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Por O Globo, com agências internacionais

Desde a semana passada, protestos pró-palestinos se espalharam pelos campi das principais universidades dos Estados Unidos sob a liderança de estudantes que, além de defender o fim da guerra entre Israel e o grupo terrorista palestino Hamas, reivindicam que suas instituições de ensino rompam laços com o Estado judeu e com empresas que lucram com o conflito. Nesta sexta-feira, as manifestações ultrapassaram as fronteiras dos EUA, chegando a Science Po, em Paris. A mobilização na instituição francesa terminou, porém, após a reitoria prometer organizar um debate interno e suspender os processos disciplinares contra alguns estudantes.

Enquanto os estudantes montam acampamentos em dezenas de universidades como forma de protesto, políticos democratas e republicanos, bem como organizações ligadas à comunidade judaica, denunciam atos antissemitas relacionados à mobilização. Os líderes dos protestos refutam o teor antissemita, mas alunos judeus de algumas das instituições se disseram intimidados em seus campi. Nesta quinta, as denúncias pareceram reforçadas após surgir um vídeo gravado em janeiro em que Khymani James, um dos líderes dos atos em Columbia, diz que "sionistas não merecem viver". James pediu desculpas pela gravação nesta sexta-feira.

O que são os protestos pró-Palestina nas universidades dos EUA?

Quase 50 universidades americanas foram palco de manifestações convocadas por organizações de estudantes pró-Palestina. Da Califórnia ao Maine, de Minnesota ao Texas, os atos ocorreram com a agenda comum de pedir um cessar-fogo imediato em Gaza e o fim do conflito.

Em muitas universidades, os estudantes decidiram montar acampamentos nos campi como forma de protesto, o que deixou as reitorias perante a escolha de garantir o direito à livre manifestação ou manter a ordem e as atividades regulares. Algumas universidades acionaram as polícias estaduais, o que resultou na detenção de mais de 400 estudantes até o momento sob acusações que variam de invasão de terreno privado, desobediência e agressão.

Em meio às manifestações, gestos de apoio ao Hamas e ao atentado de 7 de outubro, que motivou a invasão israelense de Gaza, foram registrados. Estudantes envolvidos nos atos negaram que sejam manifestações contra o povo judeu, apontando a participação de indivíduos extremistas. Políticos influentes, incluindo o presidente americano, Joe Biden, o ex-presidente Donald Trump e o premier israelense, Benjamin Netanyahu, criticaram gestos de antissemitismo.

Três policiais prendem um estudante durante protesto pró-Palestina em Atlanta — Foto: AFP
Três policiais prendem um estudante durante protesto pró-Palestina em Atlanta — Foto: AFP

Quando começaram os protestos?

As primeiras manifestações começaram há um mês. Estudantes da Universidade Vanderbilt, em Nashville, Tennesse, acamparam no campus universitário em 26 de março. Um dia depois, alunos do Smith College, em Northampton, Massachussets, fizeram o mesmo no prédio da reitoria do campus, de acordo com informações da Liga Antidifamação (ADL, na sigla em inglês), ONG que acompanha casos de antissemitismo pelo mundo.

O perfil nacional dos protestos aumentou, contudo, em 17 de abril, quando estudantes da Universidade Columbia, em Nova York, ergueram acampamento no centro do campus. Columbia, uma prestigiada universidade de elite, é famosa pelo histórico de ativismo de seus estudantes ao longo de décadas. A instituição foi palco de protestos pelos direitos civis, contra a Guerra do Vietnã e contra o apartheid na África do Sul.

Manifestação pró-Palestina é realizada nas escadas da Biblioteca Lowe, na Universidade Columbia, na cidade de Nova York — Foto: David Dee Delgado / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
Manifestação pró-Palestina é realizada nas escadas da Biblioteca Lowe, na Universidade Columbia, na cidade de Nova York — Foto: David Dee Delgado / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP

As manifestações cresceram desde então, contando com a adesão de estudantes das principais instituições de ensino dos EUA, como Harvard, Yale, Princeton e MIT.

Quais são as demandas?

Como um movimento descentralizado, as demandas são variadas. Contudo, algumas são compartilhadas e contam com o suporte de organizações estudantis nacionais, que mantêm certo nível de coerência entre os atos.

Além de protestar contra a guerra em Gaza e contra o que consideram o genocídio palestino cometido por Israel — mais de 34 mil pessoas morreram no enclave desde o começo da guerra, segundo o Ministério da Saúde do Hamas, número contestado por Israel —, os estudantes exigem que suas universidades condenem o que se passa no enclave e que retirem investimentos feitos em empresas que lucram com a guerra em Gaza.

É o caso da Universidade Princeton, onde um dos panfletos distribuídos em um ato recente pedia que a instituição encerrasse pesquisas sobre armas de guerra "usadas para possibilitar genocídios", dizia o texto, ao qual a CNN teve acesso.

Em outras instituições, além da retirada de investimentos de empresas privadas, os estudantes pedem o fim de vínculos e programas integrados a universidades israelenses. Em Columbia, por exemplo, os manifestantes querem que a universidade rompa os laços com o seu centro em Tel Aviv e com um programa de graduação dupla com a Universidade de Tel Aviv.

Com o começo da repressão policial aos acampamentos universitários, a mobilização estudantil também se voltou para uma questão interna: o direito à livre manifestação em solo americano. Em manifestações durante a semana, Biden disse ser a favor da liberdade de se manifestar, mas criticou o que classificou como gestos de antissemitismo.

Os protestos são antissemitas?

Organizações vinculadas à comunidade judaica e políticos republicanos e democratas denunciaram o que classificaram como gestos antissemitas durante os atos. Em uma publicação em 22 de abril, a ADL afirmou ter registrado casos de apoio explícito ao Hamas e a atos de violência similares ao ataque de 7 de outubro contra Israel.

