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Por O Globo com agências internacionais — Territórios palestinos

RESUMO

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GERADO EM: 11/07/2024 - 11:38

Armas israelenses em Gaza: impacto devastador em crianças

Armas israelenses em Gaza causam mortes e amputações em crianças, denunciam cirurgiões. Specialistas questionam uso em áreas civis e ONU inclui Israel em lista de violações contra crianças. Sepse, amputações e danos graves relatados em crianças vítimas.

Na guerra entre Israel e Hamas em Gaza, armas israelenses que lançam pequenos estilhaços de metal estão causando ferimentos profundos em civis, em especial crianças e adolescentes, relataram cirurgiões estrangeiros ao jornal The Guardian. Segundo os médicos que trabalharam em dois hospitais no enclave nos últimos meses, a maior parte das mortes, amputações e ferimentos que mudaram a vida dos menores tratados foram causados por disparos de mísseis e granadas em áreas lotadas de civis carregadas com metal adicional, projetadas para se fragmentarem em estilhaços muito pequenos.

A Anistia Internacional disse que as armas parecem ter sido projetados para ampliar as baixas, e especialistas em armas afirmaram que os estilhaços e os ferimentos coincidem com armas de fabricação israelense projetadas para criar um grande número de vítimas, diferentemente de armas convencionais usadas para destruir edifícios. Esses especialistas, citados pelo Guardian, questionam o motivo pelo qual esses artefatos estão sendo usadas em áreas lotadas de civis.

O Guardian conversou com seis médicos estrangeiros que trabalharam em dois hospitais do enclaves — o European, no sul de Gaza, e o al-Aqsa, em Deir al-Balah, no centro — nos últimos três meses. Todos descreveram os ferimentos que trataram como causados por armas de "fragmentação", o que teria contribuído para um aumento alarmante de amputações desde o início do conflito, em outubro. Os médicos explicaram que esses estilhaços deixam feridas quase imperceptíveis na pele, mas causam ferimentos extensos internamente.

Feroze Sidhwa, um cirurgião de trauma da Califórnia, que trabalhou no sul de Gaza em abril, disse que "cerca de metade dos ferimentos" que tratou foram em crianças pequenas.

— Vimos muitos dos chamados ferimentos por estilhaços que eram muito, muito pequenos a ponto de você facilmente não os notar ao examinar um paciente. — disse ao jornal.

O médico Mark Perlmutter, cirurgião ortopédico do estado americano da Carolina do Norte, trabalhou no mesmo hospital que Sidhwa. Ele disse que, ao olhar para raios-x, era possível ver "ossos demolidos", parecendo que um "trator tinha passado por cima", mas que os ferimentos na pele de um lado e do outro tinham a espessura de "um alfinete".

Sidhwa, que manteve anotações sobre vários casos, lembrou o de uma menina de nove anos chamada Jouri, atingida por esses estilhaços em um ataque aéreo israelense em Rafah. A cidade no extremo sul do enclave, que chegou a ser apontada pelo Exército israelense como um local seguro para os deslocados, foi justificada como alvo por ser o último "bastião do Hamas".

— Encontramos Jouri morrendo de sepse em um canto. Nós a levamos para a sala de cirurgia e descobrimos que ambas as nádegas tinham sido completamente destruídas. O osso mais baixo da pélvis estava realmente exposto à pele — relatou Sidhwa, acrescentando: — Essas feridas estavam cobertas de larvas. Na perna esquerda, faltava um grande pedaço dos músculos da frente e de trás da perna, e depois cerca de cinco centímetros do fêmur. O osso da perna simplesmente sumiu.

Crianças são mais vulneráveis

Os médicos afirmaram ao jornal britânico que, apesar de terem encontrado esses ferimentos em uma variedade de civis, as crianças acabavam sendo as mais vulneráveis a esses disparos, já que elas "têm corpos menores" e, consequentemente, seus órgãos vitais também são muito pequenos, tornando-os mais fáceis de serem rompidos, explicou Sidhwa.

— Quando as crianças têm vasos sanguíneos lacerados, seus vasos sanguíneos já são tão pequenos que é muito difícil juntá-los novamente. A artéria que alimenta a perna, a artéria femoral, tem apenas a espessura de um macarrão em uma criança pequena. É muito, muito pequena. Então, repará-la e manter o membro da criança preso a ela é muito difícil — disse Sidhwa.

Perlmutter disse que geralmente as crianças atingidas por vários pedaços de estilhaços não sobrevivam, e aquelas que conseguiam sobreviver acabavam com um membro amputado. Em uma explicação similar feita por Sidhwa, o cirurgião ortopédico disse que as crianças sobreviventes tiveram lesões neurológicas e vasculares, "uma das principais causas de amputação".

— Os vasos sanguíneos ou os nervos são atingidos, e eles chegam um dia depois. A perna ou o braço (já) estão mortos — explicou Perlmutter.

Segundo o chefe da Agência da ONU para Refugiados Palestinos no Oriente Médio (UNRWA), Philippe Lazzarini, em média, dez crianças perdem uma ou ambas as pernas todos os dias na Faixa de Gaza. Em uma entrevista coletiva em Genebra, no fim de junho, ele indicou que se baseia em números da Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Algumas crianças foram amputadas sem anestesias ou nenhum analgésico foi administrado depois, relataram os médicos ao Guardian. Isso, somado aos desafios relativo às infecções hospitalares devido às condições insalubres e falta de antibióticos. Esse é o caso de Jouri, que foi salva, mas teve a perna amputada. Sidhwa lamentou que a menina precisará de cuidados constantes nos próximos anos, mas provavelmente não os encontrará em Gaza.

