Israel rebateu, nesta sexta-feira, as acusações feitas pela África do Sul, na Corte Internacional de Justiça (CIJ), em Haia, sobre supostas violações da Convenção das Nações Unidas sobre Genocídio pelo Estado judeu, durante a operação militar em Gaza. A defesa israelense negou qualquer tentativa deliberada de destruição do povo palestino, exibiu imagens da violência cometida pelo Hamas durante os ataques de 7 de outubro a Israel e acusou a equipe sul-africana de apresentar uma visão "totalmente distorcida" e manipuladora dos fatos na região.
— O conjunto dos argumentos [sul-africanos] se baseia em uma descrição da realidade das hostilidades atuais deliberadamente organizada, descontextualizada e manipuladora — afirmou Tal Becker, um dos juristas que representam Israel perante o tribunal internacional. — O que Israel busca operando em Gaza não é destruir um povo, senão proteger um povo, o seu, atacado em múltiplas frentes.
A equipe jurídica israelense apresentou vídeos e fotos dos ataques de 7 de outubro — considerado o pior atentado terrorista da História do país desde sua fundação, em 1948, com 1.200 mortes e cerca de 240 reféns levados para Gaza — para demonstrar a tese que autoridades israelenses vêm defendendo desde o começo do conflito: que a ação de Israel é uma reação contra a agressão do Hamas e tem caráter defensivo, por ser direcionada a uma ameaça ativa no limite de suas fronteiras.
— Torturaram crianças na frente dos pais... pais na frente dos filhos. Queimaram pessoas... sistematicamente estupradas e mutiladas — comentou Becker sobre as imagens.
A defesa israelense também tentou diferenciar os impactos sobre os civis causados por sua ofensiva em Gaza — novamente, acusou o Hamas de usar os palestinos como escudos humanos e reafirmou que o alvo da operação são os terroristas — e o crime de genocídio, tipificado no ordenamento internacional pela convenção de 1948.
— Como este tribunal já deixou claro, a convenção sobre o genocídio não foi concebida para abordar o impacto brutal das hostilidades intensas sobre a população civil, mesmo quando o uso da força levanta "questões muito sérias de direito internacional e envolve enorme sofrimento e contínua perda de vidas" — disse Becker, mencionando parte da acusação sul-africana. — A convenção foi criada para tratar de um crime malévolo da mais excepcional gravidade.
Acusação de genocídio
No tribunal de Haia, um dia antes, foi apresentada a acusação sustentada pela África do Sul, de que a ação de Israel em Gaza é movida por uma "intenção genocida" contra a população palestina. Na abertura dos trabalhos, juristas sul-africanos citaram declarações públicas de autoridades israelenses, como do ministro da Defesa, Yoav Gallant, e do premier Benjamin Netanyahu que demonstrariam uma ação abrangente contra o povo palestino.
— Qual Estado admitiria uma intenção genocida? No entanto, a característica distintiva deste caso não foi o silêncio como tal, mas a reiteração e repetição do discurso genocida em todas as esferas do Estado em Israel — afirmou um dos advogados sul-africanos na quinta-feira.
Pretória fez várias exigências em sua ação: que os juízes obriguem Israel a parar "imediatamente" as operações militares israelenses em e contra Gaza; a garantia de que os militares israelenses (ou quaisquer forças relacionadas ao país) parem as operações ofensivas; o fim do assassinato e deslocamento do povo palestino; a normalização do acesso a alimentos, água, infraestrutura e saúde; e que Israel tome "todas as medidas razoáveis ao seu alcance" para prevenir um genocídio.
A denúncia provocou a ira de autoridades de Israel. Ainda na quinta-feira, porta-vozes israelenses denunciaram a "hipocrisia" sul-africana em denunciar o país por um crime que está intimamente ligado à História do povo judeu no Holocausto.
— O Estado de Israel é acusado de genocídio num momento em que luta contra o genocídio — disse o primeiro-ministro israelenese, Benjamin Netanyahu, antes das audiências. — Uma organização terrorista cometeu o pior crime contra o povo judeu desde o Holocausto, e agora alguém vem defendê-la em nome do Holocausto? Que atrevimento. O mundo está de cabeça para baixo.
Nos Estados Unidos, principal aliado israelense no cenário internacional, o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, disse que o caso sul-africano era “infundado”.
Israel 'ultrapassou os limites', diz Pretória
O país africano condenou “inequivocamente” os ataques do Hamas que desencadearam a guerra em Gaza, mas membros da equipe legal formada por advogados e acadêmicos destacaram que o grupo terrorista palestino não é um Estado, estando sujeito a regras diferentes. Também afirmaram que a escala da resposta não era justificável.
O Ministro da Justiça sul-africano, Ronald Lamola, disse ao tribunal na quinta-feira que Israel "ultrapassou os limites" e violou a convenção.
O Congresso Nacional Africano (ANC), que está no poder, há muito é apoiador da causa palestina, muitas vezes ligando-a à sua própria luta contra o governo do apartheid de minoria branca, que tinha relações de cooperação com Israel. Foi do ícone anti-apartheid Nelson Mandela a famosa frase de que a liberdade da África do Sul seria “incompleta sem a liberdade dos palestinos”.
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