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Por — Buenos Aires

Como era esperado, a candidata que ficou em terceiro lugar no primeiro turno da eleição presidencial argentina, Patricia Bullrich, declarou apoio ao candidato da direita radical Javier Milei nesta quarta-feira (25), numa coletiva ao lado de seu ex-companheiro de chapa, Luis Petri. Após intensas negociações e debate interno na aliança opositora Juntos pela Mudança, que incluiu reuniões com o próprio Milei e com o ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), uma parte das lideranças políticas da centro-direita argentina chegou a um acordo para formar uma frente antikirchnerista contra o candidato do governo, o peronista Sergio Massa — que se recusa a ser considerado kirchnerista. Outros setores se opuseram ao pacto liderado por Macri e Milei — que têm diálogo fluido há muito tempo —, o que provocou, na prática, o racha da aliança opositora.

Segundo analistas ouvidos pelo GLOBO, a Juntos pela Mudança se dividiu entre uma ala de direita, chamada internamente da ala dos falcões, agora unida por um pacto eleitoral com o partido de Milei, A Liberdade Avança, e uma ala de centro, o setor dos “pombos”, que deverá decidir se apoia abertamente a candidatura de Massa, ou optar por uma posição independente. O líder dos "pombos" da oposição argentina é o prefeito de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta, que foi derrotado por Bullrich nas primárias da aliança opositora para definir quem seria seu candidato presidencial.

— Estamos assistindo à demolição controlada do sistema de partidos argentino, tal como o conhecemos há 20 anos — explica Patricio Talavera, professor da Universidade Nacional de Buenos Aires (UBA).

Para o professor, “as coalizões que o país tinha até agora não refletem mais as tendências do eleitorado”. O apoio a Milei não foi fácil de aceitar para Bullrich, que apareceu em todos os canais de TV do país visivelmente abalada pela derrota de domingo, e pela rua sem saída na qual essa derrota a colocou. Fontes próximas à ex-ministra reconheceram que a agora ex-candidata teve de ser convencida sobre os custos para a direita tradicional de manter-se neutra na disputa entre Milei e Massa.

— Com Javier Milei, temos diferenças. Por isso competimos, não as ocultamos. No entanto, nos encontramos diante do dilema da mudança ou continuidade mafiosa para a Argentina e terminar com a vergonha do presente. A maioria dos argentinos elegeu uma mudança. Nós representamos parte dessa mudança. Temos a obrigação de não sermos neutros. — disse Bullrich a jornalistas reunidos em Buenos Aires. — Como dizia San Martín, quando a Pátria está em perigo, tudo é permitido, a não ser não defendê-la.

Domingo passado, Bullrich obteve 23,83% dos votos, um resultado magro para a aliança que venceu as presidenciais de 2015 e que, até o crescimento vertiginoso de Milei, era considerada a grande favorita para as presidenciais deste ano. O respaldo da ex-candidata a Milei, apontam analistas, vai dar impulso à campanha do candidato da direita radical, mas ainda não está claro quanto esse impulso lhe permitirá crescer e tornar-se mais competitivo na disputa com o peronismo.

— Alguns eleitores tradicionais da Juntos pela Mudança já deixaram de votar em Bullrich no primeiro turno. Uma parte dos 23% conseguidos pela ex-candidata obviamente vai optar por Milei no segundo turno, acho que a magnitude da migração de votos dependerá no nível de antiperonismo que cada pessoa tiver no sangue — afirma Diego Reynoso, pesquisador e professor da Universidade de San Andrés.

Patricia Bullrich anunciou acordo ao lado de Luis Petri, vice em sua chapa à Presidência — Foto: Tomas Cuesta/AFP
Patricia Bullrich anunciou acordo ao lado de Luis Petri, vice em sua chapa à Presidência — Foto: Tomas Cuesta/AFP

Ele explica:

— Se um eleitor de Bullrich tiver mais de 50% de antiperonismo no sangue, provavelmente vai migrar para Milei. Agora, se for um eleitor mais moderado e não antiperonista, poderá votar em branco ou em Massa —.

Javier Milei reagiu à declaração de apoio com uma publicação nas redes sociais. O ultraliberal, apelidado por apoiadores de "leão", postou na rede X (antigo Twitter) um desenho de um leão abraçando um pato (apelido de Bullrich) usando uma bandeira da Argentina como cachecol.

O pilar do acordo entre Bullrich (fortemente pressionada por Macri) e Milei foi a batalha contra o kirchnerismo.

