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Por O Globo e agências internacionais

O Conselho de Segurança da ONU aprovou, nesta segunda-feira, uma proposta de resolução para o conflito entre Israel e Hamas na Faixa de Gaza que menciona explicitamente a exigência de um cessar-fogo imediato na região. A aprovação, possível apenas pela abstenção dos Estados Unidos, ocorre quase seis meses após o início do conflito, depois de uma série de tentativas anteriores serem barradas — a última delas há três dias, quando uma proposta dos americana foi vetada por Rússia e China por não exigir o cessar-fogo em termos decisivos, segundo os países. Autoridades israelenses criticaram a decisão, e sinalizaram que podem não cumprir a determinação do Conselho.

A resolução desta segunda-feira foi adotada com 14 votos a favor, nenhum contra e a abstenção dos EUA. O texto "exige um cessar-fogo imediato para o mês do Ramadã", período sagrado dentro do Islamismo que se estende até o dia 9 de abril, e que este período leve a uma trégua duradoura. Também "exige a libertação imediata e incondicional de todos os reféns".

"A resolução de hoje (segunda-feira) dá ao Hamas esperança de que a pressão internacional forçará Israel a aceitar um cessar-fogo sem a libertação dos nossos reféns, prejudicando assim tanto o esforço de guerra como o esforço para libertar os reféns", afirma comunicado emitido pelo escritório do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, o qual destina alguns ataques pesados aos EUA. "Lamentavelmente, os Estados Unidos não vetaram a nova resolução, que apela a um cessar-fogo que não depende da libertação de reféns. Isto constitui um claro afastamento da posição consistente dos EUA no Conselho de Segurança desde o início da guerra."

O ministro das Relações Exteriores israelense, Israel Katz, afirmou que "o Estado de Israel não suspenderá a guerra" em uma publicação no X (antigo Twitter), afirmando que as tropas continuarão a lutar "até que o último dos reféns volte para casa". Em visita a Washington, o ministro da Defesa, Yoav Gallant, afirmou que o governo não tem "o direito moral de parar a guerra" enquanto ainda houver algum refém em Gaza.

— É muito danoso aos esforços [de libertação dos reféns] porque dá aos terroristas do Hamas a esperança de conseguir um cessar-fogo sem o retorno dos capturados. Todos os membros do Conselho deveriam ter votado contra essa resolução vergonhosa — afirmou o embaixador israelense na ONU, Gilad Erdan. — A resolução diz que capturar civis viola a lei internacional. Mas, por outro lado, apesar do fato de saberem que o Hamas não escutará seus chamados e libertar os reféns, vocês exigem um cessar-fogo. Parem por um instante e pensem nessa contradição moral.

Os integrantes mais radicais do Gabinete de Netanyahu defenderam que o país ignore a resolução e também ignore possíveis reprimendas e retaliações vindas de Washington.

— Nossa relação com os EUA sempre foi de parceria, mas não de patronagem. Essa não é a primeira vez em que um governo israelense se vê obrigado a tomar decisões contrárias à do governo dos EUA — disse ao Canal 7 o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich. O ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, ligado aos colonos na Cisjordânia, disse que a ONU é "uma terra arrasada".

O Hamas saudou a resolução aprovada e disse que estava pronto para negociar a libertação de reféns em troca de prisioneiros palestinos. Em um comunicado, o grupo disse ter "disponibilidade" para se envolver "em um processo imediato de troca de prisioneiros que conduza à libertação de prisioneiros em ambos os lados". Israel, em contrapartida, afirmou que não encerrará a guerra até que os reféns sejam libertados.

O texto aprovado foi apresentado pelos 10 membros não permanentes do Conselho. A negociação para a redação final foi descrita como intensa "até ao último minuto". Os EUA pediram uma mudança para trocar o termo “cessar-fogo permanente” por “cessar-fogo duradouro” — linguagem que, segundo diplomatas, deixaria espaço para Israel se defender — e apelou a ambos os lados para criarem condições onde a paralisação dos combates pudesse ser sustentada. Uma proposta de emenda russa, que dizia que o cessar-fogo imediato deveria levar a um cessar-fogo “permanente”, foi rejeitada.

