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Por Ana Rosa Alves e agências internacionais

No poder há pouco mais de um mês, a primeira-ministra do Reino Unido, Liz Truss, corre o risco de ter um dos governos mais curtos da História recente britânica. Em uma tentativa de salvar a própria pele, a política conservadora demitiu nesta sexta-feira seu ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng, e anunciou que substituirá seu controvertido plano econômico ultraliberal por um "meio-termo" até o fim do mês.

Junto com a premier que se diz thatcherista, Kwarteng foi o arquiteto do pacote que previa os maiores cortes de impostos em meio século, custando cerca de 43 bilhões de libras esterlinas (R$ 255,8 bilhões) aos cofres públicos sem que fossem previstas medidas para compensar o rombo. Classificado como imprudente desde que era a promessa central de sua campanha pela liderança do Partido Conservador, o pacote foi mal recebido por um país à beira da recessão, com a inflação perto dos dois dígitos e sofrendo os drásticos impactos do Brexit.

— Quero implementar uma economia com impostos baixos, salários altos e crescimento. Fui eleita para isso, e essa missão continua — disse Truss, admitindo apenas que seu plano foi "além e mais rápido" do que o mercado desejava. — Por isso, a maneira como implementamos nossa missão agora precisa mudar. Precisamos agir agora para assegurar os mercados de nossa disciplina fiscal — completou ela, alguns dias após a libra atingir seu mais baixo patamar histórico.

A premier disse que precisa agir "decisivamente" porque sua prioridade é o "interesse nacional", anunciando que seu novo ministro das Finanças será o ex-chanceler Jeremy Hunt, irá entregar um novo plano no "meio-termo" até o fim deste mês. Em meio a pausas e sinais de ansiedade, a premier disse "querer ser honesta" e reconheceu que a situação é "difícil", mas garantiu que o país "sobreviverá a esta tempestade".

A breve entrevista coletiva — sua fala inicial e as respostas a quatro perguntas duraram pouco mais de oito minutos — não foi bem recebida. À BBC, fontes conservadoras classificaram o desempenho como "insuportavelmente horrível", "vergonhoso" e "sem razão para otimismo". Os títulos britânicos registraram perdas frente à desconfiança e a libra caiu 1,3%, revertendo ganhos na quinta em meio a especulações de que o plano econômico seria suspenso.

"A política imprudente de Liz Truss fez a economia entrar em colapso, as hipotecas aumentarem exponencialmente e a posição britânica no cenário global foi minada", disse Keir Starmer, líder da oposição trabalhista, no Twitter, afirmando que uma alteração de ministros "não reparará os danos em Downing Street". "Precisamos de uma mudança de governo."

Indagada pelos repórteres sobre por que deveria permanecer no poder, já que o desastroso pacote era tanto seu quanto de Kwarteng, Truss disse:

— Foi por isso que eu tive que tomar as decisões difíceis de hoje. A missão continua a mesma, precisamos aumentar as taxas de crescimento do nosso país — disse ela, que não admitiu seu erro em qualquer momento. — Mas, no fim das contas, também precisamos garantir que teremos estabilidade econômica, e eu preciso agir de acordo com o interesse nacional.

Medida revertida

A reação foi particularmente negativa em relação à abolição da alíquota máxima de Imposto de Renda, de 45%, aplicada àqueles que ganham mais de 150 mil libras (cerca de R$ 892 mil) por ano, que Truss cancelou há 11 dias. O cancelamento de um corte de impostos para empresas, medida herdada do governo anterior, também fui suspenso: a taxa continuará a ser de 25%, ao invés dos 19% anunciados por Kwarteng no mês passado, redução que custaria 18 bilhões de libras (R$ 107 bilhões) aos cofres públicos.

"Você me pediu para abandonar o cargo de Ministro das Finanças. Eu acatei", disse Kwarteng, em sua carta de demissão, indicando que Downing Street é diretamente responsável pelas políticas do governo e que o "ambiente econômico mudou muito". "Agora é importante que sigamos em frente para enfatizar o compromisso de seu governo com a disciplina fiscal."

Kwarteng, cujo tempo à frente das Finanças foi o segundo menor da História, voltou às pressas de Washington na quinta, onde participava de reuniões com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que precisou resgatar o país em 1976 — ajuda que se fez necessária após um corte fiscal semelhante fazer a inflação e a dívida disparar. Até mesmo a organização multilateral fez críticas ao pacote da premier.

Segundo o FMI, as medidas de Truss podem exacerbar a ascendente desigualdade no país — políticas fiscais, disse o órgão, não devem ir na contramão dos esforços de autoridades monetárias para reduzir a inflação. Seguir por este caminho, disse o conselheiro econômico do Fundo, Pierre Gourinchas, "só vai prolongar a inflação e pode causar séria instabilidade financeira, como mostram os eventos recentes".

Além da mudança, Truss também fez alterações em cargos secundários no Tesouro, tirando do posto de secretário-chefe Chris Philp, apontado pela mídia como um dos responsáveis pelo corte dos impostos para os mais ricos. Não está claro, contudo, se a manobra mais recente garantirá a sobrevivência da premier de um país em estado perpétuo de crise desde a eclosão da pandemia de Covid-19 e o Brexit — segundo a União Europeia (UE), a situação britânica é um alerta para a necessidade de "prudência" na economia.

O panorama nacional não foi ajudado pelos escândalos consecutivos que acabaram derrubando o antecessor de Truss, Boris Johnson. Se o ex-premier é uma fênix que ressurgiu de circunstâncias que teriam derrubado muitos outros políticos, Truss parece não ter a mesma habilidade quando precisa provar que tem o controle da economia, do partido e do país.

Divergências entre os conservadores

Sua situação é complicada ainda mais pelo fato de nunca ter tido o apoio completo de seus correligionários. Na fase inicial da disputa para a chefia do Partido Conservador, quando votavam apenas os parlamentares, Truss ficou atrás de Rishi Sunak, um defensor ferrenho da ortodoxia. Venceu no voto popular entre os filiados do partido.

A perspectiva de derrubá-la, contudo, é tão ruim quanto a possibilidade de antecipar as eleições previstas para daqui a dois anos. O compilado de pesquisas do site Politico mostra que, se o pleito fosse hoje, os trabalhistas estariam 26 pontos percentuais na frente, com 50% contra 24%. Quando Truss tomou posse, em 6 de setembro, o placar era de 42% a 31%.

A hipótese menos pior gera discórdia até no grupo de WhatsApp dos parlamentares. Em prints vazados, o deputado Crispin Blunt sugeriu que Sunak e Penny Mordaunt, que ficou em terceiro na disputa pelo comando conservador, lancem uma frente única para substituir Truss. Foi rebatido pela colega Nadine Dorries:

"Seguido por uma eleição geral? Eu te amo, Crispin, mas se você realmente acha que a mídia e o povo vão nos permitir impor um novo líder, você precisa se aposentar", disse ela. "Poderíamos ao invés disso abraçar uma ditadura porque sua proposta é a mais antidemocrática possível."

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