— O kirchnerismo é um limite, e dar liberdade de ação não seria apropriado — alertou ontem Federico Angelini, homem de confiança de Macri e que assumiu o comando do partido Proposta Republicana (Pro, fundado pelo ex-presidente e até a campanha presidido por Bullrich).

No anuncio desta quarta, Bullrich falou mais contra o kirchnerismo do que o a favor de Milei. Antes mesmo de mencionar o ultraliberal, a ex-candidata reafirmou suas tendências liberais antes de começar a atacar Sergio Massa e seus apoiadores peronistas.

— Ratificamos nossa defesa dos valores da mudança e da liberdade. A urgência do momento nos interpela a não sermos neutros frente ao perigo da continuidade do kirchnerismo por meio de Sergio Massa — disse aos jornalistas. — Faz 20 anos que Cristina Fernández Kirchner, Alberto Fernández, Sergio Massa e muitos outros nos jogam nesta decadência. A Argentina não pode reiniciar um novo ciclo kirchnerista liderado por Sergio Massa. Isso implicaria, para o nosso país e nosso povo, uma nova etapa histórica sob o domínio de um populismo corrupto que condenaria a Argentina a uma decadência final e significaria a continuidade do pior governo da história.

Eleições na Argentina:

A decisão de Bullrich instalou duas incógnitas no país: quanto poderá crescer Milei na disputa com Massa, e como será a evolução do processo de dissolução da Juntos pela Mudança.

Os aliados do Pro, a tradicional União Cívica Radical (UCR) e a Coalizão Cívica, já deixaram claro que não declararão apoio a nenhum dos dois candidatos presidenciais. Para a UCR, partido que elegeu o primeiro presidente por voto universal e obrigatório no país, em 1916 (o líder histórico radical Hipólito Yrigoyen), é simplesmente inadmissível apoiar Milei. O candidato da direita radical disse em reiteradas oportunidades que o governo de outro radical, Raúl Alfonsín (1983-1989), primeiro após a última ditadura militar, foi um dos piores da História da Argentina.

Nesta quarta, o partido de Yrigoyen e Alfonsín divulgou uma carta aos argentinos na qual afirma que não apoiará nenhum dos dois candidatos à Presidência. No documento, a UCR diz que "os argentinos colocaram nossa coalizão num lugar de oposição, e é isso o que vamos fazer”. Em outro trecho da carta, o partido diz que “Sergio Massa é tão responsável como o presidente Alberto Fernández e Cristina Fernández de Kirchner pelo estado do país, seu empobrecimento, o processo inflacionário, a corrupção, o deterioro social e econômico da Argentina… o extremismo demagógico de Javier Milei está nas antípodas de nosso pensamento”.

A crise, contudo, não deve ficar restrita à aliança opositora de centro-direita. Assim que as primeiras notícias sobre o acordo surgiram, deputados eleitos pelo partido de Milei, o Liberdade Avança, afirmaram que deixariam a sigla e criariam um novo bloco no Congresso, apontando uma "traição" do candidato à Presidência, ao se aliar com alguns dos alvos de suas críticas até pouco tempo.

Negociação pela madrugada

Fontes próximas aos candidatos afirmaram à imprensa argentina que Milei foi até a casa de Macri em Acassuso, na Grande Buenos Aires, onde o esperavam o ex-presidente e Bullrich. O motivo da reunião seria "resolver as diferenças". Antes da campanha, Milei chamou Macri de “repugnante”, e disse que Bullrich tinha "sangue nas mãos”, por seu passado, segundo afirmam várias fontes mas a ex-candidata nega, como integrante da guerrilha peronista Montoneros. A rixa sempre foi maior com Bullrich, e isso explica porque foi Macri quem negociou o acordo da última terça-feira. O ex-presidente sempre flertou com Milei, atitude que incomodava profundamente a ex-candidata.

Após o primeiro turno, as coisas mudaram radicalmente. O candidato da direita radical deixou de atacar toda a “casta política”, e passou a disparar sua munição apenas contra o kirchnerisno, tentando reconstruir pontes com aliados sem os quais não teria chances de ganhar a eleição.

— Tenho um relacionamento muito bom com o engenheiro Macri e estou disposto a ouvi-lo porque sua experiência é muito valiosa — disse Milei na segunda-feira, admitindo que poderia adicionar Bullrich a um eventual gabinete. — Como posso não incorporá-la? Ela teve sucesso no combate à insegurança.

Uma reunião a sós com Bullrich foi necessária para deixar as impressões da campanha no passado, disseram fontes de ambos os lados. A ex-candidata, acrescentaram as fontes, exigiu um pedido de desculpas, e Milei, sem muita alternativa, cedeu.

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