A presidente da Geórgia, Salome Zurabishvili, anunciou neste sábado que vetou o polêmico projeto de lei sobre “influência estrangeira”, que foi aprovado pelo Parlamento na última terça-feira e promovido pelo partido governista Sonho Georgiano apesar dos protestos em massa que tomaram conta das ruas do país. Para os críticos, o texto é uma versão de uma legislação usada pela Rússia para silenciar vozes dissidentes.
— Hoje, eu veto [...] a lei, que é essencialmente russa e que contradiz nossa Constituição e todas as normas europeias. Portanto, representa um obstáculo ao nosso caminho europeu — afirmou na televisão Zurabishvili, uma política pró-europeia e que está cada vez mais em desacordo com o partido no governo.
O texto, que foi aprovado com 84 votos favoráveis no Parlamento, exige que as ONGs e os veículos de imprensa que recebem mais de 20% de seu financiamento do exterior se registrem como órgãos que servem aos “interesses de uma potência estrangeira”. Também os obriga a apresentar demonstrações financeiras anuais sobre suas atividades, e concede ao Ministério da Justiça amplos poderes para monitorar a aplicação da lei. Violações incorreriam em multas equivalentes a mais de US$ 9,3 mil (R$ 47,7 mil).
![Manifestantes em frente ao Parlamento da Geórgia — Foto: Vano Shlamov/AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ap7Qzkd_SUs-Okk96w-qQu7tTVk=/0x0:6192x4128/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/M/Q/f0HFosR4eAewxqgKsrUA/106918542-georgian-protesters-rally-against-the-controversial-foreign-influence-bill-in-front-of-the.jpg)
Funcionários do governo e o partido governista Sonho Georgiano insistem que a lei destina-se a promover maior transparência, além de reforçar a soberania do país ao exigir que as ONGs, que têm ocupado um papel central na vida política altamente polarizada da Geórgia, deixem mais transparentes suas atividades para o público. Mas jornalistas e ativistas, segundo a Associated Press, contestam esse argumento, afirmando que já estão sujeitos a requisitos de auditoria e monitoração. Para eles, a lei tem o objetivo estigmatizá-los e restringir o debate antes das eleições parlamentares, marcadas para outubro.
O partido Sonho Georgiano tem legisladores suficientes no Parlamento para derrubar o veto.
Manifestações contrárias
A aprovação no Parlamento desafiou os manifestantes que tomam as ruas do país há mais de um mês. Os protestos também ocorreram em frente ao Parlamento, no dia da votação, e a unidade da polícia antidistúrbios usou gás de pimenta, gás lacrimogênio, além de ter entrado em confronto físico com alguns dos manifestantes. No início desta semana, o Serviço de Investigação Especial da Geórgia abriu um procedimento para apurar as denúncias de violência policial.
![Manifestante ergue bandeira da Geórgia enquanto polícia atira jatos de água para dispersar ato — Foto: Giorgi Arjevanidze/AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/eh8mhKZbZkpqkf-o3vMMacNgGZk=/0x0:4956x3304/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/h/2/Rpa37CQX6pJKTxkrvDtg/106758760-topshot-police-use-water-cannons-to-disperse-protesters-near-the-georgian-parliament-dur.jpg)
Os opositores do texto estão preocupados com o fato de a ex-república soviética estar se afastando do rumo pró-Ocidente para alinhar-se com Moscou. De acordo com pesquisas de opinião, mais de 80% da população quer aderir à União Europeia e à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), além de ser firmemente anti-Kremlin. Tbilisi, que tem aspirações de ingressar no bloco europeu, foi advertida por Bruxelas que o texto era "incompatível" com seus interesses. O bloco concedeu estatuto de candidata à Geórgia em dezembro.
Neste sábado, o chefe do Conselho Europeu, Charles Michel, afirmou em uma publicação no X (antigo Twitter), que o veto da presidente oferecia um "momento para mais reflexão", pedindo aos legisladores que “façam bom uso dessa janela de oportunidade” para manter a Geórgia em seu caminho rumo à UE.
O texto também foi criticado pelos Estados Unidos, com o secretário de Estado assistente para Assuntos Europeus e Euroasiáticos americano, James C. O'Brien, afirmando que a nova lei "destruiria" a parceria entre os países.
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