Líderes de todo o mundo condenaram veementemente o atentado contra o ex-presidente e candidato presidencial dos EUA, Donald Trump, na noite de sábado. Mas além das mensagens de apoio ao republicano, aliados políticos e lideranças que nutrem semelhanças ideológicas com ele viram uma oportunidade de atacar a esquerda, o presidente, Joe Biden e de impulsionar suas próprias agendas.
Uma das declarações mais fortes veio da Rússia, um país com o qual o republicano tem uma relação no mínimo complexa: segundo o porta-voz do Kremlin, “era óbvio” que ele estava sob grande perigo.
— Depois de inúmeras tentativas de eliminar o candidato Trump da arena política, primeiro usando ferramentas legais, tribunais, promotores, tentativas de desacreditar e desacreditar politicamente o candidato, era óbvio para todos os observadores externos que sua vida estava em perigo — disse Dmitry Peskov, secretário de imprensa do governo russo, citado pela agência Tass.
Como esperado, Peskov aproveitou as declarações para enumerar críticas ao sistema político dos EUA, afirmando que o caráter violento da diplomacia americana agora “se transferiu” para o terreno doméstico. Ele descartou teorias sobre uma suposta participação do governo de Joe Biden no atentado, mas disse que “a atmosfera criada por esta administração [governo Biden] durante a luta política, a atmosfera em torno de Trump, é o que provocou” o ataque. Peskov disse ainda que o presidente russo, Vladimir Putin, não tem planos de telefonar para Trump.
Vyacheslav Volodin, presidente da Duma, a Câmara baixa do Parlamento russo, foi mais incisivo em seus comentários.
“Com os seus muitos anos de política, os Estados Unidos conseguiram estar literalmente à beira de uma guerra civil. Isto também é confirmado por pesquisas: 37% acreditam que se Biden for reeleito presidente, uma guerra civil é provavel”, disse Volodin em seu canal no Telegram, citando uma pesquisa do instituto Rasmussen, publicada em maio.
Outro a usar as redes sociais para condenar o ataque foi o presidente da Argentina, Javier Milei, um aliado ideológico do republicano.
“Todo o meu apoio e solidariedade ao Presidente e candidato Donald Trump, vítima de uma tentativa COVARDE de assassinato que colocou em risco a sua vida e a de centenas de pessoas”, escreveu Milei no X. ”O desespero da esquerda internacional não é surpreendente, pois hoje vê a sua ideologia nociva expirar e está disposta a desestabilizar as democracias e a promover a violência para chegar ao poder. Com medo de perder nas urnas, recorrem ao terrorismo para impor a sua agenda retrógrada e autoritária.”
O tom de Milei não foi solitário entre os líderes ligados a Trump: o ato de violência já está sendo usado para nutrir teorias sobre uma suposta conspiração para eliminar o republicano do jogo político, e para evocar semelhanças com experiências próprias.
— Os médicos disseram que foi um milagre eu ter sobrevivido em 2018, considerando a gravidade dos ferimentos, e ele foi salvo por poucos centímetros — disse o ex-presidente Jair Bolsonaro, em vídeo publicado no X, se referindo ao atentado sofrido por ele em setembro de 2018, quando era candidato ao Palácio do Planalto. — Isso, no meu entendimento, é algo que vem de cima.
Declarado inelegível por oito anos pelo Tribunal Superior Eleitoral em 2023, Bolsonaro não raro se compara a Trump, citando os muitos processos judiciais enfrentados por ambos, e afirmando que eles são “vítimas” de uma perseguição política dos tribunais. O atentado serve como mais um elemento de comparação entre os dois, a ser usado pelo ex-presidente, inclusive durante as eleições municipais, e para tentar amenizar o impacto de investigações cada vez mais danosas à sua imagem.
Um dos principais nomes do “ressurgimento conservador” na Europa, o premier da Hungria, Viktor Orbán disse que seus “pensamentos e orações estão com o presidente Donald Trump nestas horas sombrias”, em publicação no X.
Orbán tem sido mais do que um simples aliado do republicano. O lema da presidência rotativa húngara da União Europeia é “Façam a Europa Grande Novamente”, uma referência mais do que óbvia ao slogan político de Trump. Na quinta-feira passada, os dois se encontraram na residência de Mar-a-Lago, e o premier, além de declarar apoio à candidatura presidencial, disse que Trump vai resolver a guerra na Ucrânia caso receba mais um mandato à frente da Casa Branca.
O ataque também deve impulsionar o movimento de união de forças de extrema direita na Europa: na semana passada, Orbán e Marine Le Pen, do francês Reagrupamento Nacional, anunciaram a formação do bloco Patriotas pela Europa, que passou a ser a terceira força no Parlamento Europeu.
No X, Le Pen afirmou que “a tentativa de assassinato contra Donald Trump é um choque para todos”. e que “Este é um aviso para todos nós, a França não está a salvo desta violência”. As cartas da violência, inclusive política, e de uma suposta perseguição foram usadas à exaustão pela extrema direita francesa nas eleições parlamentares concluídas no fim de semana passada.
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Em Israel, o premier Benjamin Netanyahu, que nutriu uma relação próxima com Trump durante seu mandato, disse que ele e sua mulher, Sara, ficaram “chocados com o aparente ataque”, e que oram “por sua segurança e rápida recuperação", segundo publicação na conta do premier israelense no X. Embora não tenha declarado apoio à eleição do republicano, o retorno dele à Casa Branca seria o melhor dos mundos para Netanyahu — em maio, integrantes da equipe de política externa de Trump se encontraram com o premier, revelou a rede CNN.
Embora tenha feito críticas ao governo de Israel por não ter evitado os ataques de 7 de outubro de 2023, Trump é considerado mais afável do que Biden. No passado, o republicano patrocinou processos de normalização de laços entre Israel e países árabes, os chamados Acordos de Abraão. Resta saber se Netanyahu ainda estará no cargo caso Trump seja eleito, uma vez que a pressão sobre seu governo é cada vez mais intensa nas ruas, tribunais e dentro do meio político israelense.
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