"Em 17 de abril, um manifestante gritou 'Nós somos o Hamas' e outros cantaram: 'Al-Qassam [em referência às Brigadas Izz ad-Din al-Qassam, a ala militar do Hamas], você nos enche de orgulho, mate outro soldado agora!'. Em 20 de abril, um manifestante anti-Israel no campus de Columbia segurava um cartaz que dizia: 'Próximos alvos do Al-Qassam' com uma seta apontando para um grupo de manifestantes pró-Israel que agitavam bandeiras de Israel e dos Estados Unidos", relatou a ADL. Não foi possível confirmar de forma independente quem eram as pessoas nas fotos.

Imagens de protestos coletadas pela ADL — Foto: ADL/Reprodução
Imagens de protestos coletadas pela ADL — Foto: ADL/Reprodução

A mesma organização também informou ter registros de demonstrações de apoio ao 7 de outubro diretamente e ao uso de violência contra Israel e os judeus.

"Na Universidade de Michigan, onde os estudantes começaram seu acampamento em 22 de abril, os manifestantes penduraram uma faixa ao lado de suas barracas que dizia: VIVA A INTIFADA (levante palestino). Em Columbia, em 20 de abril, os manifestantes seguravam cartazes que incluíam mensagens como 'Lute pela Intifada mundial' e entoavam slogans familiares como 'Globalize a Intifada' e 'Só há uma solução; Intifada, revolução'", disse a organização.

Em diversos campi, estudantes que aderiram às manifestações e organizações que convocaram os atos negam que o movimento tenha por objetivo fomentar o antissemitismo.

Estudantes preparam cartazes em acampamento em Columbia — Foto: Spencer Platt/Getty Images North America via AFP
Estudantes preparam cartazes em acampamento em Columbia — Foto: Spencer Platt/Getty Images North America via AFP

A Columbia University Apartheid Divest (CUAD), uma das organizações à frente do protesto em Nova York, emitiu um comunicado se distanciando da declaração de que "sionistas não merecem viver" de Khymani James. O grupo disse que a fala não reflete "as opiniões, os valores nem os acordos comunitários do acampamento".

"Acreditamos na santidade de toda a vida e acreditamos que nosso trabalho consiste em mudar mentes e corações", informou a organização, dizendo que o estudante não teria sido eleito para nenhum cargo.

Determinados grupos pró-Palestina, porém, questionam as acusações feitas por autoridades e ONGs, afirmando que não fariam distinção entre antissemitismo (antijudeu) e antissionismo (contrário ao Estado judeu).

Estudantes de universidades de Massachusetts participam de protesto 'Cientistas Contra o Genocídio', no MIT — Foto: Scott Eisen/Getty Images North America via AFP
Estudantes de universidades de Massachusetts participam de protesto 'Cientistas Contra o Genocídio', no MIT — Foto: Scott Eisen/Getty Images North America via AFP

"A ADL baseia-se em uma definição altamente problemática de antissemitismo que tenta equiparar críticas ao governo israelense ou ao sionismo com racismo antijudaico. Isso é tão perigoso quanto infundado", apontou em comunicado a Students for Justice in Palestine (SJP). "Muitas pessoas de diversas religiões e origens, incluindo estudiosos judeus, rabinos e ativistas, há muito tempo criticam e se opõem ao sionismo. Para a comunidade palestina, o sionismo é a ideologia política que possibilitou sua subjugação violenta e desapossamento sistemático. As pessoas devem poder discutir e debater essas questões sem serem falsamente difamadas como antissemitas", acrescentou a nota.

Grupos de estudantes judeus também participam dos atos em determinadas instituições, ao passo que outros se dizem intimidados e que não têm comparecido aos campi.

O que as autoridades dizem?

Em viagem à China nesta sexta-feira, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, classificou as propostas pró-Palestina como parte da democracia. Contudo, criticou a falta de condenação expressa ao Hamas por sua responsabilidade no conflito. A fala ecoou o presidente Biden, que condenou os gestos de antissemitismo, mas defendeu a liberdade de expressão.

Estudante observa soldados da polícia estadual do Texas, no campus da Universidade do Texas, em Austin — Foto: SUZANNE CORDEIRO / AFP
Estudante observa soldados da polícia estadual do Texas, no campus da Universidade do Texas, em Austin — Foto: SUZANNE CORDEIRO / AFP

— Condeno os protestos antissemitas — disse o democrata na segunda-feira. — Também condeno aqueles que não entendem o que está acontecendo com os palestinos.

Na quinta, Trump criticou as manifestações e disse que "o nível de ódio" é muito superior ao da manifestação da extrema direita em Charlottesville em 2017, que deixou um morto e 19 feridos.

— Temos protestos por toda parte — ressaltou Trump ao deixar a sala do tribunal de Manhattan, onde é julgado por falsificação de registros comerciais. — Charlottesville foi insignificante, não foi nada comparado a isto. O ódio não era o mesmo que há aqui.

Policiais prendem manifestante da Universidade do Sul da Califórnia (USC), em Los Angeles — Foto: Mario Tama/Getty Images North America via AFP
Policiais prendem manifestante da Universidade do Sul da Califórnia (USC), em Los Angeles — Foto: Mario Tama/Getty Images North America via AFP

Na quarta-feira, Netanyahu descreveu os protestos como "horríveis", afirmando que deveriam ser interrompidos.

— O que está acontecendo nos campi universitários dos EUA é horrível — disse. — Multidões antissemitas assumiram o controle das principais universidades. Eles clamam pela aniquilação de Israel. Eles atacam estudantes judeus. Eles atacam professores judeus. (Com NYT e AFP)

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