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Por O Globo e agências internacionais — Moscou

Em sua primeira viagem a Moscou desde a eclosão da guerra na Ucrânia, o presidente chinês, Xi Jinping, foi recebido com pompa no Kremlin nesta segunda-feira por seu "querido amigo", o presidente russo Vladimir Putin. A visita sedimenta a cada vez mais próxima relação entre os aliados, mas também deve evidenciar as linhas vermelhas de Pequim — e as ambições que o mandatário chinês tem de se consolidar como um estadista global.

Xi chegou ao Kremlin por volta das 14h30 (10h30 no Brasil) e participou de uma reunião informal seguida por um jantar de seis pratos, segundo a imprensa estatal russa. No início do encontro, que já estava anunciado quando o Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu na sexta uma ordem de prisão contra Putin por deportações de crianças ucranianas para a Rússia, os presidentes se cumprimentaram chamando-se mutualmente de "querido amigo".

— A China deu um tremendo salto adiante na última década, nós os invejamos um pouco — disse Putin antes da conversa, elogiando Pequim por sua "posição justa e equilibrada frente à maioria dos problemas internacionais". — Nós estudamos a fundo suas propostas sobre a Ucrânia e as discutiremos (...). Estamos abertos para negociações.

O chefe do Kremlin se referia ao posicionamento de 12 pontos de Pequim sobre a guerra divulgado no último dia 24, que pede um cessar-fogo, defende a integridade territorial — sem esclarecer como isso se aplicaria aos territórios ucranianos anexados por Moscou — e oferece benefícios à Rússia com a suspensão das sanções. Horas antes, o porta-voz da Presidência russa, Dmitry Peskov, havia dito que o tema "obviamente" seria abordado no encontro.

Xi desembarcou no Aeroporto Vnukovo, na região de Moscou, às 12h59 (6h59 em Brasília), sendo recebido por uma banda militar. A televisão estatal mostrou o avião pousando em tempo real e ressaltou o aprofundamento dos laços econômicos bilaterais. Nos arredores do aeroporto, uma faixa em chinês dava boas-vindas ao líder chinês.

— Estou confiante de que essa visita gerará resultados frutíferos e dará novo ímpeto ao desenvolvimento saudável e estável da parceria estratégica abrangente entre China e Rússia na nova era — disse ele, afirmando que os países têm uma postura "alinhada, não conflituosa e que não mira em terceiros", mas sem mencionar explicitamente a Ucrânia.

No jantar, contudo, houve uma gafe: o presidente chinês disse "ter confiança" de que o povo russo apoiará Putin nas eleições presidenciais do ano que vem. O chefe do Kremlin, contudo, ainda não confirmou sua candidatura. Peskov logo depois negou que Xi tenha conhecimento prévio dos planos do colega:

— Vocês o ouviram errado. Xi Jinping disse ter certeza de que daqui a um ano os russos vão apoiar Vladimir Putin. E compartilhamos a confiança de Vladimir Putin — disse o porta-voz.

Expectativas diferentes

Para os russos, a expectativa é de que a viagem de Xi sirva para aumentar a legitimidade de uma invasão que pôs Moscou na posição de pária no Ocidente, com os Estados Unidos e seus aliados impondo uma enxurrada de sanções à Rússia. Os planos de Xi, eleito para um histórico terceiro mandato pelo Congresso Nacional do Povo no último dia 10, são mais pragmáticos.

A China diz que adota uma posição neutra diante do conflito, mas seu apoio diplomático à Rússia é consistente, e Xi é o líder mais proeminente a pisar em Moscou desde que as tropas russas invadiram a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022. O chanceler chinês, Qin Gang, por exemplo, referiu-se recentemente às relações sino-russas como "força motriz" da diplomacia internacional.

Via de regra, a China se abstém em votações na ONU que condenam a guerra, e nesta segunda-feira disse que o TPI deve "ser imparcial" e "evitar politização e dois pesos e duas medidas". Também aumentou significativamente suas trocas comerciais com os russos, que atingiram um recorde de US$ 190 bilhões no ano passado, compensando em parte as perdas impostas pelas sanções dos EUA e de seus aliados, aproveitando descontos no petróleo e no gás.

Para os chineses, o Kremlin é um aliado-chave contra o que consideram ser um cerco ocidental a seus interesses estratégicos, em especial na Ásia, e no desejo de fazer frente à hegemonia americana com a defesa de uma ordem multipolar. Com relações complicadas durante a Guerra Fria, China e Rússia se aproximaram nos últimos anos em meio ao acirramento das tensões sino-americanas.

Em fevereiro de 2022, pouco antes da invasão da Ucrânia, Xi e Putin se reuniram e anunciaram uma "parceria sem limites" — com a eclosão do conflito, no entanto, a embaixada chinesa nos EUA esclareceu que há um "limite" para a parceria. Manter bons laços com o Ocidente, em particular com a Europa, é fundamental para os chineses, sua recuperação econômica pós-Covid e suas ambições diplomáticas.

Apesar de relatos da Inteligência americana de que a China tem a intenção de fornecer armas aos russos, não há qualquer indício de que alguma iniciativa nesse sentido esteja em andamento. Em suas declarações nesta segunda-feira, Peskov deixou claro que há hesitações chinesas: ele afirmou que Putin dará "explicações exaustivas" para que o colega possa entender "a posição russa no momento".

A fala é uma referência ao último encontro dos dois líderes, em setembro, às margens de uma cúpula da Organização para a Cooperação de Xangai (OCX) no Uzbequistão. Na ocasião, a China deixou claro que os países têm diferenças sobre a guerra, e Moscou prometeu que explicaria sua posição.

Estadista global

Para Xi, a meta da viagem é se consolidar como um estadista, buscando assumir um espaço de influência antes restrito aos EUA, apresentando-se como uma alternativa viável a Washington — planos impulsionados por sua mediação na reconciliação entre Arábia Saudita e Irã. O instrumento-chave é a iniciativa de paz, que foi saudada com reticência por Moscou e Kiev, mas rechaçada pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), a aliança militar encabeçada pelos americanos.

Um dos argumentos ocidentais é de que Xi não teve uma conversa com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, desde que a guerra começou, apesar de seu contato regular com Putin. Antes da visita desta semana, foram diversas conversas telefônicas e o encontro presencial no Cazaquistão. Há relatos, contudo, de que os chineses planejam uma conversa por telefone com Zelensky nos próximos dias, e os contatos ministeriais entre Pequim e Kiev aumentaram nas últimas semanas.

Horas após Xi pousar em Moscou, Oleksiy Danilov, chefe do Conselho de Segurança Nacional e Defesa da Ucrânia, disse em um comunicado que quaisquer negociações de cessar-fogo dependerão da devolução dos territórios ocupados. Além da Península da Crimeia, em 2014, anexaram de forma unilateral em outubro as províncias de Luhansk, Donestk, Zaporíjia e Kherson após referendos internacionalmente questionados.

Segundo Peskov, depois do encontro “cara a cara” desta segunda, terça será o “dia das negociações” e haverá uma entrevista coletiva conjunta. De acordo com o governo chinês, seu presidente está acompanhado de Wang Yi, principal diplomata do país; do chanceler Qin Gang; e de Cai Qi, diretor do Escritório Geral do Comitê Central do Partido Comunista.

O presidente chinês está hospedado no resort cinco estrelas Soluxe, ao Norte de Moscou, que tem o "maior parque tradicional chinês fora da China". De acordo com a imprensa estatal chinesa, ele foi recebido por dezenas de pessoas com bandeiras dos dois países.

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