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Por Marina Gonçalves

Apesar da resistência de suas exportações, que se beneficiaram neste ano da alta dos preços dos minérios, a instabilidade política que levou o Peru a ter seis presidentes nos últimos cinco anos está comprometendo a retomada do país no pós-pandemia. Se em 2021 a economia peruana cresceu 13,5%, recuperando-se da queda de 11% no primeiro ano da Covid, neste ano o aumento do PIB deve ficar em 2,7%, abaixo da média de 3,5% prevista para a América Latina e o Caribe pelo Fundo Monetário Internacional.

— É um crescimento mais lento que o esperado, considerando a alta dos preços do cobre. Para efeito de comparação, em meados dos anos 1990, quando tinha o mesmo nível de riqueza, o Chile crescia a 5%, 6%, em média. Estamos crescendo na metade desse ritmo. Ainda assim, mais que uma crise econômica, o risco é de que a instabilidade política diminua pouco a pouco os motores de crescimento da economia — afirma Diego Macera, diretor do Instituto Peruano de Economia (IPE).

A mineração é tradicionalmente a principal atividade do Peru. O setor cresceu 3,5% em outubro, a maior taxa em 13 meses, segundo o IPE, graças principalmente ao aumento das exportações de cobre e à maior extração de ouro. No entanto, antes mesmo da última troca de presidentes, com a queda de Pedro Castillo e a posse de sua vice, Dina Boluarte, o Banco Mundial já previa que as exportações sozinhas não sustentariam o crescimento de uma economia em que a demanda interna está enfraquecida.

— Estamos subestimando a influência da instabilidade política sobre o desempenho econômico peruano. Por mais que as cifras de 2022 não pareçam catastróficas, vale lembrar que nas últimas duas décadas estivemos sempre entre as cinco primeiras economias da região. Agora estamos entre as sete piores — pondera Waldo Mendonza, professor da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP) e ministro da Economia durante o governo de Francisco Sagasti (2020 e 2021). — O que teria acontecido se tivéssemos governos minimamente normais nos últimos anos? Possivelmente estaríamos muito melhor em termos macroeconômicos.

Nos 10 anos entre 2004 e 2013, o Peru esteve entre os países que mais cresceram na América Latina, a uma média de 6,4% ao ano, graças à abertura comercial e a reformas liberalizantes que controlaram as contas públicas. O ritmo do crescimento, porém, já havia caído para 3% ao ano a partir de 2014.

Agora, de acordo com o Banco Mundial, o Peru precisa superar "desafios estruturais" para melhorar suas perspectivas. Isso inclui, segundo a instituição, reduzir o setor informal, que emprega três quartos da mão de obra do país em postos de baixa produtividade. O banco prevê que em 2022 a pobreza no Peru continuará acima dos níveis pré-pandêmicos, por causa principalmente da "baixa qualidade dos empregos", que faz com que os salários continuem 12% menores do que em 2019. Hoje, 5,8% dos peruanos vivem em pobreza extrema, comparados a 3% em 2019.

— Os impactos em longo prazo [da instabilidade política] são ainda mais preocupantes — alerta Mendonza. — Não existe impulso de investimentos sem um aparato estatal sofisticado, e a qualidade do setor público chegou ao seu estado mais caótico desde o primeiro governo de Alan García [entre 1985 e 1990, durante a crise da dívida externa latino-americana]. São danos que vamos demorar muito a recuperar.

Até mesmo o setor mineiro foi afetado pela instabilidade. Sucessivos governos foram incapazes de lidar, nos últimos anos, com os protestos na região da mina de Las Bambas, responsável por 1% do PIB do país. Em 2019, por exemplo, o governo de Martín Vizcarra decretou estado de emergência na região, onde moradores bloquearam por várias semanas uma estrada usada pela mineradora.

— Os conflitos mineiros dificultaram investimentos no setor. Alguns projetos foram muito rejeitados pela população indígena, que temia a contaminação de rios e fechou estradas e vias por semanas — lembra o também ex-ministro Pedro Francke, que ocupou a pasta durante os primeiros seis meses do governo Castillo.

As contas públicas peruanas ainda são consideradas sólidas. No final dos anos 1980, o Peru tinha uma dívida pública de quase 90% do PIB e um déficit fiscal de 11%. Agora, a dívida se estabilizou em torno de 35%, e o déficit, depois de chegar a 2,5% em 2021 por causa da ajuda à população na pandemia, caiu para 1,2% em meados deste ano. Além disso, as reservas cambiais do país são de US$ 74 bilhões, as mais altas da América do Sul em relação ao tamanho de sua economia.

— Por um lado não deixa de ser surpreendente que a economia continue crescendo, o que se deve a uma fortaleza fiscal e monetária muito grande, que dá muita solvência ao Estado — afirma Francke. — Por outro, vivemos uma instabilidade política nos últimos seis anos que não permitiu novas estratégias de desenvolvimento e freou investimentos privados. É muito difícil focar na economia sem que haja paz interna.

Desde a Constituição de 1993, promulgada sob a ditadura de Alberto Fujimori, o Peru tem um Banco Central totalmente independente. O BC é dirigido pelo mesmo economista há 16 anos, Julio Velarde, que sobreviveu a presidentes de direita e de esquerda e, no ano passado, foi nomeado por Castillo para um novo mandato de cinco anos.

— Houve uma mudança estrutural dos fundamentos da economia peruana a partir de 1990, com maior flexibilidade econômica e uma maior abertura comercial. As mudanças foram consolidadas com a nova Constituição de 1993 — explica Macera. — Além da total independência do Banco Central, há uma proibição explícita na Constituição de que o BC empreste dinheiro ao Executivo, uma diferença em relação a outros países com episódios inflacionários causados para financiar o déficit fiscal, como a Argentina.

Além disso, diferentemente do que ocorre em outros países da região, no Peru qualquer pessoa pode trocar legalmente a moeda local por dólares e depositar suas economias em moeda estrangeira em um banco peruano, o que atenua a pressão sobre a saída de capitais em momentos de tensão.

— Como resultado, o Peru foi uma das poucas economias emergentes onde o câmbio não foi depreciado frente ao dólar — diz Macera.

Castillo assumiu o cargo em julho de 2021 prometendo redistribuir radicalmente a riqueza do país e reformular a Constituição. Mas, sem apoio no Congresso ou nas ruas para convocar uma Assembleia Constituinte, não aprovou nenhuma reforma econômica significativa. Boluarte, por sua vez, nomeou como ministro da pasta um economista renomado, Alex Contreras, que passou a maior parte da sua carreira, entre 2007 e 2019, no Banco Central.

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