— Certas edições importantes foram ignoradas, incluindo nosso pedido para adicionar uma condenação ao Hamas. Não concordamos sobre tudo o que consta da resolução. Por esse motivo, não pudemos votar “sim”. Mas apoiamos plenamente alguns dos objetivos críticos desta resolução não vinculativa e acreditamos que era importante que o conselho se manifestasse e deixasse claro que qualquer cessar-fogo deve vir acompanhado da libertação dos reféns — afirmou a embaixadora americana na ONU, Linda Thomas-Greenfield, após a aprovação, acrescentando que "o único caminho" para garantir o começo do cessar-fogo seria "a liberação do primeiro refém".

Conselho de Segurança da ONU reunido na última nesta sexta-feira — Foto: Angela Weiss/AFP
Conselho de Segurança da ONU reunido na última nesta sexta-feira — Foto: Angela Weiss/AFP

As resoluções do Conselho de Segurança são juridicamente vinculantes e, embora o Conselho não tenha meios de fazer cumprir a resolução, pode impor medidas punitivas adicionais a Israel, incluindo sanções. Embora a embaixadora americana e o Departamento de Estado tenham apontado que o texto não é vinculante, essa interpretação foi questionada pelo representante da Palestina na ONU.

— Nós vamos à Assembleia Geral, eles nos dizem que [as resoluções] não são aplicáveis ou vinculantes. Vamos ao Conselho de Segurança, eles dizem que não são vinculantes. Não acreditamos nisso. As resoluções do Conselho de Segurança são vinculantes e se Israel não as implementar, então será dever do Conselho usar o Capítulo 7 [da Carta da ONU] para aplicar as medidas punitivas e fazer com que obedeçam a resolução — disse o embaixador palestino, Riyad Mansour.

No ano passado, a Assembleia Geral da ONU aprovou mais de uma resolução pedindo um cessar-fogo, mas as decisões do órgão, onde cada voto dos países tem o mesmo peso, não são vinculantes. O secretário-geral da ONU, António Guterres, que viajou no fim de semana ao Egito e esteve na fronteira com Gaza, afirmou que a resolução deveria ser implementada imediatamente.

"O Conselho de Segurança acaba de aprovar uma resolução há muito esperada sobre Gaza, exigindo um cessar-fogo imediato e a libertação imediata e incondicional de todos os reféns. Esta resolução deve ser implementada. O fracasso seria imperdoável", escreveu Guterres em sua conta no X (antigo Twitter

A França pediu uma trégua permanente após o Ramadã.

— Esta crise não acabou. O Conselho terá que permanecer mobilizado e voltar ao trabalho imediatamente. Quando o Ramadã terminar, dentro de duas semanas, terá de ser estabelecido um cessar-fogo permanente — disse o embaixador francês na ONU, Nicolas de Riviere

Incidente entre aliados

A primeira medida a exigir abertamente o fim das hostilidades chega em um momento particularmente delicado da ofensiva israelense em Gaza. O premier de Israel, Benjamin Netanyahu, autorizou que a atividade militar se expandisse para Rafah — último reduto para quase 1,5 milhão de palestinos deslocados pelo conflito — provocando temor de uma catástrofe humanitária.

Enquanto a operação não se materializa, soldados israelenses lutam nos arredores de ao menos dois hospitais na Faixa de Gaza, incluindo o al-Shifa, o maior do enclave, onde operam desde a semana passada. O segundo cerco a uma unidade hospitalar está armado no hospital al-Amal, em Khan Yunis. Israel diz que homens do Hamas e da Jihad Islâmica se reagruparam nestes locais e que atuam com nível de "precisão", mas as agências humanitárias alertaram sobre os riscos de civis encurralados e ao pessoal médico.

