Mundo Europa

Erdogan diz a delegações da Suécia e Finlândia que não precisam se incomodar em ir à Turquia: 'Não diremos sim à entrada na Otan'

Comentários vieram pouco depois do governo sueco confirmar sua candidatura à aliança, que precisa ser aprovada por unanimidade
Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan Foto: YVES HERMAN / REUTERS
Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan Foto: YVES HERMAN / REUTERS

ISTAMBUL E ESTOCOLMO — Horas depois de a Suécia confirmar sua intenção de entrar para a Otan , a Turquia, uma das longevas integrantes da aliança militar, reiterou sua posição de vetar a adesão dos suecos e da Finlândia, que também quer fazer parte da organização. Caso não seja revertida em negociações — como assessores do presidente vêm sugerindo que pode ocorrer —  a postura turca vai inviabilizar essa nova expansão da Otan, relacionada diretamente à invasão da Ucrânia pela Rússia.

Em entrevista a jornalistas nesta segunda-feira, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou que, em primeiro lugar, não tem como dar sinal verde a um país que aplica sanções contra Ancara — desde 2019, o governo sueco impôs um embargo sobre a venda de armas para a Turquia, em resposta a uma ofensiva do país no Noroeste da Síria, ocorrida naquele ano.

— Nós não diremos sim a um país que impõe sanções à Turquia para que se junte à Otan — disse o presidente, em Ancara.

Entenda : O caminho de Finlândia e Suécia para a adesão à Otan

Erdogan voltou a acusar, como havia feito nos últimos dias , a Suécia e a Finlândia de servirem de porto seguro para organizações consideradas terroristas. Segundo o Ministério da Justiça, os dois países recusaram, nos últimos cinco anos, 33 pedidos de extradição de pessoas acusadas de ligação com o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e com o Movimento Gulenista (Fetö), ambos apontados por Ancara como grupos terroristas.

Para que um país seja aceito na Otan, é necessário o aval de todos os atuais membros.

— Nenhum desses países tem uma atitude clara e aberta sobre organizações terroristas. Como nós podemos confiar neles? — questionou Erdogan, durante entrevista. — Eles têm convites especiais para terroristas. Eles até têm parlamentares pró-PKK em seus Parlamentos.

O presidente turco também rejeitou uma proposta feita pelo governo sueco de enviar representantes para Ancara, em uma tentativa de fazer com que ele mude de ideia.

— Eles [diplomatas suecos] virão à Turquia na segunda-feira. Eles virão nos convencer? Me perdoem, mas eles não deveriam nem se cansar — apontou Erdogan.

Para ele, a aliança se tornaria um “lugar onde representantes de organizações terroristas estão concentrados”.

Primeira retaliação : Rússia suspende fornecimento de eletricidade para a Finlândia

No domingo, o chanceler turco, Mevlut Cavusoglu, afirmou que seu país não se opõe à política de “portas abertas” da aliança, mas exigiu que Finlândia e Suécia “parem de apoiar grupos terroristas”, que ofereçam claras garantias de segurança e levantem as proibições de exportação de alguns produtos do setor de defesa.

No sábado, o principal assessor de política externa de Erdogan, Ibrahim Kalin, também já deixara claro que a posição turca não é de oposição absoluta à entrada dos dois países e sugeriu que está sujeita a mudanças negociadas.

— Não estamos fechando a porta — disse ele. — Mas estamos basicamente levantado esse tema como uma questão de segurança nacional para a Turquia.

Alguns analistas acreditam que Erdogan está jogando para obter concessões de Finlândia e Suécia.

— A Turquia gostaria de usar seu poder de veto [na Otan] como instrumento de pressão a fim de levar aqueles dois países a fazerem o que ela quer — disse Soli Ozel, professor de Relações Internacionais da Universidade Kadir Has, em Istambul.

Diplomatas ocidentais acreditam que a oposição turca pode ser derrubada.

— Estou confiante de que seremos capazes de abordar as preocupações que a Turquia expressou de uma maneira que não atrase a adesão — disse o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, no domingo.

Nova realidade

O possível veto de Ancara à entrada de Finlândia e Suécia poria um freio a um processo que deveria ser bem mais rápido do que as adesões recentes, e é uma notícia inesperada e desagradável para duas nações que romperam com décadas de neutralidade militar após a invasão russa da Ucrânia.

— A Europa, a Suécia e o povo sueco estão vivendo agora uma nova e perigosa realidade — disse a primeira-ministra sueca, Magdalena Andersson, durante um debate sobre política de segurança no Parlamento nesta segunda-feira. — A Suécia precisa das garantias formais de segurança que vêm com a adesão à Otan.

Ameaça a Finlândia e Suécia: 'Sérias consequências político-militares' caso se juntem à Otan

Tal como a Finlândia vem apontando desde a confirmação de que se candidataria a entrar na aliança, algo oficializado neste domingo , a Suécia se opõe à instalação de bases da Otan e, especialmente, de armas nucleares em seu território.

A postura foi reiterada pela premier no debate desta segunda-feira, no qual foi apoiada pela maioria dos partidos: dos oito com representação no Rikdsagen, o Parlamento sueco, apenas duas siglas de esquerda se mostraram preocupadas com o movimento do governo.

— A decisão de se juntar a uma aliança com armas nucleares com regimes autoritários está sendo tomada sem a participação dos eleitores — disse o líder do Partido de Esquerda, Nooshi Dadgostar. — Existem outras maneiras de manter a Suécia segura.

Em comunicado, os governos dos demais países nórdicos que integram a Otan — Noruega, Islândia e Dinamarca —, enfatizaram que a segurança finlandesa e sueca são “uma questão de preocupação comum para todos”.

“Notamos que as decisões da Finlândia e da Suécia de apresentarem suas candidaturas à Otan são soberanas, de acordo com o direito que os países têm de escolher seus próprios arranjos de segurança. Finlândia e Suécia têm o direito de prosseguirem em seus processos de adesão sem tentativas de interferência externa”, diz o texto.

Postura: Putin sinaliza recuo em ameaças enquanto Finlândia e Suécia se preparam para entrar na Otan

Por sua vez, o presidente russo, Vladimir Putin, que considera a decisão dos dois países de se juntar à Otan “um erro”, afirmou nesta segunda-feira que “não tem problemas com esses Estados”, e que a expansão, por si só, “não apresenta uma ameaça direta à Rússia”.

O tom foi mais ameno do que o de uma nota publicada pela Chancelaria russa, horas antes, afirmando que Moscou “será forçada a adotar medidas de retaliação, de natureza técnico-militar e de outras formas, para impedir as ameaças à segurança nacional”:

“A entrada da Suécia na Otan vai causar danos significativos à segurança do Norte da Europa, e ao continente europeu como um todo”, diz o texto.