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Por Marina Gonçalves

Falta de garantias e transparência no órgão eleitoral, pouca ou nenhuma independência entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, inabilitação arbitrária de opositores — o último caso, nesta sexta-feira, de María Corina Machado, candidata com mais chances de derrotar Nicolás Maduro —, amplo uso de recursos do Estado na campanha eleitoral e acesso desigual dos candidatos aos meios de comunicação. Os dados, do último relatório da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia sobre as eleições venezuelanas de 2021, comprovam que não houve condições mínimas para realização do pleito, o último no país. Mesmo assim, na quinta-feira, ao ser questionado sobre o país vizinho, Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a "Venezuela tem mais eleições do que o Brasil": "O conceito de democracia é relativo para você e para mim", disse o presidente brasileiro.

— Chávez inflou o número de eleições. Mas é óbvio que não é o número de eleições que garante mais ou menos democracia — rebate Mariano Alba, venezuelano e assessor sênior do Crisis Group, em relação a afirmação de Lula. — Foi justamente o excesso de eleições durante seu governo que foi polarizando aos poucos a sociedade venezuelana. Hoje, o que a Venezuela necessita são condições eleitorais competitivas, onde os venezuelanos possam de fato decidir quem vai dirigir o país. E isso não existe fundamentalmente porque as condições eleitorais são muito deficientes.

O comentário de Lula sobre o alto número de eleições provavelmente se refere ao período de Hugo Chávez no poder, quando houve um excesso de pleitos no país, não necessariamente para cargos do Executivo. A mudança da Constituição, impulsionada por Chávez um ano após ser eleito, em 1999, levou a um processo constituinte semelhante ao que vive o Chile atualmente — apenas no processo foram três eleições, relembra Alba.

Após a aprovação da nova Carta Magna, Chávez realizou uma nova eleição presidencial, em 2000, menos de dois anos depois de tomar posse; e outra em 2004, quando também convocou um referendo. Depois, em 2007, houve uma nova consulta popular, onde o chavismo propôs uma nova Constituição, dessa vez não aprovada. Por último, ganhou, em 2012, a votação de uma emenda na Constituição, que passou a permitir a reeleição indefinida na Venezuela.

Laura Dib, diretora para a Venezuela do Escritório de Washington para a América Latina (Wola), ONG com sede nos Estados Unidos, cita mais de 30 processos eleitorais durante o chavismo. Mas ressalta que a mera existência de eleições não indica que haja ou não democracia em um país.

— Muitos líderes autoritários chegaram ao poder pelas urnas. Essa é uma tendência no mundo todo — afirma ela, lembrando que o pleito de 2021, quando foram escolhidos líderes locais, foi o primeiro em muitos anos a receber observadores internacionais. — Temos agora dois processos eleitorais pela frente, e é a oportunidade de democratização de todo o país. É urgente que a comunidade internacional pressione por condições mínimas para o pleito.

Problemas técnicos

Mas nos últimos meses o chavismo tem dado mostras de que não será uma briga fácil. Uma extensa lista de candidatos foi inabilitada nesta sexta-feira, incluindo, além de María Corina Machado, Henrique Capriles, que ficou em segundo lugar na disputa contra Maduro, em 2013, e o ex-deputado Juan Guaidó, que chegou a ser considerado presidente interino por mais de 50 países, incluindo o Brasil.

Além da perseguição a opositores, na semana passada o governo de Nicolás Maduro pressionou pela renúncia dos reitores chavistas do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), inviabilizando a tentativa da oposição de organizar primárias com a assessoria técnica do órgão eleitoral. Em 2020, a nomeação da nova direção do CNE, aparentemente equilibrada e razoável, foi comemorada com uma conquista política. Agora, com o processo de escolha de novos reitores em aberto, o órgão fica impedido tomar medidas para o pleito do ano que vem até que a nova reitoria tome posse, atrasando a divulgação de um cronograma eleitoral, não divulgado até agora.

À falta de acesso a informações sobre o calendário eleitoral, soma-se a desatualização do registro dos eleitores, principalmente dos 4,8 milhões de exilados que deixaram o país nos últimos anos e estão aptos a votar.

— Há hoje muitos obstáculos para que essas pessoas possam participar das eleições. A lei eleitoral estabelece que para votar, é preciso ter um status de residência legal em outro país, o que é um entrave para muitos dos exilados. Além disso, é preciso fazer um registro consular, mas muitos países, como os EUA, não têm relações diplomáticas com a Venezuela. No caso da Colômbia, por exemplo, que restabeleceu recentemente as relações, no único consulado venezuelano, em Cúcuta, não há esse serviço de registro eleitoral — enumera Dib.

Baixa participação

Apesar de o voto não ser obrigatório na Venezuela, a participação nas eleições é historicamente alta. Em 2013, por exemplo, Maduro derrotou Capriles com uma participação que beirava os 80%. A vitória foi por uma margem de 1,59 ponto percentual, ou 235 mil votos, muito mais apertada do que o esperado. Cinco anos depois, o pleito de 2018 foi marcado por denúncias de fraude, tentativa de boicote da oposição, e uma abstenção de 54% — além da falta de reconhecimento por grande parte da comunidade internacional.

— Hoje vemos instituições que não aguentam a pressão política do governo, que domina o sistema eleitoral e o tegervisa, para assegurar que se mantenha no poder — afirma David Smilde, especialista em Venezuela na Universidade de Tulane, em Nova Orleans. — É um um governo que controla todos os meios de comunicação, desqualifica a oposição e controla os reitores da órgão eleitoral. São princípios básicos de qualquer democracia. Lula deveria agradecer que as instituições eleitorais do Brasil tenham impedido os esforços de jair Bolsonaro e de sua coalizão para minar a eleição no ano passado. Se o STF tivesse decidido anular o pleito, não acho que Lula estaria dizendo que a democracia é um conceito relativo.

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