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Por — Brasília

A péssima relação entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e o argentino Javier Milei, por divergências ideológicas, não tem impedido o andamento da agenda bilateral entre os países, afirmam interlocutores dos dois governos. As chancelarias atuam nos bastidores para evitar que questões pessoais entre os mandatários prejudiquem uma convivência histórica, com altos e baixos no campo político, mas com ganhos importantes para as respectivas economias.

Nos últimos quatro meses, logo após a posse de Milei, reuniões técnicas e políticas nos mais variados níveis vêm ocorrendo de forma avançada em Brasília e Buenos Aires. A expectativa é de fortalecimento do diálogo em um ritmo maior do que nas gestões dos então presidentes Jair Bolsonaro e Alberto Fernández, que também jamais se cumprimentaram.

Somente entre membros das chancelarias, foram três reuniões de alto nível. Além da visita oficial da chanceler argentina, Diana Mondino, no último dia 15, a Brasília, a secretária-geral do Itamaraty, Maria Laura Rocha, foi a Buenos Aires, em março, para um encontro com o vice-chanceler Leopoldo Sahores. No último dia 19, a secretária de Malvinas, Antártica, Política Oceânica e Atlântico Sul da Argentina, Paola Di Chiaro, também esteve no Itamaraty com o responsável para assuntos multilaterais e políticos da Chancelaria, Carlos Márcio Cozendey.

Carta não lida

Na visita, Mondino entregou ao chanceler brasileiro, Mauro Vieira, uma carta de Milei a Lula, reforçando a importância das relações bilaterais. Lula, no entanto, disse que ainda não leu o documento. Os dois mandatários devem compartilhar o mesmo ambiente em Assunção, em junho, durante a cúpula de presidentes do Mercosul. Levando em conta o comportamento do argentino — que já disse que Lula tem “vocação totalitária”, entre outras coisas — o brasileiro já indicou a interlocutores que não tem interesse em uma conversa bilateral.

Mas, apesar da convivência ruim, há exemplos concretos de diálogos, especialmente na área de infraestrutura. Um deles é um acordo que está prestes a ser fechado, após anos de negociação.

Até o ano passado, Alberto Fernández, aliado de Lula, queria que o controle da fronteira entre São Borja (RS) e Santo Tomé, na Argentina, passasse para as mãos do Estado. Por considerar que o setor privado administra bem o posto, o Brasil, sempre foi contra. Mondino, em sua visita, sinalizou que a fronteira poderá permanecer como está, com a renovação da concessão para administrar o posto. Também estão em fase de discussão a construção da Ponte Internacional Porto Xavier-San Javier, o lançamento de um novo satélite binacional e medidas para facilitar o fluxo de cidadãos entre os dois países.

Autoridades do Ministério de Minas e Energia também estiveram em Buenos Aires para discutir formas de comprar o gás argentino para abastecer as indústrias brasileiras. E a Petrobras acaba de assinar um memorando de entendimento para estudos de parcerias em gás natural com a estatal de energia argentina Enarsa.

Ao serem perguntados se não haveria risco de Milei vetar possíveis acordos, interlocutores do governo argentino ressaltam que existe um plano de ação de 90 pontos, acertado em junho de 2023 por Lula e Fernández, que jamais foi contestado pelo atual governo.

Outro ponto em destaque foi a rápida indicação, aprovada com celeridade pelo Brasil, do novo embaixador argentino Guillermo Daniel Raimondi. O diplomata de carreira deve chegar a Brasília em alguns dias. Seu antecessor é o político Daniel Scioli, que quase disputou a eleição contra Milei e voltou para Buenos Aires para assumir a Secretaria de Turismo, Ambiente e Esportes.

A avaliação de especialistas é de que Brasil e Argentina não vivem um sem o outro e que uma ruptura seria danosa para os dois lados, principalmente do ponto de vista econômico. Há interesses fortes em jogo tanto de empresários como de representantes da sociedade civil. A Argentina é o terceiro principal destino das exportações brasileiras e a quarta principal origem de nossas importações. Em 2023, o fluxo de comércio bilateral totalizou US$ 28,7 bilhões (R$ 147 bilhões), um crescimento de 0,9% em comparação com 2022.

‘Normalidade relativa’

Para Rubens Ricupero, diplomata, ex-ministro da Fazenda e do Meio Ambiente e ex-secretário-geral da Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e o Desenvolvimento, as relações diplomáticas entre Brasil e Argentina parecem ter ingressado em fase de “relativa” normalização, como resultado do esforço dos dois governos. Existe disposição para superar os atritos dos primeiros tempos e seguir com o dia a dia, acredita:

— No caso da Argentina, é preciso reconhecer que as provocações vieram quase sempre de Milei, se excetuarmos as manifestações de parcialidade em favor da candidatura peronista [de Sergio Massa, ex-ministro da Economia argentino], feitas por Lula durante a campanha eleitoral.

​Sindicatos da Argentina fazem primeira demonstração de força contra reformas de Milei

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Ele lembra que o Brasil sempre se mostrou solidário a Buenos Aires em vários episódios recentes relacionados à dívida externa do país. E que vai se beneficiar se a economia do país vizinho melhorar, já que comércio e investimentos poderiam aumentar.

Marianna Albuquerque, professora de Relações Internacionais da UFRJ, ressalta que Brasil e Argentina têm uma relação entre Estados, e não de governo.

— Bolsonaro e Fernández tinham muitos atritos pessoais, mas nem por isso houve uma ruptura. Os dois países têm uma parceria estratégica, que não é facilmente quebrada por discordâncias ideológicas ou de governo.

Professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, Virgílio Arraes afirma que Milei está impedido de se afastar tanto do Brasil como da China, país que ele criticou duramente durante a campanha:

— Ainda que a relação bilateral siga retilínea, o desafio para o Brasil é o Mercosul, bloco em que o radicalismo do grupo de Milei pode, sim, atrapalhar no cotidiano. Mesmo assim, a Argentina fica entre a cruz e a espada: qual primazia econômica seria melhor ou mais tolerável? A da China ou a do Brasil?

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