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Um ex-policial britânico-australiano que dizia salvar crianças do tráfico humano, inventou histórias para conseguir dinheiro para sua instituição de caridade. Adam Whittington, fundador do Projeto Resgate de Crianças (PRC), afirma ter ajudado mais de 700 crianças em países da África, como Uganda, Quênia e Gâmbia. No entanto, uma investigação feita pela BBC descobriu que alguns dos menores nunca foram traficados e que os fundos arrecadados, boa parte com a ajuda de apoiadores famosos, nem sempre chegaram às crianças.

A investigação mostra que Whittington, enganou os doadores de várias maneiras, inclusive levantando fundos para um bebê supostamente resgatado de traficantes de pessoas que, na verdade, sempre esteve com sua mãe, em um vilarejo na Gâmbia. Segundo a BBC, a mãe, que vive na pobreza, diz que ela e sua filha nunca receberam dinheiro da PRC.

O Projeto Resgate de Crianças (PRC)

Whittington começou a trabalhar no resgate de crianças há 20 anos, depois de deixar a Polícia Metropolitana do Reino Unido. De início, a empresa buscava recuperar crianças levadas para o exterior por um dos pais após disputas de custódia. Depois, redirecionou sua atenção para crianças vítimas de tráfico ou abuso. Tanto a sua página na rede social quanto a da PRC acumularam 1,5 milhão de seguidores e atraíram o apoio de celebridades, graças ao seu conteúdo chocante e, às vezes, perturbador.

Sam Faiers, do programa The Only Way is Essex, da ITV, tornou-se embaixadora da PRC e chegou a pedir doações aos seus milhões de fãs, arrecadando £137 mil (R$962.822) para construir um centro de resgate e cobrir os custos iniciais do projeto. Assim que o total arrecadado por Sam foi anunciado, começaram a surgir críticas contra a PRC nas redes sociais, com ex-embaixadores e diretores alegando má administração financeira e sugerindo que histórias sobre crianças estavam sendo inventadas.

Sam Faiers fez vídeos promocionais para a instituição de caridade — Foto: Foto: BBC
Sam Faiers fez vídeos promocionais para a instituição de caridade — Foto: Foto: BBC

Menos da metade do dinheiro, £58 mil (R$407.618) foi enviado à organização parceira da PRC em Uganda, a Faça Uma Criança Sorrir. Seu fundador, Alexander Ssembatya, que pediu desculpas aos doadores, disse à BBC que acreditava que o restante do dinheiro havia sido “consumido por Adam Whittington e pela PRC”. A PRC afirmou à BBC que o dinheiro restante foi gasto com outras crianças em Uganda e nas Filipinas.

Desde 2020, Whittington conta histórias detalhadas e angustiantes sobre as crianças que ele supostamente deu suporte no centro de resgate da PRC no Quênia. O centro fica em um local remoto nos arredores da cidade de Kisumu. Em abril de 2024, uma equipe da BBC, escoltada por um policial, encontrou a propriedade, supostamente administrada por uma mulher conhecida como Jane Gori, uma idosa que morava na casa com seu marido. Lá, não foi encontrada nenhuma criança, resgatada ou não. No entanto, a BBC descobriu que o filho dela, Kupa Gori, era o diretor da PRC no Quênia e que ele havia levado Whittington para visitar o local.

Whittington usou as fotos da reforma que a PRC financiou na casa de Gori para convencer os doadores de que estaria administrando um centro de resgate. Ela disse à BBC que não tinha ideia de que seu nome, sua casa e sua fotografia estavam sendo usados pela PRC.

Foto de garoto nas redes sociais da PRC é do filho de Joseph — Foto: Foto: BBC
Foto de garoto nas redes sociais da PRC é do filho de Joseph — Foto: Foto: BBC

Perto da casa de Gori, a BBC entrou em contato com um fazendeiro chamado Joseph, cujos dois filhos e uma neta apareceram no site da PRC, descritos como órfãos, sem-teto ou vítimas de tráfico ou exploração. Mas, segundo eles, nada disso é verdade. Inclusive, pouco tempo depois das fotos terem sido tiradas, em 2020, o filho de Joseph, Eugene, morreu. Apesar disso, sua foto permaneceu online até pelo menos fevereiro deste ano. De acordo com o site da PRC, as pessoas continuaram a patrociná-lo.

