A polícia de Londres lamentou algumas das dezenas de manifestantes detidos à margem da coroação do rei Charles III no sábado, alimentando um debate nacional sobre o policiamento do evento e sobre a nova lei antiprotesto que os oficiais usaram em algumas prisões.
A lei, chamada Lei de Ordem Pública de 2023, entrou em vigor dias antes da coroação, dando à polícia no Reino Unido e no País de Gales poderes estendidos para deter e acusar aqueles que suspeitam de preparar protestos potencialmente perturbadores. A cerimônia no sábado foi amplamente vista como o primeiro teste para a legislação, que foi antecipada no ano passado após uma onda de protestos climáticos e já havia sido condenada por grupos de direitos humanos e especialistas jurídicos.
Até agora, o primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, defendeu tanto a lei quanto a polícia, dizendo às emissoras na terça-feira que seu governo simplesmente deu aos oficiais "os poderes de que precisam para lidar com casos de séria perturbação na vida das pessoas".
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— Acho que é a coisa certa a fazer, e a polícia tomará decisões sobre quando usar esses poderes — acrescentou Sunak.
Contudo, as prisões levantaram questões mais amplas sobre uma medida que Volker Türk, chefe do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, havia descrito anteriormente como profundamente preocupante e incompatível com as obrigações internacionais do Reino Unido sobre a liberdade de expressão e o direito de reunião pacífica.
"Esta lei é totalmente desnecessária, pois a polícia do Reino Unido já tem poderes para agir contra manifestações violentas e perturbadoras", disse Türk em um comunicado em abril.
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Nova tática de 'bloqueio'
A operação de segurança da coroação foi uma das maiores da História do Serviço de Polícia Metropolitana de Londres, e altos funcionários da polícia disseram antes do fim de semana que saudaram os poderes ampliados da nova legislação.
Cerca de 64 pessoas foram presas durante a operação no sábado, disse a polícia, incluindo 52 que os policiais temiam que pudessem interromper o evento, violar a paz ou "causar perturbação pública", entre outras questões.
Porém, na noite de segunda-feira, a polícia expressou "arrependimento" pela prisão de alguns manifestantes antimonarquia no sábado, que, segundo eles, foram detidos porque os policiais suspeitaram que eles poderiam tentar bloquear o caminho.
Tal tática de bloqueio foi usada durante uma série de manifestações públicas recentes e é definida na nova legislação como ações em que os manifestantes se prendem a objetos, prédios ou outras pessoas.
A lei também torna crime obstruir redes de transporte ou interferir em grandes infraestruturas. Muitos grupos ativistas acreditam que a legislação ameaça fundamentalmente seu direito de protestar.
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Graham Smith, presidente-executivo do Republic, grupo antimonarquia que organizou o maior protesto no centro de Londres no sábado, foi preso ao lado de vários outros ativistas — apesar de, segundo ele, conversar com a polícia por meses para resolver possíveis problemas.
Smith disse que o grupo estava buscando aconselhamento jurídico com o objetivo de abrir um processo contra a polícia.
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A Polícia Metropolitana já disse que alguns dos detidos na manhã de sábado não violaram nenhuma lei. Às 6h40, horas antes da manifestação planejada pelo Republic, os policiais viram pessoas descarregando itens de uma van perto da rota da procissão da coroação, disseram eles em um comunicado divulgado na noite de segunda-feira.
A polícia encontrou cartazes e "itens que, na ocasião, eles tinham motivos razoáveis para acreditar que poderiam ser usados como dispositivos de bloqueio", segundo o comunicado, e prendeu seis pessoas "sob suspeita de estarem equipadas para bloquear".
Os manifestantes presos disseram que os dispositivos eram na verdade correias de bagagem para prender faixas. Depois que a investigação policial não conseguiu provar que alguém tinha a intenção de usar as correias para se prender a algum lugar, todos os seis tiveram sua fiança cancelada e nenhuma outra ação seria tomada contra eles, disse a polícia.
"Lamentamos que as seis pessoas presas não tenham conseguido se juntar ao grupo mais amplo de manifestantes em Trafalgar Square e em outros lugares na rota da procissão", acrescentou o comunicado.
Proibido se manifestar
Mark Rowley, chefe do Serviço de Polícia Metropolitana, defendeu as ações de seus oficiais e o uso da nova lei em um artigo de opinião publicado no jornal The Evening Standard na terça-feira, dizendo que essas seis prisões foram as únicas feitas sob essa legislação.
Por sua vez, Matt Turnbull, um dos ativistas presos na van no sábado, disse que os policiais visitaram sua casa na noite de segunda-feira para devolver seu telefone e pedir desculpas em nome do serviço policial.
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— Se você é antimonarquista, 6 de maio foi o dia mais importante — disse Turnbull, acrescentando que nunca faria algo que comprometesse seu direito de participar de um protesto legal.
Contudo, em vez de ser autorizado a se manifestar, ele disse, foi algemado, colocado em uma van da polícia e passou 14 horas em uma cela.
— A definição de "bloquear" é tão ampla que a polícia pode detê-lo por usar um cinto — disse ele. — Como você determina a intenção de alguém sobre o que eles vão usar? É uma coisa muito assustadora.
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