Israel divulga vídeo sobre operação no hospital Al-Shifa, em Gaza

Israel divulga vídeo sobre operação no hospital Al-Shifa, em Gaza

A abstenção americana repercutiu mal entre a cúpula do governo israelense. O gabinete de Netanyahu cancelou a visita de uma delegação que seria chefiada pelo ministro dos Assuntos Estratégicos de Israel, Ron Dermer, e do Conselheiro de Segurança Nacional, Tzachi Hanegbi, à Cada Branca, nesta segunda. Um comunicado do gabinete do premier, divulgado pela agência estatal israelense Kann, diz que "os EUA recuaram da sua posição consistente no Conselho de Segurança que ligava um cessar-fogo à libertação dos reféns" e que "prejudica o esforço de guerra, bem como o esforço para libertar os reféns".

A Casa Branca se disse "muito decepcionada" com o cancelamento da visita, planejada previamente e que discutiria preocupações sobre uma possível ofensiva no sul de Gaza. O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, disse que o encontro seria uma conversa longa sobre "alternativas viáveis" para a operação em Gaza.

Joe Biden foi recebido por Benjamin Netanyahu em Tel Aviv pouco após o início da guerra — Foto: Brendan SMIALOWSKI / AFP
Joe Biden foi recebido por Benjamin Netanyahu em Tel Aviv pouco após o início da guerra — Foto: Brendan SMIALOWSKI / AFP

Ao longo da guerra, os EUA vetaram quatro projetos de resolução que pretendiam alcançar um cessar-fogo imediato. Em dois dos últimos textos, que apresentavam entre as demandas o cessar-fogo e a liberação imediata dos reféns, o país foi o único a votar contra — pelas regras do Conselho de Segurança da ONU, os membros-permanentes têm poder de veto.

Por este motivo, o mundo reagiu com surpresa quando o secretário de Estado americano, Antony Blinken, anunciar, na semana passada, que o país iria propor um projeto de resolução que pediria o cessar-fogo imediato vinculado à soltura dos reféns. O texto foi à votação, mas derrubado por Rússia e China, que disseram que o texto não colocava de forma clara as exigências e daria margem à interpretações que poderiam justificar a invasão de Rafah por Israel.

Pouco depois da aprovação da proposta apresentada nesta segunda-feira, Kirby afirmou que a abstenção na votação não sinalizava uma mudança na política de Washington. De acordo com o porta-voz, os EUA apoiam um cessar-fogo, e se absteve porque a resolução não condena o Hamas — a medida repudia “toda a violência e hostilidades contra civis, e todos os atos de terrorismo”, bem como ressalta que “a tomada de reféns é proibida pelo direito internacional”, mas não cita nominalmente o grupo terrorista.

Relatora da ONU aponta 'genocídio'

Ao mesmo tempo em que o Conselho de Segurança discutia a resolução sobre Gaza, foi divulgado o conteúdo de um relatório a ser apresentado na terça-feira diante do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, no qual a relatora especial da ONU Francesca Albanese afirma que "existem motivos razoáveis ​​para acreditar que o limite que indica a prática do genocídio por Israel foi atingido".

"A índole e a escala do ataque israelense contra Gaza e as destrutivas condições de vida impostas [à população civil] revelam uma tentativa de destruir os palestinos fisicamente como um grupo", afirma o documento, intitulado "Anatomia de um genocídio", divulgado de forma antecipada.

Albanese já havia feito comentários recentes apontando que há um genocídio em curso em Gaza, mas a apresentação do documento em Genebra deve ser encarado como um passo ainda mais contundente nas acusações.

"Israel de fato aboliu a distinção entre objetos civis e objetivos militares. Nas primeiras três semanas da ofensiva, áreas residenciais inteiras no norte de Gaza foram apagadas. Enquanto isso, bairros em áreas 'seguras' no sul estavam sendo bombardeadas. Em novembro, a devastação das cidades no norte de Gaza superava a vista em Dresden, em 1945", escreveu Albanese, se referindo à cidade alemã alvo de alguns dos maiores bombardeios dos Aliados na Segunda Guerra Mundial.

(Com AFP, NYT e Bloomberg)

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