Mais letais que uma explosão

Sanjay Adusumilli, um cirurgião australiano, trabalhou no hospital al-Aqsa em abril. Ele contou ao Guardian que recuperou alguns estilhaços enquanto operava um menino que, apesar de ter sido atendido, morreu dois dias depois.

— Tive que abrir o abdômen e o tórax dele. Ele tinha lacerações no pulmão, no coração e buracos no intestino. Tivemos que consertar tudo — relembrou.

Os estilhaços eram pequenos cubos de metal, com cerca de três milímetros de largura, descreveu Adusumilli. O cirurgião afirmou que esses estilhaços destroem ossos e órgãos, embora na pele causem apenas um arranhão — relato similar aos dos outros cirurgiões.

Especialistas revisaram as fotos enviadas pelo médico desses estilhaços, bem como os relatos dos cirurgiões. Eles afirmaram que coincidem com bombas projéteis equipadas com uma "capa de fragmentação" ao redor da ogiva explosiva para maximizar as baixas. O ex-técnico de descarte de explosivos do Exército dos EUA Trevor Ball explicou que o explosivo libera cubos de tungstênio e esferas de rolamento que são muito mais letais do que a explosão em si.

Ball disse que os pequenos cubos registrados por Adusumilli são tipicamente encontrados em armas de fabricação israelense, como certos tipos de mísseis Spike disparados em drones. E afirmou que a descrição dos ferimentos são similares àqueles causados por bombas planadoras e cartuchos de tanques equipados com essas capas, como o projétil M329 APAM, projetado para penetrar edifícios, e o cartucho M339, descrito por seu fabricante, Elbit Systems de Haifa, como "altamente letal contra infantaria desmontada".

Ball afirmou que armas de fragmentação são "munições relativamente pequenas" comparadas com as bombas que têm um raio grande de explosão, responsáveis por danificar ou destruir boa parte de Gaza. Já as armas de fragmentação, como são embaladas com metal adicional, são muito mais mortais nas imediações. Estilhaços de mísseis Spike normalmente matam e ferem gravemente em um raio de 20 metros.

O especialista explicou que alguns desses artefatos foram projetados para serem usados em prédios e os alvos em seu interior. Mas, para o especialista, o problema é "a forma como essas pequenas munições estão sendo empregadas", como quando são usados em espaço aberto como ruas e campos de tendas.

— Mesmo uma munição relativamente pequena empregada em um espaço lotado, especialmente um espaço com pouca ou nenhuma proteção contra fragmentação, como um campo de refugiados com tendas, pode levar a mortes e ferimentos significativos — explicou.

Um outro especialista que falou sob condição de anonimato por, por vezes, prestar serviço ao governo americano, questionou o uso dessas armas em áreas lotadas de civis em Gaza.

— A alegação é que essas armas são mais precisas e limitam as baixas a uma área menor. Mas quando são disparadas em áreas com altas concentrações de civis vivendo ao ar livre sem nenhum lugar para se abrigar, os militares sabem que a maioria das baixas serão esses civis — observou.

Seu uso já foi documentado em outras ofensivas israelenses na Faixa de Gaza: a Anistia Internacional identificou seu uso pela primeira vez em 2009, em mísseis Spike em Gaza. Naquele ano, um conflito entre Israel e o Hamas, que havia chegado ao poder dois anos antes, se estendeu no enclave por cerca de duas semanas, deixando ao menos 1,4 mil palestinos e 13 israelenses morreram. A Anistia Internacional acusou tanto Israel quanto o Hamas de cometerem "crimes de guerra".

'Lembrou minha filha'

Procuradas pelo Guardian, as Forças Armadas israelenses afirmaram que os comandantes militares são obrigados a "considerar os vários meios de guerra que são igualmente capazes de atingir um objetivo militar definido e escolher o meio que deve causar o menor dano incidental nas circunstâncias". Alegaram que as forças empregam "vários esforços" para reduzir os danos aos civis "na medida do possível, de acordo com as circunstâncias operacionais que regem o momento do ataque".

E concluíram: as forças "analisam os alvos antes dos ataques e escolhem a munição adequada de acordo com considerações operacionais e humanitárias, levando em conta uma avaliação das características estruturais e geográficas relevantes do alvo, o ambiente do alvo, possíveis efeitos sobre civis próximos, infraestrutura crítica nas proximidades e muito mais."

No início de junho, a ONU acrescentou Israel à lista de Estados e grupos armados que cometeram violações contra crianças e adolescentes durante conflitos. O anúncio foi feito pelo embaixador israelense na organização, Gilad Erdan, após ser notificado pelo chefe de Gabinete do secretário-geral, António Guterres. Uma fonte diplomática informou à AFP que o Hamas e a Jihad Islâmica (outro grupo armado palestino) também serão incluídos em um anexo do documento conhecido como "lista da vergonha". Israel, porém, seria o primeiro país democrático a constar na relação.

Uma menina de 7 anos foi atingida por esses estilhaços após um míssil ter caído perto da tenda de sua família. Ela teve o braço esquerdo amputado e sobreviveu, salva graças aos esforços de Adusumilli. Na sua memória, para além do horror, a lembrança criou raízes em sua mente por outro motivo.

— Ela chegou com o braço esquerdo completamente arrancado. A família trouxe o braço enrolado em uma toalha e em uma bolsa. Ela tinha ferimentos de estilhaços no abdômen, então eu tive que abri-lo e controlar o sangramento — recordou, acrescentando: — Ela sobreviveu, mas a razão pela qual me lembro dela é porque, quando eu estava correndo para a sala de cirurgia, ela me lembrou da minha própria filha e foi muito difícil aceitar isso emocionalmente. (Com AFP)

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