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Por — São Paulo

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, foi enfático ao se pronunciar sobre a vitória do "Sim" no referendo sobre a incorporação do território do Essequibo à Venezuela, realizado no domingo. Maduro afirmou (e reafirmou) que, apesar de consultivo, o resultado da votação tinha caráter "vinculante" — palavra repetida quase que uma dezena de vezes em sequência pelo presidente durante o discurso oficial ao lado de autoridades eleitorais e militares, nesta segunda-feira —, o que obrigaria o governo a tomar ações para que cada termo votado seja devidamente efetivado.

— A decisão que vocês tomaram dá um impulso vital muito poderoso. Agora sim vamos recuperar os direitos históricos da Venezuela na Guiana Esequiba, agora sim vamos fazer justiça, agora sim vamos reivindicá-la com a força de todos — disse o o presidente num evento nesta segunda-feira, ao lado de autoridades do Conselho Nacional Eleitoral (CNE).

O foco na obrigação do governo de efetivar as medidas votadas, dentre as quais a incorporação do território que hoje faz parte da Guiana e a criação do estado da Guiana Essequiba, entregando a nacionalidade venezuelana aos cidadãos da região, não se estendeu, no entanto, ao modus operandi, levantando dúvidas sobre se os próximos passos de Caracas incluiriam uma ação militar, uma nova frente de negociação ou mesmo não passaria de um blefe.

— A ênfase que Maduro deu ao caráter vinculante indica que todas as propostas expressas no referendo avançarão. Julgo que as medidas serão de caráter progressivo, porque implicam medidas jurídico-políticas e de segurança e defesa nacional — disse ao GLOBO a advogada venezuelana Rocío San Miguel, presidente do Observatório Venezuelano para a Segurança e Defesa Nacional (Ovesede).

As medidas progressivas, explicou a analista, incluiriam a uma série de questões que o governo venezuelano precisará solucionar antes de ter, de fato, o controle sobre o território, desde a designação de um governador para a região, passando pela definição das autoridades responsáveis por sua defesa, até a divisão territorial do novo estado que será criado.

Em uma análise logo após o pronunciamento de Maduro, a advogada afirmou que não está claro como o país passará a abordar o caso na Corte Internacional de Justiça (CIJ), onde Guiana e Venezuela disputam a soberania do território no campo legal — uma das perguntas aprovadas no plebiscito era sobre não reconhecer o tribunal internacional como competente para julgar o caso. Ela também esboçou dúvida sobre como Caracas reagirá a medidas administrativas e acordos comercias autorizados previamente por Georgetown.

Território do Essequibo — Foto: Editoria de Arte
Território do Essequibo — Foto: Editoria de Arte

"Fica por saber que medidas assumirá o Estado venezuelano para se opor às concessões unilaterais que a Guiana entregou a companhias internacionais nos espaços marítimos por delimitar. Se apenas se referirá a medidas diplomáticas ou também incluirá medidas militares destinadas a impedir a presença de empresas petroleiras internacionais", escreveu.

Embora a Venezuela conteste a soberania sobre o território quando ele ainda fazia parte da colônia britânica na América do Sul, a escalada de interesse de Caracas sobre a região aumentou, sobretudo, com a descoberta de grandes reservas de petróleo na região. Para Erik del Bufalo, professor da Universidade Simón Bolívar, o fator foi a principal razão externa para a realização do referendo.

— Como política externa, o objetivo era simplesmente mostrar à ExxonMobil, que tem negócios com a Guiana, que a Venezuela está presente, mas sem tomar uma medida mais contundente, digamos, nem civil, nem militar, nem legal, para assumir que aquela região faz parte do território venezuelano — disse o professor.

Maduro cumprimenta presidente do Conselho Eleitoral da Venezuela, Elvis Amoroso — Foto: Federico Parra/AFP
Maduro cumprimenta presidente do Conselho Eleitoral da Venezuela, Elvis Amoroso — Foto: Federico Parra/AFP

A ideia de um conflito bélico na América do Sul mexeu com a região, que tem um histórico muito mais longo de problemas de segurança interna do que de embate entre países, desde o fim do período colonial. Uma escalada militar no momento atual divide os especialistas.

Rocío afirma que a possibilidade de um conflito nunca pode ser descartada. Para Del Bufalo, crítico do chavismo, o cenário mais provável é de que Maduro use o incidente politicamente, embora também não descarte algum grau de violência.

— O chavismo geralmente faz mais barulho do que outra coisa. Não sei se além do jogo de cena vai haver realmente um conflito com a Guiana, não acredito que vão fazer nada que fragilize sua lógica de se manter no poder. Dito isso, não posso descartar nada, porque com este governo, nunca se sabe. Poderia haver algumas escaramuças militares, mas não é algo que eu veja indícios claros no momento — afirmou.

Impacto político

Luis Vicente León, economista e analista eleitoral venezuelano, indica que Maduro está mais interessado em utilizar o referendo e a soberania sobre Essequibo de forma política, tentando criar uma unidade em torno da defesa do território nacional.

— Maduro está muito mais interessado no impacto político desta ação do que em resolver realmente o tema do Essequibo, que é bastante complicado. Eu diria que vamos ver um Maduro que pode discutir, falar da criação do estado da Guiana Essequiba e ameaçar com a declaração de um estado de emergência, se considerar que o convém, incluindo no caso de pensar que corre risco nas eleições.

Para Regiane Bressan, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), uma escalada é motivo de preocupação na região, mesmo sem nenhuma declaração expressa de que o conflito chegue a esse ponto.

— As fontes oficiais não falam ainda em movimentação militar, mas se supõe que isso pode ser feito. O Brasil fez mobilizações de tropa na semana passada para a tríplice fronteira — disse a professora, relembrando o envio de soldados brasileiros para Pacaraima.

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