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Por Vivian Oswald, especial para O Globo — Londres

Desde o mês passado, o Reino Unido discute os preparativos para o Natal. Está certo que a data é uma paixão nacional, mas até para padrões britânicos a ansiedade parece exagerada. As gôndolas nos supermercados traduzem o humor nacional. Produtos inspirados no Dia das Bruxas, 31 de outubro, dividem espaço com os natalinos. A antecipação do calendário reflete o desejo de que este ano apavorante marcado por caos político e econômico acabe logo.

Com a economia em franca decadência, o reino acaba de perder mais um primeiro-ministro. Liz Truss durou 44 dias no cargo, o governo mais curto da História britânica. O anterior tinha sido o do ex-premier George Canning, que morreu depois de 119 dias na função, em 1827. Em breve, o país terá o seu quinto chefe de governo em apenas sete anos e não há sinal de medidas convincentes para conter o processo rápido de estagnação em que se encontra o Reino Unido. Muitos atribuem a queda de Truss a um pacote de medidas econômicas controversas, conhecidas como “trussonomics”, que derrubaram os mercados e criaram desconfiança dentro e fora do seu Partido Conservador — a libra bateu os níveis mais baixos dos últimos 29 anos.

Além da força do mercado, que ficou evidente em todo o episódio, a explicação se deve sobretudo a desavenças internas que a legenda já não consegue disfarçar há tempos. A ascensão de Truss foi produto dessa fragmentação. Seu nome foi escolhido em um processo de dois meses que expôs as entranhas da sigla. Onze parlamentares conservadores se apresentaram para o cargo. Trocaram acusações cujo principal alvo eram nada menos do que as políticas adotadas pelo próprio partido nos 12 anos em que está no poder. Não há sequer unidade sobre que caminho tomar para tirar o país da situação em que se encontra.

Em 6 de setembro, Truss substituiu Boris Johnson, que renunciou em 7 de julho por perder a credibilidade depois de uma sucessão de escândalos. Ele, no entanto, continuou “cuidando da cadeira” até que se encontrasse um sucessor. Foi um período que muitos servidores públicos descreveram como um vazio de poder, já que Boris era carta fora do baralho. Ele próprio custou a cair porque o partido não via um nome que o substituísse. Seu carisma era e é tal que, paradoxalmente, Boris volta a ser cogitado para o cargo de primeiro-ministro.

Truss foi eleita entre seus pares com a promessa de cortar impostos e subsidiar com muitos bilhões de libras as contas de energia da população, que aumentaram, na média, 300% em um ano e meio. Em poucas semanas, porém, viu-se obrigada a dar um cavalo de pau. Reverteu a maior parte das medidas, demitiu seu ministro das Finanças e amigo Kwasi Kwarteng e convidou para comandar a pasta Jeremy Hunt, conservador da ala mais moderada do partido, que havia disputado a vaga com ela. O que se dizia por todo o Reino Unido era que Hunt tinha passado a mandar de fato no governo. Seu principal oponente em setembro, o ex-ministro das Finanças Rishi Sunak, agora é um dos mais cotados para o seu lugar.

Tudo isso acontece enquanto o país tenta se recompor da perda de sua monarca mais longeva — Elizabeth II era vista pela maioria da população como símbolo de estabilidade nacional.

Por mais que a ansiedade seja grande para a chegada do Natal, a ceia pode estar a perigo. Uma das maiores redes de supermercados do país avisa que é melhor encomendar o peru assado agora. Do ponto de vista do consumidor, a ideia pode fazer sentido. A inflação bateu os dois dígitos pela primeira vez em 42 anos e a falta de mão de obra, que tem pressionado as empresas de modo geral, tira produtos das prateleiras. Além disso, as famílias já se convenceram de que a calefação terá de ser reduzida durante o Natal e o inverno de modo geral, enquanto a economia do país continua a derreter.

A oposição trabalhista, em franca vantagem nas pesquisas de opinião, quer que a eleição geral prevista para o início de 2025 aconteça agora. Seu líder, Keir Starmer, propõe um programa econômico para promover estabilidade, palavra da qual os britânicos sentem falta desde que resolveram abandonar a União Europeia em 2016.

— Não é só a novela [do Partido Conservador] que provoca prejuízos para a economia e a reputação do país. Estamos falando de um caos absoluto, que afeta vidas reais — disse Starmer.

Com um discurso que demonstra a unidade da legenda, os trabalhistas preveem benefícios que cheguem às camadas mais pobres da população (os atuais subsídios nas contas de energia são para ricos e pobres) e um grande plano para a promoção de energias renováveis, que prevê a redução a zero das emissões de carbono até 2030 e a criação de uma agência do governo para conduzi-lo. Essa é uma das alternativas para baixar os gastos da população com as contas de gás e luz, além de investimentos em isolamento apropriado nas casas da população mais pobre que as proteja do frio intenso e do calor excessivo.

Duas décadas atrás, Elizabeth II falava em “annus horribilis”, depois de ver seus filhos se separarem em sequência e seu palácio preferido pegar fogo. Naquele ano, o país ainda se vira obrigado a mudar a âncora cambial e a criar um sistema de metas de inflação para conter uma outra crise econômica. A verdade é que 2022 tem muito mais cara de “annus horribilis” e parece não ter fim.

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