liderou a acachapante vitória do Partido Conservador com um slogan bastante claro: “fazer o Brexit acontecer”. Apesar de ele  ter 80 parlamentares a mais do que a soma dos deputados dos demais partidos, vantagem que lhe deu carta branca para aprovar o divórcio britânico, o processo promete não ser tão fácil quanto parece.

Com margem mais ampla na Câmara dos Comuns, o primeiro-ministro conseguiu aprovar com folga o acordo de saída — apenas oito dias após os britânicos irem às urnas. Agora, parece improvável que o Brexit não ocorra no dia 31 de janeiro, fim do prazo atual para a saída da União Europeia (UE). Com a aprovação do divórcio, o Reino Unido entrará em um período de transição de um ano no qual deverá negociar uma série de acordos e legislações internas em assuntos que, anteriormente, seguiam as leis europeias.

Entenda o que acontecerá a seguir:

O que falta aprovar antes do Brexit?

Logo após a votação de hoje, o Parlamento entrou em recesso de final de ano. Os próximos debates deverão começar em 7 de janeiro. O acordo de saída será examinado pelas comissões da Câmara dos Comuns, que analisarão cada cláusula e proporão possíveis emendas. Quando esta etapa estiver completa, o acordo retornará para o plenário, onde será novamente debatido e ficará sujeito a alterações.

Sendo aprovado, o acordo será encaminhado para a Câmara dos Lordes, que também deverá aprová-lo. Ao fim desta tramitação, ele será enviado para a rainha, que deverá ratificá-lo, transformando-o em lei.

Na prática, o Reino Unido terá até o dia 29 de janeiro para transformar, oficialmente, o acordo em legislação. Salvo mudanças improváveis, o país sairá da União Europeia no dia 31 de janeiro, data atual para o Brexit após três adiamentos. Haverá então um período de transição até o fim de 2020 — tempo que Johnson diz ser suficiente para negociar um novo acordo comercial com a UE.

O divórcio, então, já começa a valer?

Ainda não. O Parlamento Europeu também precisará ratificar o acordo de saída. Haverá duas sessões plenárias para o assunto: uma em Estrasburgo, na França, no dia 13 de janeiro, e outra nos dias 29 e 30 de janeiro, em Bruxelas. É esperado que a UE não apresente obstáculos ao plano.

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E os acordos comerciais pós-Brexit?

As conversas formais, na prática, poderiam começar já no dia 1 o de janeiro, mas o acordo de divórcio estabelece que nada seja negociado sobre a relação futura entre o Reino Unido e a UE até que “uma declaração de objetivos de negociação seja aprovada pela Câmara dos Comuns”.

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Qual é a perspectiva dessas negociações?

A expectativa da União Europeia é que as conversas sobre um acordo comercial comecem em março, deixando apenas 10 meses para que um acordo seja aprovado por Londres, Bruxelas e por todos os países-membros da UE. Como precisam ser ratificados por tantas partes e envolvem questões delicadas, acordos comerciais com a UE costumam levar anos para serem finalizados.

No acordo de transição aprovado nesta sexta, foi aprovada uma cláusula que descarta a prorrogação do período de transição. Segundo Boris, o prazo inflexível “fortalece a posição de negociação” com um acordo comercial pós-Brexit com a UE. Caso o prazo até dezembro de 2020 não seja suficiente, há o risco de um vazio que traga prejuízos comerciais para os dois lados, mas sobretudo para o Reino Unido, que envia quase metade de suas exportações para os países da UE.

Quais são os principais impasses para o acordo comercial?

A UE insiste em que não vai firmar um acordo comercial amplo sem salvaguardas antiprotecionistas. Suas demandas focarão em questões ambientais e trabalhistas, além de regras para garantir que os britânicos não oferecerão seus produtos para o mercado comum europeu com preços abaixo do mercado.

Isto poderá ser difícil, pois o Reino Unido deverá sofrer pressão dos EUA, com quem busca firmar um acordo de livre comércio. Os americanos fazem pressão para que os britânicos regulamentem mais brandamente os alimentos e a agricultura — algo a que a UE se opõe para proteger seus produtores.

A pescaria é um outro assunto espinhoso, porque o pescadores europeus não poderão mais atuar em águas territoriais britânicas, como fazem atualmente. Ambos os lados deverão negociar um sistema de cotas, que estabelece limites de pescados para os integrantes do bloco, mas este poderá ser um processo longo.

Uma negociação que poderá ser longa diz respeito à segurança, com temas como o compartilhamento de dados em casos criminais. Com as cadeias de suprimento industriais cruzando as fronteiras diversas vezes, determinar sua origem para razões fiscais e alfandegárias também poderá ser um problema à parte.