A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos que considerou inconstitucionais critérios de raça e etnia para a admissão de alunos nas universidades de Harvard e Carolina do Norte é o mais recente lembrete da guinada conservadora pela qual a máxima instância do Judiciário americano passou nos últimos anos. O placar de 6 a 3 a favor de derrubar as ações afirmativas opôs os juízes indicados por presidentes republicanos e democratas, em uma dinâmica que vem se repetindo em questões politicamente acirradas.
A atual composição da Suprema Corte tem a mão de cinco presidentes. Ketanji Brown Jackson, a mais nova no cargo, foi a única indicada por Joe Biden, enquanto Sonia Sotomayor e Elena Kagan, que também votaram contra a medida, foram escolhidas por Barack Obama. John G. Roberts Jr., Samuel Alito e Clarance Thomas, os que estão a mais tempo no cargo, foram indicados por George Bush (pai) e George W. Bush. O último terço dos juízes, composto por Neil Gorsuch, Brett Kavanaugh e Amy Coney Barrett, foi indicado por Donald Trump — que teve um número de indicações completamente incomum em apenas quatro anos de mandato, promovendo nomes conservadores.
Antes do mandato de Trump, a divisão de poder dentro da Corte era mais equilibrada, e mesmo sua indicação inicial não alterou em profundidade essa composição. Neil Gorsuch substituiu o juiz Antonin Scalia, considerado por analistas como muito conservador, após sua morte em 2016, aos 79 anos. As indicações seguintes, no entanto, mudaram o panorama.
![O então presidente Donald Trump se aproxima de Amy Coney Barrett e seus filhos durante evento no Rose Garden, em 2020. — Foto: Olivier Douliery/AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/oJJlBSEP5Z3uJPu09WiJ2dE998Q=/0x0:4500x3045/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/6/Q/i8BrYqSdaIObGqYpLDbA/89868097-files-in-this-file-photo-taken-on-september-26-2020-us-president-donald-trump-walks-by-judg.jpg)
Com a aposentadoria do juiz Antony Kennedy, considerado um juiz centrista e apontado como um ponto de equilíbrio entre os magistrados liberais e os conservadores, em 2018, Trump indicou o conservador Brett Kavanaugh, criando um bloco conservador majoritário, com cinco votos. A distância ficou ainda maior com a morte da juíza Ruth Bader Ginsburg, conhecida por suas decisões favoráveis a pautas liberais, em 2020. Ginsburg foi substituída por Amy Coney Barrett, uma conservadora que trabalhou diretamente no gabinete de Antony Scalia.
Mesmo com a derrota de Trump nas eleições contra Biden, a única indicação feita pelo atual presidente democrata não alterou o quórum da Corte, uma vez que Ketanji Brown substituiu o juiz Stephen Breyer, um antigo indicado de Bill Clinton, que se aposentou. Embora a indicação de um presidente não garanta que um magistrado seja alinhado ou não a determinada pauta, o que se mostrou desde as indicações de Trump é uma forte corrente conservadora.
6 a 3 repetido
Em junho do ano passado, também pelo placar de 6 a 3, a Suprema Corte derrubou o precedente legal criado pelo caso Roe v. Wade, eliminando a garantia constitucional ao aborto para mulheres americanas. A decisão provocou um efeito cascata em Estados conservadores, que aprovaram proibições a interrupção da gravidez e mesmo punições para grávidas.
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Mesmo pressionada pelo aumento vertiginoso do número de ataques a tiro no país, sobretudo contra crianças e jovens em escolas, os magistrados decidiram, mais uma vez por 6 a 3, confirmar o amplo direito de cidadãos se armarem em público, derrubando uma lei de Nova York que impôs limites rígidos ao porte de armas fora de casa, também em junho de 2022.
Outras decisões pelo mesmo placar, também reforçaram a influência da igreja sobre a vida pública e impuseram restrições nas capacidades da Agência de Proteção Ambiental regular emissões de carbono em usinas.
