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Por Renzo Gómez Venga, de El País — Lima

O carimbo das forças de ordem no Peru nos últimos dias é o da Polícia de Imigração, estacionada nos principais acessos a Lima, onde exigem documentos aos peruanos de outras regiões como se fossem estrangeiros em seu próprio país. Formando batalhões que percorrem várias avenidas da capital para mostrar seu poder, os uniformizados afirmam que estão apenas treinando para o desfile cívico militar às vésperas dos feriados nacionais. A terceira marcha em Lima, anunciada para quarta-feira, marcará o retorno das mobilizações sociais e o governo da presidente Dina Boluarte já dá sinais de medo e preocupação.

Desde meados de junho, a presidente, seus ministros e as Forças Armadas fazem um discurso para deslegitimar os protestos que vão desde motivos econômicos até insistência do fantasma do "terruqueo", dispositivo político que busca, sem provas, intimidar adversários políticos com práticas terroristas.

A escalada começou com uma frase que certamente fará parte da antologia de Dina Boluarte no cargo:

— Quantas mortes mais eles querem? Pelo amor de Deus! — disse durante a visita de seu homólogo equatoriano, Guillermo Lasso.

Depois foi a vez do ministro do Interior, Vicente Romero, que minimizou a indignação das ruas, com um argumento que o empresariado também defende: que a economia não deve parar.

— Mais de 90% da população quer trabalhar. Existem organizações que estão por trás dessa nova ocupação de Lima, mas a própria população não responde mais.

Por sua vez, Jorge Chávez, ministro da Defesa, recorreu ao caráter moral da população para prever o fracasso das mobilizações:

— Estou convencido de que os bons cidadãos não vão se prestar a isso.

O alto comando da Polícia Nacional tem sido mais radical: por um lado, aponta que a mudança da Constituição, uma das demandas dos manifestantes, é uma exigência do grupo terrorista Sendero Luminoso e, por outro, infunde medo em quem vai expressar seu descontentamento na próxima semana, garantindo que eles estão infiltrados no grupo de manifestantes.

— A ideia de mudança na Constituição, para deixar claro, vem do Sendero. Eles têm incutido essa ideia na mente das pessoas. Hoje muita gente exige, mas não sabemos de onde vem isso — disse José Zavala, chefe da Direção contra o Terrorismo (Dircote).

Por sua vez, Óscar Arriola, chefe da Direção de Investigação Criminal (Dirincri), comunicou suas certezas sem pestanejar: “Tenha muito cuidado com quem está ao seu lado, porque já foi comprovada a participação de membros do Sendero Luminoso. Não é 'terruqueo', dizemos com muito profissionalismo.

Circula nas redes sociais uma campanha que faz eco destas afirmações sob o slogan “no dia 19, faça seu terruco. Ajude a sua Polícia Nacional”. No cartaz, pedem para filmar e fotografar "todos os desordeiros, terroristas, destruidores da propriedade estatal e da propriedade privada".

Recursos para as Forças Armadas

A transferência de 12,2 milhões de soles (cerca de R$ 17 milhões) do Ministério da Economia e Finanças para as Forças Armadas foi recentemente aprovada para "promover a recuperação econômica". Segundo o jornal Hildebrandt en sus Trece, no entanto, trata-se de "uma injeção econômica para pagar os serviços prestados nas operações relacionadas às marchas".

O sociólogo Roberto Huaraca Altamirano, delegado do Comitê Nacional Unificado de Luta do Peru (CONULP), uma das organizações que se unirão à marcha, defende que o "terruqueo" tenha fim: que o Estado justifique os crimes.

— Você não pode matar assim, a justificativa perfeita é que eles são terroristas. Agora, na vida real essa presença existe? Não. O Sendero foi derrotado nos anos 1990. E se ainda há remanescentes na selva é porque o Estado precisa deles. Mas eles não têm ideologia e se dedicam ao narcotráfico.

De acordo com a Ouvidoria do país, órgão independente, os distúrbios ocorridos nos primeiros meses do mandato de Dina Boluarte deixaram 49 civis mortos em confrontos com policiais, outros 11 civis mortos em bloqueios de estradas; além de sete militares e um policial que perderam a vida nos confrontos.

Mesmo com a perda de 68 vidas e denúncias em relatórios de organizações internacionais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o governo manteve-se de pé, apesar do clamor dos cidadãos por eleições gerais antecipadas.

Falta de agenda única

Talvez seja esse o único pedido com o qual a oposição concorda: que Boluarte retire a faixa presidencial e seja julgada por sua responsabilidade política como comandante das Forças Armadas, junto com os envolvidos nas mortes dos protestos de janeiro.

Não há uma agenda única nas ruas. Há quem exija a libertação de Pedro Castillo, alegando que seu autogolpe de 7 de dezembro não ocorreu e que o Congresso aprovou sua vacância com menos votos do que determina a lei. Outros têm como slogan que os atuais parlamentares devem deixar os cargos e promover uma Constituinte. Também marcharão os que rejeitam a privatização das empresas nacionais e exigem a saída das tropas militares dos Estados Unidos que realizam "atividades de cooperação e treinamento" com as Forças Armadas do Peru.

O contraste de ideais pode enfraquecer e até derrubar o protesto. No meio da semana, a Universidade Nacional de San Marcos suspendeu suas atividades presenciais até novo aviso. A justificativa: “Medidas de segurança e prevenção de contingências”.

Em janeiro, estudantes da universidade receberam centenas de manifestantes de outras regiões no campus. Alguns dias depois, um contingente policial entrou com tanques, detendo manifestantes em massa — não foi encontrada nenhuma arma que pudesse incriminá-los. A verdade é que na tarde de sexta-feira, um grande grupo de universitários tomou San Marcos em repúdio à disposição do reitor Jeri Ramón, pintando slogans nas paredes das faculdades. “Abaixo o governo central! São Marcos é da cidade!”.

No Executivo, a semana passada começou com o encontro de dirigentes do grupo radical de extrema direita A Resistência com o vice-ministro da Interculturalidade, Juan Reátegui, na sede do Ministério. A Resistência realizou vários ataques contra jornalistas, membros de ONGs, autoridades eleitorais e grupos de esquerda. No mês passado, sacos de excremento foram jogados nas instalações do Instituto de Defesa Legal (IDL), em Lima. A reunião produziu demissões e renúncias de alguns chefes do Ministério da Cultura, mas não de sua principal autoridade, Leslie Urteaga. Para alguns analistas é uma mensagem de provocação e impunidade do governo.

O chefe do Conselho de Ministros, Alberto Otárola, deu uma declaração confusa na última sexta-feira, em que distanciou o Executivo dos protestos, apesar de o governo ser o responsável pelo controle civil das Forças de ordem.

— Apelamos às autoridades para que apliquem o uso legítimo da força de acordo com a lei e garantam a segurança e integridade de quem vai participar na marcha, bem como a paz e tranquilidade de quem decidir não o fazer.

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