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Começou a circular em redes sociais no fim de semana um vídeo mostrando o que seria uma rendição de supostos combatentes do Hamas em Gaza, o segundo do tipo em menos de uma semana. Ao mesmo tempo em que as imagens, teoricamente feitas sem o aval das autoridades israelenses, servem para dar corpo a um discurso de que a guerra estaria sendo vencida por Israel, levantam questões sobre a legalidade e a moralidade de sua divulgação.

Vídeo mostra suposta rendição de combatentes do Hamas

Vídeo mostra suposta rendição de combatentes do Hamas

No vídeo, um grupo de homens vestidos apenas com roupas de baixo está com as mãos para o alto em uma calçada, ao lado de um tanque israelense. Alguns mostram seus cartões de identificação, até que um soldado faz um sinal para que um homem com um fuzil desmontado se aproxime lentamente. Em uma das mãos ele traz o carregador da arma, e é orientado a deixar o equipamento em uma calçada, onde também há uma grande quantidade de lixo. O homem posteriormente retorna ao grupo, depois de nova ordem do militar israelense. De acordo com a BBC, as imagens foram feitas perto de uma escola das Nações Unidas em Beit Lahia, no norte da Faixa de Gaza.

Não há informações sobre quem seriam os homens sob a mira das armas israelenses, tampouco se foram presos posteriormente.

Apesar de os vídeos sobre supostas rendições do Hamas não serem divulgados por canais oficiais, mas sim por vazamentos, eles servem para reforçar discursos de autoridades civis e militares sobre o estado da guerra na Faixa de Gaza, que chegou nesta segunda-feira ao seu 66º dia.

— Vejo avanços todos os dias. Vemos a cada dia mais e mais terroristas mortos, mais e mais terroristas feridos, e nos últimos dias vemos terroristas se rendendo, um sinal de desintegração do sistema, um sinal de que temos de usar mais força — disse o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas israelenses, Herzi Halevi, em uma cerimônia religiosa no fim de semana, citado pelo Times of Israel.

No domingo, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, usou indiretamente as imagens para turbinar a narrativa de que suas tropas estão vencendo.

— Nos últimos dias, dezenas de terroristas do Hamas renderam-se às nossas forças. Eles depõem as armas e se rendem aos nossos heróicos guerreiros. Levará mais tempo, a guerra está em pleno andamento, mas este é o começo do fim para o Hamas — disse Netanyahu em discurso. — Digo aos terroristas do Hamas: acabou. Não morra por [Yahya] Sinwar [líder do Hamas]. Renda-se, agora.

O porta-voz do Exército, Daniel Hagari, confirmou que o vídeo é legítimo e que a situação para os combatentes do Hamas "é difícil", e que a liderança do grupo "nega a realidade" na Faixa de Gaza.

— [Há um] sentimento amplo de que a liderança do Hamas, que hoje está nos túneis, não liga para o público em Gaza que está em cima da terra — disse Hagari em entrevista coletiva.

O Hamas, em comunicado, negou que seus combatentes estejam se rendendo e alegou que as pessoas que aparecem nas fotos e vídeos "são civis inocentes que foram presos e depois tiveram armas colocadas perto deles".

Punição coletiva

Mas até que ponto as imagens dos últimos dias são uma prova de que o grupo palestino está enfraquecido a ponto de ver combatentes abandonando as armas por desespero? Indicações da própria inteligência israelense, publicadas pelo Haaretz no domingo, afirmam que apenas de 10% a 15% dos homens que aparecem detidos nos vídeos e fotos são, de fato, do Hamas. A inteligência tampouco aponta que haja sinais claros de que unidades inteiras estariam abandonando o combate.

Por outro lado, há aquele que é um dos, senão o mais, importante objetivo da divulgação de imagens de prisioneiros de guerra: causar um impacto psicológico. Ver dezenas de homens rendidos ajuda no discurso de que a guerra está sendo vencida, e que o inimigo, no caso, o Hamas, está se desmantelando a olhos vistos. Uma retórica reforçada pelas fotos de bandeiras israelenses fincadas em ruas e prédios destruídos no enclave.

Veículo com a bandeira israelense circula na parte Norte da Faixa de Gaza — Foto: Jack Guez / AFP
Veículo com a bandeira israelense circula na parte Norte da Faixa de Gaza — Foto: Jack Guez / AFP

Pelo lado de Gaza, as rendições poderiam incentivar combatentes a abandonar as armas para evitar a prisão ou a morte em combate, muito embora seu efeito na imprensa palestina tenha sido o contrário: o de mostrar que Israel, ao expor pessoas que não são do Hamas sendo presas, confirma que o objetivo da guerra é a aplicação de uma punição coletiva, contra toda a população civil, não apenas contra o grupo terrorista.

Convenções de Genebra

Apresentar prisioneiros de guerra nas redes sociais, embora seja um fenômeno novo, não é exclusivo do conflito em Gaza. Desde o início da invasão russa da Ucrânia, imagens de combatentes detidos dois dois lados inundam redes sociais, como o Telegram. Vídeos de execuções, pedidos de ajuda e abandono da cidadania levaram até a pedidos de investigação por parte do Tribunal Penal Internacional.

Em artigo publicado em junho do ano passado, Ramin Mahnad, conselheiro legal da Cruz Vermelha Internacional, cita a Terceira Convenção de Genebra (1947), que trata dos prisioneiros em conflitos armados. O texto detalha que eles devem ser tratados de forma humana e digna, protegidos de "atos de violência, intimidação, insultos e curiosidade pública", e a violação desses princípios pode corresponder a um crime de guerra.

Para Mahnad, embora a divulgação de vídeos não esteja explicitamente prevista na Convenção, a ideia da "curiosidade pública" abrange a "divulgação de imagens de prisioneiros de guerra, gravações de interrogatórios e conversas privadas, correspondência privada e outros dados".

"Mesmo se os prisioneiros de guerra quiserem dar declarações públicas ou participar voluntariamente de gravações de imagens, a divulgação ao público continua ilegal. Qualquer decisão de um prisioneiro de guerra é feita em circunstâncias nas quais seu bem-estar depende totalmente da força inimiga", escreveu Mahnad. "Imagens de prisioneiros em situações humilhantes ou degradantes não podem ser transmitidas ou publicadas, a menos que haja um grande interesse público em fazê-lo (como para trazer violações graves da lei humanitária internacional à atenção pública), e as imagens não podem revelar as identidades dos indivíduos."

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