— Me dói o coração que alguém esteja usando as fotos do meu filho para obter dinheiro que não recebemos pessoalmente — Joseph diz à BBC.

Quando procurada pela BBC, a organização confirmou que a casa de Jane Gori é um centro de resgate da PRC que cuida de crianças, mas se manteve em silêncio quando questionados sobre o uso indevido das fotografias da família de Joseph.

Falso resgate

Whittington também dizia ter realizado uma missão de resgate, salvando um bebê recém-nascido das garras de traficantes em um movimentado mercado na Gâmbia. A mesma história foi contada por ele à sua diretora no Reino Unido, Alex Betts, a quem pediu que adotasse a criança com ele.

Segundo a BBC, Betts lançou uma campanha online de arrecadação de fundos para trazer o bebê de volta ao Reino Unido. Em março de 2023, ela visitou a menina que ela achava ser Mireya e registrou o momento. A imagem se tornou viral e foi vista por mais de 40 milhões de pessoas. Quando ela voltou ao Reino Unido, Whittington pediu que ela assinasse um acordo de não divulgação que a impediria de falar publicamente sobre a PRC.

Alex Betts com o bebê que conheceu na Gâmbia — Foto: Foto: BBC
Alex Betts com o bebê que conheceu na Gâmbia — Foto: Foto: BBC

Ela não entendeu o motivo e manifestou sua preocupação depois que Whittington a atacou nas redes, rotulando-a falsamente como viciada em drogas. Ela disse à BBC que foi usada para “chamar a atenção da rede social para a organização”.

Quando Betts decidiu pesquisar no Google “Gambia newborn baby” (bebê recém-nascido da Gâmbia), descobriu que a fotografia do bebê era de outra criança, que havia sido publicada na página das redes sociais de uma maternidade dois anos antes do “resgate” de Mireya.

A PRC disse à BBC que um membro da equipe havia usado essa imagem de forma equivocada porque não queria revelar a identidade de Mireya, e que a diretoria da PRC havia se desculpado publicamente por qualquer confusão.

Foto do bebê que foi tirada por uma maternidade da Gâmbia — Foto: Foto: BBC
Foto do bebê que foi tirada por uma maternidade da Gâmbia — Foto: Foto: BBC

Quem era Mireya?

Em maio de 2024, a BBC foi até o local do suposto centro de resgate da PRC, na Gâmbia, onde encontrou mais uma reforma em uma casa de família feita com o dinheiro arrecadado para os “resgates”. O dono da casa era David Bass, pai de Ebou Bass, na época diretor da PRC na Gâmbia, que disse à BBC que a organização consertou seu telhado e instalou um suprimento de água potável. O Sr. Whittington também publicou imagens desse trabalho de construção no site da PRC para apoiar sua alegação de estar administrando um centro de resgate.

A criança, chamada de Mireya, que aparece nos vídeos de Betts, foi encontrada por uma equipe da BBC, em um vilarejo perto da casa de David Bass. Segundo a emissora, a criança nasceu e cresceu naquele lugar.

A mãe da criança relatou à BBC que havia sido abordada por Ebou Bass quando sua filha tinha três meses de idade e que ela permitiu que levassem a criança para conhecer Betts. No entanto, acrescentou à BBC que nunca havia recebido dinheiro e não sabia da proporção que o caso tinha tomado. Questionado pela BBC, Ebou Bass reconheceu que a história de Mireya era falsa e que o centro de resgate era a casa de sua família. Ele relatou à emissora que a ideia do “resgate” do bebê de traficantes foi de Whittington, mas que ele havia concordado porque a criança realmente precisava de ajuda financeira.

A organização de Whittington insiste que a história de Mireya é verdadeira e que a casa dos Bass é um centro de resgate da PRC. Segundo a instituição, Mireya não estava na propriedade porque visitava parentes no exterior. Desde que a BBC iniciou sua investigação, alguns conteúdos foram removidos do site da PRC e Adam Whittington, que está atualmente morando na Rússia, foi banido do Instagram. Além de tentar impedir a investigação do jornal, ele lançou uma campanha na internet contra a BBC.

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