Além do surpreendente resultado obtido pelo presidenciável Sergio Massa, vencedor do primeiro turno nas eleições argentinas, o peronismo se impôs novamente como principal força no Congresso argentino, onde terá mais chances que seu adversário, o ultradireitista Javier Milei de formar uma maioria simples de 129 deputados, afirmam especialistas ouvidas pelo GLOBO.
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As eleições do último domingo renovaram metade, ou 130, das 257 cadeiras da Câmara dos Deputados, e um terço, ou seja 24, dos 72 assentos do Senado. Na Câmara, a União pela Pátria perdeu dez assentos — passou de 118 deputados para 108 na próxima legislatura. No Senado, a atuação foi um pouco melhor, e o peronismo aumentou o número de senadores, passando de 31 para 34. Com isso, fica bem pouco abaixo do quórum de 36 assentos para formar maioria simples.
Já o partido A Liberdade Avança, do ultraliberal Javier Milei, aumentou suas bancadas na Câmara, passando de três para 37 deputados; e no Senado, onde saiu de zero para oito cadeiras, tornando-se assim a terceira força no Parlamento argentino.
A coalizão de direita Juntos pela Mudança, de Patricia Bullrich e Mauricio Macri, foi a maior derrotada: passou dos 118 assentos na Câmara para 93, perdendo 25, e conseguiu apenas 24 das 33 cadeiras que tinha no Senado.
Até agora, as principais leis promovidas pela coligação do presidente Alberto Fernández, a Frente de Todos, contavam com o apoio de boa parte do Juntos pela Mudança, de Bullrich, mas as próximas movimentações em relação ao apoio ao segundo turno indicarão para que lado o pêndulo irá.
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Se todo o bloco decidir apoiar o Liberdade Avança, de Milei, as duas legendas poderiam se unir no Congresso e chegar a 131 cadeiras. O que não é provável, explica ao GLOBO Mireya Rodriguez, analista política e consultora internacional, lembrando que a coligação não é um bloco homogêneo, mas uma soma de partidos e movimentos, alguns mais afins ao peronismo, como a União Cívica Radical, outros menos:
— A unidade do Juntos pela Mudança não se viu refletida em votos na eleição presidencial, ou seja, não é uma soma de assentos linear, ainda mais no Congresso, onde os interesses de cada partido são ainda mais fragmentados — afirmou.
Yanina Welp, cientista política e pesquisadora associada no Albert Hirschman Centre on Democracy, em Genebra, e membro da Rede de Politólogas, concorda:
— É um Congresso que terá que negociar, em qualquer caso. Caso Massa ganhe no segundo turno, sua capacidade de governar requer negociações, mas é factível — pondera. — Já no caso de uma vitória de Milei, é muito, muito, muito pouco provável que ele consiga, ainda mais se mantiver uma agenda muito radical que se afasta muito dos outros partidos políticos. Haveria um choque entre o Congresso e a Presidência.
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Os dois candidatos que disputarão o segundo turno na eleição presidencial argentina, em 19 de novembro, têm o desafio de ampliar sua base de apoio, partindo, ambos, de um alto índice de rejeição. De acordo com pesquisa realizada em setembro pela Universidade de San Andrés, a rejeição a Milei, de ultradireita e que espanta eleitores com propostas como permitir a venda de órgãos e reduzir drasticamente o tamanho do Estado — podendo, nessa cruzada, eliminar programas de ajuda social —, atinge 53%.
Já o peronista deve convencer os argentinos de que ser o ministro da Economia num país mergulhado numa crise dramática não significa que não possa ser o presidente que resolva essa mesma crise.
Para vencer, Massa focou em dois setores específicos da sociedade: mulheres e moradores de grandes cidades. O candidato peronista atacou seu adversário com uma campanha do medo que captou a atenção de milhares de argentinos, e instalou a ideia, entre muitos, de que Milei representa uma ameaça para a sobrevivência dos mais humildes, e, também, para a democracia. A jogada foi clara, explicou um dos estrategistas do candidato: se você não pode melhorar sua aprovação, aumente o rechaço a seu adversário.
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