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Ministério Público boliviano emite mandado de prisão contra Morales

Ex-presidente, refugiado na Argentina, foi intimado por supostos crimes de sedição e terrorismo
Evo Morales chega a entrevista coletiva em Buenos Aires Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP
Evo Morales chega a entrevista coletiva em Buenos Aires Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP

LA PAZ —  O ministro do Interior da Bolívia, Arturo Murillo, anunciou nesta quarta-feira que o Ministério Público emitiu um mandado de prisão contra o ex-presidente Evo Morales , refugiado na Argentina , por supostos crimes de sedição, terrorismo e financiamento ao terrorismo. Morales foi intimado a responder e prestar depoimento pessoalmente sobre o caso na capital boliviana. O ex-presidente está na Argentina há uma semana.

Em novembro, o ministro pediu ao Ministério Público que iniciasse uma investigação sobre o ex-presidente, com base em um áudio supostamente gravado por ele durante os protestos que tomaram conta do país após sua renúncia. Na gravação, um homem, que segundo Murillo seria Morales, instrui o líder cocaleiro Faustino Yucra Yarwi a fechar os acessos às cidades e interromper o abastecimento de alimentos. “Que não entre comida nas cidades, vamos bloquear, cerco de verdade”, diz um trecho da gravação. Para o ministro, o áudio configura um “crime de lesa-humanidade”.

Em resposta, o ex-presidente disse não temer o mandado contra ele:

“Após 14 anos da nossa revolução, o 'melhor presente' que recebo do governo de fato é uma ordem de apreensão, injusta, ilegal e inconstitucional. Não me assusta, enquanto eu estiver vivo continuarei com mais força na luta política e ideológica por uma Bolivia livre e soberana”.

No sábado, a autoproclamada presidente interina, Jeanine Áñez , já havia anunciado a ordem de prisão, sem dar mais detalhes. Segundo ela, Morales “nunca respeitou nada, nem mesmo a própria Constituição”, por isso, se ele retornar à Bolívia “sabe que precisa dar respostas ao país, (já que) tem contas pendentes na Justiça”.

Nesta quarta-feira, Murillo postou uma cópia do mandado no Twitter, com a seguinte declaração: “Sr. Evo Morales, para seu conhecimento”. Murillo pertence ao mesmo partido de Áñez, o Movimento Democrata Social (MDS). Representada por Óscar Ortiz, a sigla teve apenas 4% das intenções de voto nas eleições presidenciais de dia 20 de outubro, depois anuladas. Ele também é próximo de Luis Fernando Camacho, dirigente radical do Comitê Cívico de Santa Cruz que assumiu o protagonismo do movimento que levou à renúncia de Morales.

O mandado, assinado pelos promotores de La Paz, Jhimmy Almanza e Richard Villaca, ordena que promotores, policiais ou funcionários públicos “prendam e conduzam o Sr. Juan Evo Morales Ayma aos escritórios do Ministério Público”, em La Paz. A ordem de prisão inclui Faustino Yucra, acusado de narcotráfico há tempo e foragido.

— Todos os requisitos de investigação foram cumpridos e a comissão de promotores emitiu os mandados de prisão contra o senhor Juan Evo Morales Ayma e o senhor Faustino Yucra pelos delitos investigados na denúncia apresentada pela Procuradoria de La Paz — disse o major Luis Fernando Guarachi, da Força Especial Contra o Crime (FELCC), à rede Unitel.

OEA rejeita violência racial

A autenticidade da gravação não foi confirmada, e políticos do Movimento ao Socialismo (MAS), partido de Morales, negam que o áudio seja verdadeiro. No Twitter, o ex-presidente afirmou, à época, que as autoridades deveriam investigar a morte de manifestantes em vez de ir atrás dele com base em uma “prova falsa”.

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Os incidentes deixaram 36 mortos, a maioria apoiadores de Morales, segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), que pediu a criação de um grupo independente de especialistas internacionais para investigar as mortes.

Nesta quarta-feira, a OEA rejeitou a violência racial no país e pediu que se respeite os direitos dos povos indígenas. O texto proposto pela Comunidade do Caribe (Caricom) foi aprovado por 18 votos, incluindo os de Argentina, México, Nicarágua e Uruguai. Votaram contra Bolívia, Colômbia, Estados Unidos e Venezuela — representada por um delegado do líder da oposição, Juan Guaidó.  Dos 34 membros ativos da organização, 11 se abstiveram, incluindo Brasil e Canadá

Morales está na Argentina como refugiado desde a semana passada, onde tenta finalizar os detalhes da candidatura do MAS à Presidência, após se exilar por um mês no México. “Estou convencido de que vamos vencer as próximas eleições. Não serei candidato, mas tenho o direito de fazer política”, afirmou no Twitter.

Questionado sobre quem será o candidato, o ex-presidente mencionou líderes como Adriana Salvatierra, ex-presidente do Senado, e Andrónico Rodríguez, líder cocaleiro e cientista político: “Estamos debatendo. Vamos com o melhor candidato, alguém que garanta não apenas o voto indígena, mas também o voto da classe média e da classe empresarial”.