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Por O Globo e agências internacionais — São Petersburgo, Rússia

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse nesta sexta-feira que "estuda com atenção" as propostas de países africanos que buscam uma saída para a guerra na Ucrânia, após as nações da região aumentarem a pressão sobre Moscou. O chefe do Kremlin fez a declaração na cúpula Rússia-África, esforço em São Petersburgo que coincide com suas tentativas de tranquilizar os líderes dos países africanos sobre o fim do acordo de exportação de grãos pelo Mar Negro, que aumenta a insegurança alimentar no planeta.

Sem criticar diretamente Moscou, as nações africanas foram bem mais enfáticas sobre suas preocupações com o conflito na Ucrânia do que em outros momentos. O próprio quórum do evento demonstra a hesitação: há 17 chefes de Estado africanos presentes, menos da metade dos 43 que viajaram na última edição da cúpula, há quatro anos.

— Respeitamos suas iniciativas [para o fim do conflito] e as estudamos com atenção — afirmou o mandatário russo em seu discurso no último dia da cúpula. — As tentativas anteriores de mediação estavam monopolizadas pelas chamadas "democracias avançadas". Agora a África também está disposta a ajudar e resolver problemas que parecem estar fora de sua área de interesse prioritário.

Mais cedo, o presidente da União Africana, Moussa Faki Mahamat, havia dito que "esta guerra deve acabar, e só deve acabar com base na Justiça e na razão". Há uma preocupação em particular com os impactos do colapso do acordo de grãos — algo que Putin reconhece e o levou a prometer doar até 50 mil toneladas de cereais para seis nações do continente que têm elos fortes com Moscou.

— As disrupções nas ofertas de energia e grãos devem terminar imediatamente. O acordo de grãos deve ser prorrogado para o benefício de todas as pessoas do mundo, dos africanos em particular — afirmou Mahamat.

Nos meados de junho, uma delegação africana visitou a Ucrânia e a Rússia tentando achar espaço para uma trégua, mas não teve sucesso. As propostas vindas da região não estão imediatamente claras, mas envolvem passos como um recuo das tropas russas, a redução da escalada militar, a remoção das armas nucleares táticas que Putin enviou para a aliada Bielorrússia, alivio das sanções contra Moscou e a suspensão do mandado de prisão que o Tribunal Penal Internacional emitiu contra o Kremlin.

Os ucranianos já rechaçaram a proposta por afirmar que ela não dava garantias de que os soldados russos abandonariam o solo ucraniano, e demandam um cessar-fogo que não incluam a devolução dos territórios ocupados pelos russos — entre eles a Península da Crimeia, sob controle de Moscou desde 2014. Moscou havia dito que os termos africanos eram "muito difíceis de aplicar", e Putin não fez grande alarde ao receber o plano na semana passada.

Apelos por paz

Em sua intervenção nesta quinta, o presidente do Congo, Denis Sassou Nguesso, afirmou que a iniciativa africana "merece a maior atenção, não deve ser subestimada", fazendo um "apelo urgente pelo restauro da paz na Europa". O presidente do Senagal, Macky Sall, pediu uma "desescalada para ajudar a criar calma", enquanto o sul-africano Cyril Ramaphosa declarou esperar "negociações e engajamento construtivos".

Em resposta, o presidente russo disse estar "grato aos amigos africanos por sua atenção ao problema", mas voltou a culpar Kiev pela falta de negociações. Os russos recusam-se neste momento a negociar a devolução das regiões invadidas — além da Crimeia, reivindicam também Donestk e Luhansk, no Leste, além de Kherson e Zaporíjia, no sul.

Em fevereiro, Moscou afirmou também que "avaliava" a proposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de criar um clube da paz de países neutros no conflito capaz de se sentar com ambos lados e encontrar uma saída negociada. O assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, o ex-chanceler Celso Amorim, foi a Moscou e Kiev promover o plano, que o presidente com frequência promove em suas viagens ao exterior.

A capacidade brasileira de mediar a trégua, contudo, foi posta em xeque durante o desencontro de Lula e do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, durante a ida de ambos à cúpula do G7, na cidade japonesa de Hiroshima.

Em uma entrevista exclusiva à Globonews nesta semana, o chefe de Kiev disse que espera o apoio "concreto" do petista e enumerou formas que o governante brasileiro poderia contribuir com Kiev, incluindo a possível realização de um encontro entre ele e líderes da América Latina no Brasil. O Itamaraty afirmou que Zelensky é bem-vindo ao Brasil, assim como qualquer outro chefe de Estado.

Acordo de grãos

Mais tarde, em novo discurso no fechamento da cúpula, Putin disse que conversará, à noite, sobre a Ucrânia, com os aliados africanos "interessados". O presidente russo também acrescentou que os líderes de países africanos concordaram em promover, junto a Moscou, um "mundo multipolar" e combater o "neocolonialismo" e prometeu incrementar o uso de moedas nacionais nas transações comerciais com o continente africano.

— (Rússia e países africanos participantes concordaram em uma) determinação conjunta para combater o neocolonialismo, a prática de aplicar sanções ilegítimas e as tentativas de menosprezar os valores morais tradicionais — afirmou Putin.

A declaração final conjunta da cúpula prevê uma cooperação reforçada no fornecimento de alimentos, energia e ajuda ao desenvolvimento. O texto, publicado no site do Kremlin, defende o trabalho em prol de “uma ordem mundial multipolar mais justa, equilibrada e sustentável, que se oponha firmemente a todas as formas de confronto internacional no continente africano”. O documento também prevê que Moscou ajude os países africanos a "obter compensação pelos danos econômicos e humanitários causados ​​pelas políticas coloniais ocidentais", incluindo "a devolução de bens culturais" roubados.

Os países africanos têm sido particularmente críticos da decisão russa de abandonar o pacto de grãos mediado pela ONU e pela Turquia há um ano, decidindo não renová-lo na semana passada. O presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, fez um apelo para que os russos voltem ao acordo, afirmando ser "essencial haver consenso".

Putin aumentou drasticamente os bombardeios contra as cidades portuárias do sul da Ucrânia nos últimos dias, buscando inviabilizar sua infraestrutura de exportação. A Sisi, ele disse que o aumento do preço dos cereais é uma consequência das políticas ocidentais que fazem a guerra na Ucrânia se prolongar e repetiu que Moscou decidiu deixar o pacto porque as prometidas medidas para facilitar a logística da exportação dos grãos russos não foram cumpridas como desejava.

Segundo o Centro Internacional para o Desenvolvimento de Política Migratória, quase metade das nações importam mais de um terço do seu trigo dos russos e ucranianos. Em um ano, o pacto recém-esfacelado permitiu a exportação de quase 33 milhões de toneladas de cereais ucranianos, principalmente milho e trigo, ajudando a estabilizar os preços mundiais de alimentos e evitando o risco de desabastecimento e de inflação que assombrou o mundo e fez a inflação disparar nos meses iniciais da guerra.

Tanto Rússia quando Ucrânia figuram entre os maiores exportadores de cereais do planeta. Nos cinco anos antes de a guerra estourar, foram responsáveis, respectivamente, por 10% e 3% da produção de trigo do planeta, de acordo com dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Ambos também são importantes produtores de cevada, respondendo por 20% da produção global. Moscou é a terceira maior exportadora do planeta e Kiev, a quarta.

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