Veja fotos: Suprema Corte dos EUA derruba direito ao aborto e gera reação nas ruas
![Ativistas do direito ao aborto protestam em frente à Suprema Corte dos EUA que, dominada por conservadores, revogou a decisão histórica de 1973 conhecida como "Roe x Wade", que consagrava o direito da mulher ao aborto e disse que os estados individuais podem permitir ou restringir o procedimento por conta própria — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/HPLsfOo222XOH7cHJrt4uc8j3wE=/0x0:4000x2565/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/Q/M/eHs1V4SiStNIdAnHHvDA/99661446-abortion-rights-activists-react-outside-the-us-supreme-court-in-washington-dc-on-june-24-20.jpg)
![Ativistas do direito ao aborto protestam em frente à Suprema Corte dos EUA que, dominada por conservadores, revogou a decisão histórica de 1973 conhecida como "Roe x Wade", que consagrava o direito da mulher ao aborto e disse que os estados individuais podem permitir ou restringir o procedimento por conta própria — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/Woko-Cp_pkQHTPunScP4ZQ8sFX8=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/Q/M/eHs1V4SiStNIdAnHHvDA/99661446-abortion-rights-activists-react-outside-the-us-supreme-court-in-washington-dc-on-june-24-20.jpg)
Ativistas do direito ao aborto protestam em frente à Suprema Corte dos EUA que, dominada por conservadores, revogou a decisão histórica de 1973 conhecida como "Roe x Wade", que consagrava o direito da mulher ao aborto e disse que os estados individuais podem permitir ou restringir o procedimento por conta própria — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP
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![Manifestantes pró-escolha e antiaborto se reúnem do lado de fora da Suprema Corte dos EUA em Washington — Foto: MANDEL NGAN / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/HubkpOVDfuDAnGKh5v5xDq-vF-0=/0x0:6000x4000/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/4/4/JD2J8YQIeQS2g4lsX75A/99659919-pro-choice-and-anti-abortion-demonstrators-gather-outside-the-us-supreme-court-in-washingto.jpg)
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Manifestantes pró-escolha e antiaborto se reúnem do lado de fora da Suprema Corte dos EUA em Washington — Foto: MANDEL NGAN / AFP
![Manifestantes a favor do direito ao aborto se concentram diante da Suprema Corte dos EUA, em Washington — Foto: CHIP SOMODEVILLA/AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/Pkx5mc8RoE1ugbST9DFuA1CLoCk=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/C/M/YFcyMpTvO6BwLgRBlKZw/99664146-washington-dc-june-24-thousands-of-abortion-rights-activists-gather-in-front-of-the-us-su.jpg)
Manifestantes a favor do direito ao aborto se concentram diante da Suprema Corte dos EUA, em Washington — Foto: CHIP SOMODEVILLA/AFP
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![Apoiadores pró-escolha protestam em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington, contra a revogação do direito ao aborto — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/EjaLS2erXQlqT1j6B8XuGXaPCjE=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/S/C/1yttt8TZ2zsEwQmdiT9g/99660457-pro-choice-supporters-react-outside-the-us-supreme-court-in-washington-dc-on-june-24-2022-.jpg)
Apoiadores pró-escolha protestam em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington, contra a revogação do direito ao aborto — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP
![Ativistas antiaborto comemoram nas ruas de Washington — Foto: Brandon Bell / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/egT9Tpm3vox9X9n6cOwJlmXGjjs=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/B/r/ocM6S4RI2fGaEBqBFJCg/99660589-washington-dc-june-24-anti-abortion-activists-react-to-the-dobbs-v-jackson-womens-health.jpg)
Ativistas antiaborto comemoram nas ruas de Washington — Foto: Brandon Bell / AFP
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![Conservadores contra o aborto comemoram decisão da Suprema Corte dos EUA em Washington, DC — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/jIFHVa4UrVbEdMTZyf6HhQPnQb4=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/2/g/DV113UQgCORBjSulzF3Q/99660463-pro-life-supporters-celebrate-outside-the-us-supreme-court-in-washington-dc-on-june-24-2022.jpg)
Conservadores contra o aborto comemoram decisão da Suprema Corte dos EUA em Washington, DC — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP
![Manifestantes contra e a favor da derrubada do direito do aborto se reúnem em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington — Foto: STEFANI REYNOLDS / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/8mx-N2eJpsNLDjHuZIRzJWGpIKY=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/G/e/pKjUBfQLKk1paixzklFA/99662361-abortion-rights-activists-and-anti-abortion-activists-react-outside-the-us-supreme-court-in.jpg)
Manifestantes contra e a favor da derrubada do direito do aborto se reúnem em frente à Suprema Corte dos EUA, em Washington — Foto: STEFANI REYNOLDS / AFP
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![Ativistas antiaborto comemoram do lado de fora da Suprema Corte — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/646p_8wtplFflAw33KGDxpfyrCI=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/r/n/m2BwPBQ5A7MnED58KG1Q/99661144-anti-abortion-campaigners-celebrate-outside-the-us-supreme-court-in-washington-dc-on-june-2.jpg)
Ativistas antiaborto comemoram do lado de fora da Suprema Corte — Foto: OLIVIER DOULIERY / AFP
Muitas especulações sobre como contornar a maioria conservadora estabelecida no topo do Judiciário surgiram durante o governo Biden. Uma comissão para discutir a ampliação do número de assentos na Corte chegou a ser criada, mas não prosperou.
Com dois ministros na casa dos 70 anos, Biden ou seu sucessor podem ter a missão de indicar novos ministros em breve, mas com o cenário político imprevisível, a aposta do democrata para equilibrar a "balança da justiça" foi em instâncias inferiores. Até agosto do ano passado, o presidente havia indicado 75 juízes para os três principais níveis do sistema judicial federal — os tribunais distritais, os tribunais de apelação e a Suprema Corte dos EUA — de acordo com uma análise de dados do Pew Research Center, o que o tornou o presidente a fazer mais indicações do tipo, no espaço de tempo analisado, desde John F. Kennedy.