A irmã do ex-chefe da máfia siciliana Matteo Messina Denaro, que morreu em setembro de 2023 depois de ser preso após três décadas de fuga, foi condenada nesta quinta-feira (11) a 14 anos de prisão por associação mafiosa, segundo a mídia italiana.
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Rosalia Messina Denaro, de 69 anos, casada com o chefe preso Filippo Guttadauro, inadvertidamente colocou a polícia no encalço de seu irmão graças a uma mensagem escrita sobre seu estado de saúde escondida em uma barra oca de uma cadeira em seu domicílio.
Presa há um ano após a detenção do irmão, um dos chefes mais sanguinários da Cosa Nostra, ela era o único membro da família Messina Denaro a quem o irmão revelou estar gravemente doente com câncer.
Segundo os investigadores, Rosalia não era apenas sua confidente, mas também seu “alter ego”. Seu papel operacional dentro do clã foi muito importante, principalmente nos últimos anos da fuga de seu irmão, que levou seus segredos para o túmulo quando morreu aos 61 anos no hospital penitenciário de L'Aquila.
Rosalia Messina Denaro, esta "madrinha" é descrita pela promotoria de Palermo como uma mulher de tradições "totalmente imersas em uma cultura mafiosa ortodoxa e granítica".
Foi por causa dela, e apesar dela, que o homem mais procurado da Itália — Matteo Messina Denaro —acabou preso.
Pessoa de confiança
Rosalia, apelidada de "Rosetta", era a encarregada de transmitir os "pizzini", os pequenos textos manuscritos que passam de mão em mão e no qual estão detalhadas as ordens aos sócios ou mensagens pessoais.
"Somos perseguidos como canalhas, tratados como se não pertencêssemos à raça humana. Somos uma etnia que buscam erradicar", escreveu Matteo Messina Denaro em um dos papéis encontrados na casa de Rosalia pelos investigadores, segundo a ordem de captura da promotoria de Palermo, à qual a AFP teve acesso.
Em dezembro de 2022, agentes da polícia entraram secretamente na casa da sexagenária em Castelvetrano, reduto da família, para instalar microfones e câmeras escondidos. Ao descobrir a perna oca de uma cadeira, encontraram dentro de um daqueles "pizzini" uma espécie de diário médico detalhando os cuidados prestados a um homem com câncer. O nome do paciente usado no bilhete, porém, era falso.
Fotos de Matteo Messina Denaro, mafioso mais procurado da Itália que foi preso após 30 anos fugitivo
Convencidos de que o paciente era o homem foragido, os policiais seguiram as pistas e o prenderam pouco mais de um mês depois. Rosalia, que passou 30 anos de sua existência escondendo o irmão, acabou traindo-o sem querer.
"Durante décadas ela foi seu ponto de referência econômico e sua pessoa de absoluta confiança", disse a promotoria de Palermo. Ao gerir os assuntos do dia a dia, Rosalia "possibilitou à Cosa Nostra manter um chefe forte (...), o último assassino ainda livre, cuja fuga continuou a alimentar a lenda".
Dinastia do crime
Rosalia, mas também suas irmãs mais novas Anna Patrizia, Giovanna e Bice, são filhas, irmãs e esposas de mafiosos. Seu filho está preso e a filha, advogada, é responsável pela defesa do tio. Foi assim que os Messina Denaro construíram uma dinastia do crime, na qual Rosalia era o braço operacional.
Ele assumiu o comando quando Anna Patrizia foi presa, condenada a 14 anos de prisão em 2018. Na época, Rosalia era encarregada de cobrar o dinheiro das extorsões e defender os interesses de seu irmão dentro da Cosa Nostra.
Embora o pertencimento a uma máfia seja sacramentado pelo rito do juramento, reservado aos homens, isso não impede que algumas mulheres desempenhem um papel fundamental na organização, aponta à AFP Federico Varese, sociólogo de Oxford. Algumas chegam "quase ao nível de padrinho".
E mesmo que suas mãos não estejam diretamente manchadas de sangue (salvo em alguns casos excepcionais), as mulheres da Cosa Nostra não são consideradas pelas autoridades como simples substitutas.
— Até a década de 1990, a ideia era que as mulheres não deveriam ser condenadas. Foram os magistrados e, paradoxalmente, as feministas, que disseram que isso era uma abordagem machista — aponta Federico Varese.